AbdonMarinho - CRISE MIGRATÓRIA: UMA BREVE ANÁLISE.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Domingo, 24 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

CRISE MIGRATÓRIA: UMA BREVE ANÁLISE.

CRISE MIGRATÓRIA: UMA BREVE ANÁLISE.

Por Abdon Marinho.

EM UM TEXTO ante­rior tratei sobre a crise imi­gratória na Europa que tem provo­cado acir­ra­dos debates políti­cos e cau­sa­dos descon­for­tos aos políti­cos mais tol­er­antes em aceitar os imi­grantes ori­un­dos do África e do Ori­ente Médio.

No texto dizia que o mel­hor lugar para se viver era junto aos meus e que a crise human­itária viven­ci­ada era con­se­quên­cia de abso­luta falta de condições daque­las pes­soas viverem em seus países de origem fos­sem pelas guer­ras infind­áveis fosse, tam­bém em con­se­quên­cia delas, pela fome que tem destruído nações inteiras.

A crise de imi­gração na Europa tende a se agravar com o endurec­i­mento da polit­ica de restrição ao ingresso destes imi­grantes através da Itália – cam­inho mais perto pelo Mediter­râ­neo –, ou pelo países dos Bal­cãs – rota pref­er­en­cial dos ori­un­dos do Ori­ente Médio –, para chegar a Ale­manha, que tende a ado­tar polit­i­cas mais restri­ti­vas a este ingresso.

No texto de hoje abor­dare­mos a crise imi­gratória amer­i­cana, mais pre­cisa­mente sobre as auguras que os cidadãos latino-​americanos têm pas­sado para ingres­sar e viver nos Esta­dos Unidos da América após a implan­tação da polit­ica de “tol­erân­cia zero” pelo gov­erno do sen­hor Don­ald Trump, muito mais rig­orosa desde abril.

São inter­esses antagôni­cos: de um lado o desejo desde imi­grantes de “faz­erem o sonho amer­i­cano” e, de outro, o “dire­ito» do gov­erno amer­i­cano de pro­te­gerem suas fron­teiras. Proposi­tada­mente colo­quei o termo dire­ito entre aspas, por enten­der que emb­ora seja justo e cor­reto um gov­erno (qual­quer gov­erno) pro­te­ger suas fron­teiras, o inter­esse dos seus cidadãos – sem abstrair que a exceção da vasta comu­nidade indí­gena os demais são todos imi­grantes –, esse dire­ito não é abso­luto quando se leva em conta os princí­pios de livre cir­cu­lação dos povos con­sagra­dos na Declar­ação Uni­ver­sal dos Dire­itos Humanos da qual o pais norte-​americano é sig­natário e mesmo a questão do “dever” de asilo aos persegui­dos em seus países pelos mais diver­sos motivos que aquela nação sem­pre incen­tivou e promoveu.

Assim, não deixa de ser chocante – e a sociedade amer­i­cana ficou chocada e inco­modada, inclu­sive os par­tidários do pres­i­dente amer­i­cano –, a imple­men­tação de uma polit­ica que crim­i­nal­ize a “livre cir­cu­lação dos povos”, com a prisão e o processo por crime, daque­les que ten­tam ingres­sar ile­gal­mente no país, ainda mais quando essa polit­ica vem acom­pan­hada, tam­bém, da “prisão» de cri­anças e ado­les­centes que, para todos os efeitos, são inocentes de quais­quer crimes.

Chega-​nos noti­cias de que a inter­nação com­pul­sória destas cri­anças e ado­les­centes é apli­cada desde a bebês com menos de um ano de idade até a ado­les­centes de 17 anos.

Pois é, não me parece razoável que cri­anças e ado­les­centes sejam penal­izadas pelas escol­has (ou crimes) de seus pais. Tão desproposi­tada a ini­cia­tiva que a maio­ria da sociedade amer­i­cana, mesmo os que têm posição con­trária a imi­gração, protes­taram con­tra a mesma, forçando o inflexível pres­i­dente a recuar e ten­tar cor­rer atrás de uma solução que vise reunificar os famil­iares que foram sep­a­ra­dos como se aparta bois.

Se para os adul­tos já é traumático ser preso em ter­ras estra­nhas, imag­ina a situ­ação destes infantes sep­a­ra­dos dos pais, com­ple­ta­mente “per­di­dos”, vul­neráveis, sem saber o que fazer ou a quem se diri­gir e como se diri­gir até mesmo pela bar­reira do idioma – estran­hamente a potên­cia amer­i­cana acha que todo mundo que nasceu ou mora baixo do Rio Grande fala espanhol.

Não podemos ficar indifer­entes. Esse tipo de trata­mento à cri­anças e jovens fere, sobre­tudo, dire­ito uni­ver­sal da compaixão.

