AbdonMarinho - Senhor presidente, brincadeira tem hora.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

Sen­hor pres­i­dente, brin­cadeira tem hora.


SENHOR PRES­I­DENTE, BRIN­CADEIRA TEM HORA.

Por Abdon Marinho.

O CAPITÃO Bol­sonaro ainda enver­gonhava o Exército Brasileiro quando, em 1986, o can­tor Zeca Pagod­inho lançou o samba “Brin­cadeira tem hora”.

O samba, depois de tan­tos anos ainda é dos mais pedi­dos e anima as rodas nas noites do Rio de Janeiro e, tam­bém, Brasil a fora.

A despeito de ter feito “car­reira” naquele estado e já pas­sa­dos trinta e cinco anos deste então, quer nos pare­cer que o sen­hor Bol­sonaro nunca apren­deu a letra do samba ou, se lhe rep­re­senta um grande esforço men­tal, pode­ria ter dec­o­rado ao menos o refrão, que diz: “Brin­cadeira tem hora/​Brincadeira tem hora/​Brincadeira tem hora/​Brincadeira tem hora”.

Vamos com­bi­nar que não é algo tão difí­cil de se apren­der ou mesmo de dec­o­rar.

Mas, vamos lá, caso não tenha “apren­dido” o refrão do samba car­i­oca pode­ria se inspi­rar no que ensina o Ecle­si­astes: “Tudo tem o seu tempo deter­mi­nado e há tempo para todo propósito debaixo do céu: há tempo de nascer e tempo de mor­rer; tempo de chorar e tempo de rir; tempo de abraçar e tempo de afastar-​se; tempo de amar e tempo de abor­recer; tempo de guerra e tempo de paz”.

Faço essas con­sid­er­ações ini­ci­ais para assen­tar que o pres­i­dente da República parece-​nos não pos­suir a menor dimen­são ou respon­s­abil­i­dade com o cargo que ocupa e age, na ver­dade, como se tudo fosse uma imensa brin­cadeira ou com a maturi­dade de uma cri­ança de cinco anos ou como por­ta­dor de retardo men­tal.

Nestes dois anos em que está pres­i­dente já pro­feriu os maiores absur­dos, tanto para o grupinho de ali­a­dos dis­pos­tos a bater pal­mas para qual­quer sandice, seja pelas redes soci­ais ou mesmo nos fóruns inter­na­cionais, desmere­cendo o bom nome do Brasil per­ante o mundo.

Vejamos o caso da pan­demia.

Quan­tas lou­curas não já foram pro­feri­das pelo pres­i­dente, seja pela falta de empa­tia pelas víti­mas ou seus famil­iares, seja pelas diver­sas “cam­pan­has” con­tra as recomen­dações de dis­tan­ci­a­mento social, uso de más­caras, etc., ou pela recomen­dação de trata­men­tos refu­ta­dos por cien­tis­tas do mundo inteiro?

Sua excelên­cia parece não se dar conta que é o pres­i­dente da República e que as suas palavras ou ati­tudes têm um peso difer­en­ci­ado para mil­hões de brasileiros. E muitos desses brasileiros por seguirem suas ori­en­tações têm sofrido, inclu­sive com pre­juízo da própria vida ou da sua saúde.

O pres­i­dente não pode dizer alguma coisa, sobre­tudo, para out­ros chefes de Estado e ser des­men­tido por suas ati­tudes logo em seguida.

Tive­mos uma prova disso na última sem­ana.

O pres­i­dente fez um dis­curso per­ante a cúpula global de meio ambi­ente con­vo­cada pelo pres­i­dente dos Esta­dos Unidos, Joe Biden.

Segundo anal­is­tas até que o dis­curso foi razoável e mesmo equi­li­brado. Comprometeu-​se com a causa, etcetera e tal.

O único senão foi ter aproveitado o dis­curso para “pas­sar a sacol­inha”.

Muito emb­ora esteja implíc­ito que todos devem con­tribuir com o meio ambi­ente, não “fica bonito” um pres­i­dente da República pedir din­heiro a out­ros países, empre­sas ou mes­mos pes­soas para cuidar de seus assun­tos inter­nos.

Mas o prob­lema maior da “falação” de sua excelên­cia foi o que veio depois.

No mesmo dia em que se com­pro­m­e­teu com a causa do meio ambi­ente, o pres­i­dente cor­tou no orça­mento a verba des­ti­nada a fis­cal­iza­ção.

Sem con­tar que dias antes o seu min­istro “anti-​meio-​ambiente” foi rep­re­sen­tado por um del­e­gado da Polí­cia Fed­eral por, suposta­mente, está sab­otando inves­ti­gações con­tra os des­mata­dores, bem como, fazendo “advo­ca­cia admin­is­tra­tiva” a favor daquela turma.

