AbdonMarinho - A política sem princípios.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

A política sem princípios.

A POLÍTICA SEM PRINCÍPIOS.

Por Abdon Marinho.

NESTES dias, enquanto par­tidos e can­didatos organizam-​se para a eleição de 15 novem­bro – data deslo­cada do primeiro domingo de out­ubro por conta da pan­demia do novo coro­n­avírus –, exceto pelas obri­gações do tra­balho, venho me abstraindo do atual processo eleitoral. Sequer sei em quem votarei – ou se votarei.

O quadro não me inspira, pelo con­trário, acho-​o desolador.

Por coin­cidên­cia, em meio a tudo isso, numa noite dessas me dediquei a assi­s­tir ao filme Dark­est Hour – O des­tino de uma nação, no título em por­tuguês –, de Joe Wright, com inter­pre­tação pre­mi­ada de Gary Old­man, no papel de Win­ston Churchill.

O filme é de política e não de ação de guerra, e narra o iní­cio da gestão de Churchill, como primeiro-​ministro do Reino Unido, no começo da Segunda Guerra Mundial.

Começo é ape­nas uma forma de dizer, as tropas nazis­tas já domi­navam grande parte da Europa e a película nos alcança nas dis­cussões sobre a reação do Reino Unido à invasão da França. Churchill já era velho – e, até, se ressente por ter virado primeiro-​ministro já naquela idade e em uma situ­ação tão difí­cil –, mas já ao assumir fez o famoso dis­curso de que o que tinha a prom­e­ter ao país era a guerra, o sangue, o suor, o tra­balho e as lágri­mas.

Deslo­cado no tempo, acho nos anos oitenta ou noventa fiz­eram uma minis­série com título semel­hante: “Sangue, Suor e Lágri­mas”.

Como disse, o filme é sobre política, sobre os basti­dores da política enquanto a guerra se desen­rolava e retrata muito bem as difi­cul­dades enfrentadas pelo gov­erno de Churchill em sus­ten­tar um con­fronto con­tra as imbat­íveis tropas alemães, prati­ca­mente soz­inho.

No próprio gov­erno haviam pressões para se cos­tu­rar um acordo com os nazis­tas.

As pressões aumen­taram com a queda da França pouco depois.

Emb­ora a história não mostre, por um momento o Reino Unido ficou soz­inho no com­bate ao nazismo.

Foi neste momento que a auto­con­fi­ança de Hitler o levou à der­rota, pois pen­sando que seria fácil a vitória, abriu, simul­tane­a­mente, uma outra frente de batalha, agora, con­tra a União Soviética.

Pois bem, voltando ao tempo em que o Reino Unido estava soz­inho no enfrenta­mento ao nazismo – mesmo os Esta­dos Unidos se recusavam ou colo­cavam obstácu­los na ajuda aos ali­a­dos históri­cos –, e enfrentando resistên­cias den­tro do próprio Gabi­nete de Guerra, que não acred­i­tava numa vitória con­tra os alemães, Churchill mostrou ao Par­la­mento, ao país e ao mundo, que exis­tiam coisas, princí­pios que não podiam ser nego­ci­a­dos; e, que, ainda, a der­rota, a morte, eram mais dig­nas do que a capit­u­lação ao nazismo.

Ainda por um momento que seja dev­eríamos pen­sar no que seria o mundo sem aquele momento de solitária resistên­cia.

Aliás, a maio­ria da pop­u­lação mundial sequer sabe a importân­cia daquele ato.

O mundo de hoje se ressente de líderes com princí­pios. Parece-​nos que a política global se tornou um refú­gio para todo tipo de psicopatia.

Basta olhar para o que acon­tece diante da pan­demia.

O mundo inteiro enfrenta um inimigo comum, mas, mesmo assim, os líderes globais agem como se brigassem entre si, cada um bus­cando suas próprias soluções e inca­pazes de um esforço comum para o enfrenta­mento da pan­demia, para a pro­dução de uma vacina, pro­mover trata­men­tos, etc., enquanto o mundo já reg­is­tra quase um mil­hão de vidas humanas perdidas.

Quando trago este mesmo exem­plo para a política nacional meu desalento é ainda maior.

Enquanto con­tá­va­mos mor­tos aos mil­hares – já pas­samos de 130 mil vidas per­di­das, a maior tragé­dia da história do país –, os políti­cos estavam brig­ando entre si por espaço político, por apare­cer mel­hor na mídia.

E não pensem que isso, a “brigal­hada” político-​ideológica foi o que tín­hamos de pior a ofer­e­cer. O pior é que os políti­cos – não todos, mas uma grande maio­ria –, estavam “ocu­pa­dos” roubando o din­heiro público que dev­e­ria se des­ti­nar a equipar hos­pi­tais, com­prar medica­men­tos e sal­var vidas. Gov­er­nadores, prefeitos, senadores, dep­uta­dos, e tan­tos out­ros políti­cos, legí­ti­mos rep­re­sen­tantes do povo, que dev­e­riam se ocu­par na busca de soluções para sal­var vidas, estavam – e ainda estão –, “ocu­pa­dos” des­viando o din­heiro público, cobrando propinas de prefeitos para des­ti­nar ver­bas para sal­var vidas humanas e diminuir o sofri­mento do povo.

