AbdonMarinho - FINDA O REINADO DE D. ZEZINHO, O BREVE.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Domingo, 24 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

FINDA O REINADO DE D. ZEZ­INHO, O BREVE.

FINDA O REINADO DE D. ZEZ­INHO, O BREVE.

Por Abdon Mar­inho.

DUROU menos do que se esper­ava o reinado de D. Zez­inho, primeiro e único do Maran­hão. Des­ig­nado por sua Excelên­cia, o gov­er­nador do estado, para dar a última palavra sobre o cumpri­mento de decisões judi­ci­ais – mes­mos as ori­un­das da Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF –, que impli­cas­sem em incor­po­ração de van­ta­gens aos servi­dores públi­cos, condi­cio­nando as mes­mas ao seu “ateste” de disponi­bil­i­dade orça­men­tária, D. Zez­inho teve seus poderes “extin­tos” com edição do Decreto nº. 34.667, de 8 de fevereiro de 2019.

Com pouco mais de dois meses, reinado de D. Zez­inho pode – e deve – , ser clas­si­fi­cado como “brevís­simo”, não se tendo como aferir a eficá­cia do seu “reinado” no con­t­role das finanças públi­cas, até porque, começou pouco antes do recesso e teve o seu fim dec­re­tado pouco depois do ter­mino da folga forense, ou seja, de 03 de dezem­bro de 2018, com a pub­li­cação do Decreto nº. 34.593, de 30 de novem­bro de 2018 a 08 de fevereiro de 2019, com a edição e pub­li­cação do Decreto nº 34.667.

Assim, D. Zez­inho, o breve, não teve a opor­tu­nidade de mostrar seu acu­rado dis­cern­i­mento no exer­cí­cio do Poder Mod­er­ador, no qual foi investido pela obra e graça do sen­hor gov­er­nador do Maran­hão.

Como dito acima, pelo curto espaço de tempo, não temos como saber quan­tas sen­tenças judi­ci­ais foram chance­ladas com o “ateste” para cumpri­mento ou não.

Como vive­mos dias em que as pes­soas só con­segue enten­der a lit­er­al­i­dade das coisas, devo reg­is­trar que na exposição acima estou sendo irônico.

Quando da edição do estram­bótico decreto estad­ual criando a “quinta” instân­cia no Poder Judi­ciário brasileiro, tam­bém ironizei, dizia, naquela opor­tu­nidade, que aquela instân­cia judi­ciária seria exer­cida pelo “Seu Zez­inho”, o fun­cionário de quarto ou quinto escalão da estru­tura da Sec­re­taria de Plane­ja­mento — SEPLAN, encar­regado de acom­pan­har a exe­cução do orçamento.

Vamos com­bi­nar, foi uma “estu­dan­tada” capaz de com­pro­m­e­ter o notório con­hec­i­mento jurídico das excelên­cias respon­sáveis pela “jabu­ti­caba” jurídica.

Nos ter­mos do decreto gov­er­na­men­tal, está­va­mos assim: um juiz, um desem­bar­gador ou mesmo um min­istro do STJ ou STF, deter­mi­navam a implan­tação de uma van­tagem qual­quer nos venci­men­tos do servi­dor, mas essa implan­tação ficaria “no limbo”, ou pur­gatório, somente seria cumprida a decisão judi­cial e implan­tada se a SEPLAN “ates­tasse” a disponi­bil­i­dade orça­men­tária.

Com um pouco de cria­tivi­dade – e licença –, até dava para imag­i­nar a cena:

Chega no Palá­cio dos Leões uma decisão com um ofí­cio do STF deter­mi­nando a implan­tação de uma van­tagem no salário do servi­dor Sebastião da Silva. O gov­er­nador ime­di­ata­mente manda para a SEPLAN. Lá chegando, o secretário da pasta liga para o Seu Zez­inho:

–– Boa tarde, Seu Zezinho!

–– Boa tarde, secretário!