Para “coroar” a per­for­mance per­ante o mundo o gov­erno ao invés de dar uma resposta cabal à grave acusação do del­e­gado con­tra um min­istro do gov­erno, demi­tiu o del­e­gado do cargo de super­in­ten­dente.

E, agora mesmo, o del­e­gado denun­ciou, no Con­gresso Nacional, a situ­ação envol­vendo o min­istro anti-​ambiental e na imprensa, uma suposta “oper­ação” para demiti-​lo do cargo efe­tivo.

O pres­i­dente da República, o gov­erno que se com­pro­m­e­tera per­ante o mundo com metas ambi­en­tais, não diz nada sobre fatos de tamanha gravi­dade.

Será que descon­hecem que o mundo está de olho para tudo que acon­tece no Brasil? Será que pen­sam que o mundo não está vendo, nas palavras do min­istro, “pas­sar a boiada”?

A situ­ação toda parece uma brin­cadeira de mau gosto.

O pior – por enquanto, pois todo dia temos uma sur­presa –, estava por vir.

Ape­sar de todas maluquices já pro­feri­das pelo pres­i­dente ao longo do último ano por conta da pan­demia – e tem frase para todos os maus gos­tos: o (vírus) superdi­men­sion­ado; “gripez­inha”; “Brasileiro pula em esgoto e não acon­tece nada”; “não sou cov­eiro”; “E daí, quer que eu faça o que?; “A gente lamenta todos os mor­tos, mas é o des­tino de todo mundo”; “É como uma chuva, vai atin­gir você”; “País de mar­i­cas”; “Se tomar vacina e virar jacaré não tenho nada a ver com isso” –, o chefe da nação não cansa de “brin­car” com a paciên­cia dos brasileiros.

No último fim de sem­ana recebi a fotografia que ilus­tra este texto mostrando o pres­i­dente da República e alguns dos seus min­istros – mere­cendo destaque o da saúde e o da edu­cação (este sem más­cara –, rindo enquanto segura uma fotografia ampli­ada de um CPF grafado com CAN­CE­LADO.

A primeira coisa que me veio à cabeça, vendo rap­i­da­mente a imagem, foi que se tratava de uma mon­tagem; ou que era algo antigo.

Olhando mais deti­da­mente e me infor­mando sobre o assunto, fiquei sabendo que a foto era “do dia”, não se tratava de uma mon­tagem, ou qual­quer outra coisa.

O pres­i­dente estava mesmo lá com aquela chusma de puxa-​sacos que acha cheirosa a flat­ulên­cia de autori­dades posando com o CPF CAN­CE­LADO.

Fico chocado a ausên­cia de alguma pes­soa com um mín­imo de lucidez para impedir ou pelo menos para dizer: “— Pres­i­dente, respeite o cargo que ocupa. Esse tipo de coisa não lhe com­porta fazer”.

Não aparece ninguém.

Na mel­hor das hipóte­ses, ao apare­cer e “posar” com o CPF CAN­CE­LADO do pro­grama poli­ciale­sco que vis­i­tou, é como se o pres­i­dente da República estivesse, implici­ta­mente, con­cor­dando com a elim­i­nação de ban­di­dos por jus­ti­ceiros, mili­cianos ou mesmo por poli­ci­ais em situ­ação de con­fronto ou nos casos de “atire antes, per­gunte depois”.

Um cidadão comum pode até fazer “graça” com isso; externar pub­li­ca­mente que ban­dido bom é ban­dido morto, e todas essas coisas.

O pres­i­dente da República não pode!

Ele é o chefe da nação, tem que acred­i­tar nas leis, nas insti­tu­ições repub­li­canas, das quais ele é o primeiro servi­dor.

Pois é, na mel­hor das hipóte­ses o pres­i­dente da República estaria ape­nas “estim­u­lando” con­trari­a­mente às suas funções que CPF’s sejam can­ce­la­dos.

Noutra hipótese, essa bem mais grave, o fato do pres­i­dente apare­cer posando com o CPF CAN­CE­LADO é como se estivesse escarnecendo dos quase qua­tro­cen­tos mil brasileiros mor­tos pela pan­demia, muitos destes mor­tos, destes quase 400 mil CPF’s can­ce­la­dos, por obra e graça do seu gov­erno, muitos por sua culpa direta.

Sen­hor pres­i­dente, o momento não com­porta esse tipo de coisa, esse tipo de brin­cadeira.

O momento exige respeito aos mil­hares de brasileiros que perderam a vida, aos seus famil­iares e amigos.

Existe tempo para tudo, con­forme ensina o Eclesiastes.

Sen­hor pres­i­dente, brin­cadeira tem hora.

Abdon Mar­inho é advo­gado.