Que tipo de gente não se enver­gonha de roubar din­heiro público em plena pan­demia? Ora, os mes­mos que roubam nas qua­tro estações do ano o din­heiro da saúde, da edu­cação, da infraestru­tura, da cul­tura, da ciên­cia, e de tudo que tenha algum valor.

Não roubam por neces­si­dade. Roubam porque o ato de roubar se tornou um vicio pior do o vício na heroína, na cocaína, no crack ou qual­quer outro narcótico.

Roubam para si e por várias gerações.

Mas, pior, ainda é saber que esses políti­cos são o retrato de uma sociedade aética e imoral. A nossa sociedade.

O Tri­bunal de Con­tas da União — TCU, aponta que mais de R$ 40 bil­hões de reais des­ti­na­dos à ajuda emer­gen­cial por causa da pan­demia foram parar nas con­tas de pes­soas que não tin­ham neces­si­dade de tal ajuda. Quan­tas destas pes­soas que não dev­e­riam rece­ber devolveram o din­heiro? Bem pou­cas, quase nen­huma. Muito pelo con­trário, pes­soas que sabida­mente não teriam neces­si­dade de se rece­ber, se inscreveram para rece­ber a ajuda emer­gen­cial; out­ras até entraram na justiça recla­mando um dire­ito ao qual não fazem jus, não são mere­ce­do­ras.

Em se tratando de princí­pios, que difer­ença faz o roubar pouco e o roubar muito? Qual a difer­ença que tem entre o cidadão que rouba os R$ 600 reais do político que roubou os R$ 60 mil, os R$ 60 mil­hões, os R$ 600 mil­hões, etc? Talvez aquela apon­tada por padre Antônio Vieira há trezen­tos anos: o roubar pouco faz os salteadores o roubar muito, os imperadores.

A difer­ença que enx­ergo entre o que rouba pouco e o que rouba muito é que rouba para viver já o outro vive para roubar.

No Brasil, aqui mesmo no Maran­hão, começou-​se a falar em nova política.

Muitas pes­soas pas­saram a con­fundir idade cronológ­ica com práti­cas políti­cas mod­er­nas, com o zelo pelo din­heiro do con­tribuinte e, sobre­tudo, jovens querendo e entrando na política falando uma coisa e prat­i­cando outra.

Assim, temos vis­tos muitos políti­cos jovens com vel­has práti­cas e mesmo alguns vel­hos políti­cos com práti­cas mod­er­nas – estes, infe­liz­mente, em extinção.

A política no Maran­hão (e no Brasil) se tornou um negó­cio que é indifer­ente a qual­quer princí­pio ético ou moral.

É assim que vemos deter­mi­nado jovem político falar em “nova política” e ao mesmo tempo se “ajun­tar” e se sub­me­ter a out­ros políti­cos, que pela vida pre­gressa e pela prática cotid­i­ana, já desafi­aram todos os dis­pos­i­tivos do Código Penal Brasileiro e tan­tos out­ros dis­pos­i­tivos da leg­is­lação penal extrav­a­gante.

Trata-​se do poder pelo poder – sem qual­quer chance de esper­ança ao povo.

O poder, a sua con­quista e per­manên­cia, tornou-​se um fim em si mesmo.

Ainda na esteira de tudo isso que falo, outro dia chamou-​me a atenção a col­i­gação para “fins eleitorais” de dois gru­pos políti­cos locais his­tori­ca­mente antag­o­nistas, para apoiarem deter­mi­nado can­didato, tam­bém desta escola de “jovens políti­cos anciãos”.

Pois bem, os dois gru­pos políti­cos já vin­ham de uma longa história de brigas, até que lá atrás, no começo deste século, prin­cip­i­aram um diál­ogo que não vin­gou e, anos depois, mais pre­cisa­mente, há onze anos, aze­dou de vez quando um dos gru­pos “tomou”, na marra, o mandato de gov­er­nador ard­u­a­mente con­quis­tado pelo grupo político da oposição.

Por ocasião da “deposição” do gov­er­nador eleito o seu grupo criou um movi­mento inti­t­u­lado os “Os Bal­aios”, uma alusão ao Movi­mento Bal­a­iada, revolta pop­u­lar ocor­rida no estado entre os anos de 1838 e 1841, tam­bém chamada de Guerra dos Bem-​te-​vis.

Como ocor­rido no século XIX, os Bal­aios do século XX, tam­bém, foram der­ro­ta­dos pelas forças do “império”.

O que achei curioso no acon­tec­i­mento de dias atrás é que os líderes “bal­aios” – bal­aios fakes, diga-​se de pas­sagem –, lá estavam no “palá­cio” daque­les que os der­ro­taram e os apearam do poder injus­ta­mente, para se col­i­garem numa estraté­gia de con­quistarem e man­terem o poder.

A impressão que tive, anal­isando o fato a par­tir de uma per­spec­tiva histórica, é que estava havendo uma der­radeira capit­u­lação – e o ex-​governador, do túmulo, se con­torcendo, assim como os ver­dadeiros balaios.

Mas, na ver­dade, era ape­nas a velha prática da “nova” política, onde nada que não seja o poder importa.

Por conta da pan­demia do novo coro­n­avírus – e não como os vel­hos salteadores de out­rora –, estavam todos dev­i­da­mente mas­cara­dos, talvez para escon­der os sor­risos maro­tos.

E são tão jovens.

Quanta falta nos faz o velho Churchill.

Abdon Mar­inho é advo­gado.