–– Seu Zez­inho, é o seguinte: chegou agora de Brasília – o gov­er­nador acabou de enviar –, uma decisão do min­istro Celso de Mello man­dando implan­tar 21,07% no salário do servi­dor Sebastião da Silva. Como vamos fazer?

–– Olha seu secretário, mel­hor avisar o Celso que “num” vai dá. Não tem mais orça­mento para isso.

–– Mais seu Zez­inho, é uma ordem do min­istro do Supremo, Celso de Mello, decano do tribunal.

–– “Num dá”, secretário, não tem mais dotação. Diz “pro” Celso recla­mar com o Papa. Tem um decreto do gov­er­nador dizendo que não pode implan­tar e pronto!

— M.. mais … foi o min­istro, Seu Zez­inho, bal­bu­cia o secretário.

— “Num dá”, já disse, secretário, “tá” no decreto. Só pode implan­tar se tiver d-​i-​s-​p-​o-​n-​i-​b-​i-​l-​i-​d-​a-​d-​e.

Ainda como exer­cí­cio literário, vamos com­bi­nar, o decreto de suas excelên­cias, não fazia o menor o sen­tido.

Onde já se viu através de um decreto do Poder Exec­u­tivo colo­car no limbo uma decisão judicial?

Ainda nos dias de extremas excep­cional­i­dades, como os atu­ais, não fazia qual­quer sen­tido.

Tratei disso em um texto ante­rior, inti­t­u­lado ‘Cumpra-​se, Con­forme a Von­tade Del Rei”. Na esteira daquela pub­li­cação, um ou outro mag­istrado, com quem falei disseram-​me que con­stataram a ausên­cia de rein­te­grações de posses desde o iní­cio do primeiro mandato do atual gov­erno.

Esse é um fato, con­forme nar­rara naquela oportunidade.

Aos poucos a pro­priedade pri­vada, asse­gu­rada pela Con­sti­tu­ição, vai sofrendo ataques, os mais diver­sos, no Maran­hão.

Não faz muito, duas sen­ho­ras me procu­raram com uma história insólita, segundo elas, viviam com suas famílias, há mais de quarenta anos numa pro­priedade, pos­suindo, inclu­sive, uma procu­ração do tit­u­lar da matrícula para usar e dis­por da terra. Ocorre que ano pas­sado (2018), tiveram as ter­ras inva­di­das por pes­soas lig­adas a supos­tos “movi­men­tos soci­ais”, com amplo trân­sito nos corre­dores do poder, que, com diver­sos artifí­cios e estrat­a­ge­mas, não ape­nas con­seguiram ocu­par a pro­priedade e fazer a explo­ração com­er­cial da madeira – pois se trata de uma área de reserva –, como, pas­mem, ainda con­seguiram a prisão de todos (ou quase todos) os mem­bros da família.

São pes­soas bem pobres e me procu­raram em busca de ajuda, pois segundo elas, estes inva­sores con­seguiram, mais uma vez que fosse dec­re­tada a prisão de cinco mem­bros da família, sob o argu­mento de que estariam sendo ameaça­dos.

O gov­erno estad­ual, que não cos­tuma “dá bola” para decisões judi­ci­ais rela­cionadas a con­fli­tos agrários, no sen­tido de deter­mi­nar as rein­te­grações, ainda, segundo elas, mobi­li­zou um grande con­tin­gente, por seus cál­cu­los, mais de trinta homens de vários batal­hões, para cumprirem a ordem de prisão daque­les famil­iares, sendo que um tomava café em casa; outro estava col­hendo açaí e out­ros exe­cu­tando tra­bal­hos de pedreiro, aju­dante, etc. As víti­mas não ameaçavam ninguém.

Pediam ajuda por não terem condições de arcar com as despe­sas com advo­ga­dos, não ape­nas para soltar os famil­iares como, tam­bém, para se man­terem na pro­priedade, que, alegam, serem os ver­dadeiros legitimados.

Emb­ora sabendo que em con­fli­tos pela posse de ter­ras, poucos são os inocentes, depois de ouvir o relato fiquei “matu­tando”, em sendo ver­dade tudo que acabara de ouvir, esta­mos diante uma situ­ação muito grave a mere­cer espe­cial atenção das autori­dades sérias que ainda restarem. Uma vez que a par­tir da inserção de pes­soas lig­adas a movi­men­tos soci­ais den­tro da máquina pública estad­ual, os órgãos e poderes públi­cos, inclu­sive o Judi­ciário e o Min­istério Público, podem está sendo “usa­dos” para legit­i­mar abu­sos e crimes con­tra pes­soas sim­ples e humildes – e con­tra o dire­ito de propriedade.

Mas isso é assunto para outro texto, após apu­rar mel­hor estes fatos.

Pois bem, voltando ao decreto gov­er­na­men­tal, aquele que deu amp­los poderes ao Seu Zez­inho, da SEPLAN, resta-​nos claro que os próprios autores da “façanha” acharam aquilo um excesso. A jus­ti­fica­tiva de ele perdera parte de seu objeto parece-​nos inverossímil. Se assim fosse, teriam feito con­star que o mesmo se apli­caria aquele exer­cí­cio (2018).

O que nos parece mais fac­tível é que o gov­erno, sabendo con­tar com sim­pa­tia de parte da mag­i­s­tratura, que através de sua rep­re­sen­tação, não ape­nas deixou de protes­tar con­tra o esbulho de suas pre­rrog­a­ti­vas, como até, pas­mem, mais uma vez, “endos­sou” o decreto, par­tiu para outra estratégia.

Qual­quer um é capaz de enten­der que a razão de ser do decreto era a “enx­ur­rada” de ordens para a implan­tação dos 21,7% nos salários dos servi­dores – muitos já estão com esse dire­ito asse­gu­rado há alguns anos fal­tando ape­nas a implan­tação –, o que pode­ria, em tese, causar dese­qui­líbrio nas con­tas públi­cas, sobre­tudo, quando os gestores pouco fiz­eram para ele­var o estado a um outro pata­mar de desen­volvi­mento.

Ape­sar da incor­po­ração dos 21,7%, ser um assunto que na última década “subiu e desceu” todas as escadas das instân­cias judi­ciárias nacionais – tendo o estado per­dido todas as vezes –, os autores do “decreto da des­obe­diên­cia as decisões judi­ci­ais”, acharam muito mais fácil revogar o decreto e con­seguir uma decisão favorável na … justiça.

E isso foi feito, ao menos tem­po­rari­a­mente, com êxito.

O Poder Judi­ciário, em sede de rescisória, enten­deu que existe plau­si­bil­i­dade no pleito do estado – bril­hante­mente rep­re­sen­tado por sua procu­rado­ria –, e sus­pendeu a exe­cução daquele dire­ito dos servi­dores con­quis­ta­dos nos últi­mos anos – segundo a rep­re­sen­tação da cat­e­go­ria cerca de 60 mil servi­dores terão que esperar mais um pouco para mel­ho­rar o holerite.

Tudo muito bem, tudo muito bom para o estado com a estrepi­tosa vitória, exceto por um “senão”. A mesma PGE que sus­tenta ser a incor­po­ração dos 21,7% para os servi­dores ile­gal, incon­sti­tu­cional e “engorda­tiva”, como já dizia o rei Roberto Car­los, recebe tal van­tagem em seus con­tra­cheques desde o ano de 2017, con­forme noti­cia o jor­nal “O Estado do Maran­hão”.

Não é por nada, mas, ao meu sen­tir soa um “tan­tinho” con­tra­ditório que pes­soas (ou entes) que sus­ten­tam ser uma van­tagem ao servi­dor, inde­v­ida, ile­gal, incon­sti­tu­cional, seja ao mesmo tempo ben­efi­ciárias de tal van­tagem.

O que farão? Abrirão mão da “van­tagem ile­gal, incon­sti­tu­cional”?

É, talvez tivesse sido mel­hor terem deix­ado a “bola” com o Seu Zezinho?

Abdon Mar­inho é advo­gado.