Neste sen­tido, sensibilizou-​me, espe­cial­mente, a nar­ra­tiva feita por brasileiro res­i­dente nos EUA que, tra­bal­hando num desses abri­gos, foi chamado a inter­me­diar um diál­ogo com três irmãos brasileiros de 16, 12 e 09 anos que foram sep­a­ra­dos de sua mãe. Segundo o relato, os brasileiros abso­lu­ta­mente per­di­dos diante da situ­ação, se abraçavam e choravam, o que é proibido pelas regras do abrigo e seriam sep­a­ra­dos por gênero e idade. O intér­prete pedia ao mais velho fosse forte pelos irmãos menores, ao que ele retru­cou dizendo como pode­ria ser forte afas­tado da mãe e em vias de ser sep­a­rado dos irmãos. Pela nar­ra­tiva algo de cor­tar coração moti­vando, inclu­sive, o pedido do intér­prete brasileiro que viven­ciou o acontecido.

Afora a visu­al­iza­ção da cena nar­rada acima, que me fez san­grar o coração, uma outra situ­ação assis­tida nesta crise sobre a imi­gração amer­i­cana me des­per­tou inter­esse, mas por outra moti­vação. Falo do tocante encon­tro de uma imi­grante hon­durenha (ou seria sal­vadorenha?) com seu filho – acho que com pouco mais de cinco anos –, depois de quase um mês em que ficaram “pre­sos» e sep­a­ra­dos um do outro.

A mãe que con­tou com o apoio de uma Orga­ni­za­ção Não Gov­er­na­men­tal — ONG, para ser solta e respon­der em liber­dade per­ante as autori­dades amer­i­canas, ali, no primeiro con­tato com filho, parece que se des­cul­pava com a cri­ança pelo sofri­mento que o fiz­era pas­sar. Ato con­tinuo – como sem­pre acon­tece naquele país –, estava ela dando uma declar­ação pública exter­nando sua imensa feli­ci­dade de se encon­trar nos Esta­dos Unidos.

E essa é uma grande questão que merece ser dis­cu­tida e pen­sada.

Como pes­soas se sujeitam a serem pre­sas, a respon­derem crim­i­nal­mente por crimes numa nação estrangeira, fazer seus fil­hos e entes queri­dos sofr­erem dire­ta­mente ou por saberem dos seus sofri­men­tos, para ingres­sarem num país, que pub­li­ca­mente, sabe­mos, não as querem lá? Os que as levam pas­sarem tan­tas humil­hações e sofri­men­tos à ficarem em seus países de origem? Seus países se tornaram tão ruins a ponto de preferirem arriscar pas­sar tudo isso e a sub­me­terem seus mais ama­dos (os fil­hos) a tanto sofri­mento?

Difer­ente das nações africanas que pas­sam o drama da fome e guer­ras trib­ais ou dos países do Ori­ente Médio, sobre­tudo, a Síria, con­flagrada por uma guerra que já dura quase uma década, a exem­plo do Iraque, as nações sul-​americanas, – a exceção da Venezuela, que à beira da guerra civil, padece de uma mon­u­men­tal crise de abastec­i­mento, levando os cidadãos a bus­carem abrigo noutros países ape­nas pelo dire­ito de comer –, as demais estão numa situ­ação rel­a­ti­va­mente “nor­mal”, a vio­lên­cia maior que nos países que estão em guerra, o desem­prego, a cor­rupção gen­er­al­izada, que san­gra os recur­sos da saúde, edu­cação, assistên­cia social, infraestru­tura.

Nada que seja fora do “padrão” com o qual já nos habit­u­amos ao longo dos anos. Mesmo a ditadura cubana que con­tinua – como sem­pre –, a reprimir seus cidadãos, não pode ser con­sid­er­ada como sufi­ciente a jus­ti­ficar tanta imigração.

A declar­ação daquela mãe hon­durenha e de tan­tas out­ras, sejam sal­vadoren­has, mex­i­canas, nicaraguenses, pana­men­has, guatemal­te­cas, boli­vianas, e mesmo brasileiras, rev­ela o fra­casso dos países latino-​americanos, per­di­dos na cor­rupção, na vio­lên­cia, na falta de opor­tu­nidades aos seus povos, a ponto dos mes­mos preferirem a humil­hação, a prisão e o exílio vol­un­tário nos Esta­dos Unidos, o grande satã do norte, epíteto que lhe impinge os detra­tores, e que, ape­sar disso, muitos até mor­rem para ingres­sarem lá enquanto out­ros mor­rem para sairem dos seus países.

Em todo caso, forçoso recon­hecer que nas últi­mas décadas a migração dos latino-​americanos é a con­se­quên­cia mais palpável dos des­gov­er­nos a que foram sub­meti­dos os estes países por uma classe polit­ica absur­da­mente cor­rupta e cor­romp­ida que não ofer­ece condições dig­nas de vida aos seus cidadãos.

Neste cenário o Brasil tem espe­cial destaque, basta dizer que todos brasileiros que podiam já se mudaram ou estão em vias de mudança para out­ros países, incluindo os Esta­dos Unidos, nações europeias, sobre­tudo Por­tu­gal. Aqui ficando os explo­radores da mis­éria da nação e os que não podem fugir da explo­ração.

Encerro lem­brando que logo mais chega as eleições. É hora de pen­sar­mos em mudar a triste sina do Brasil. Ou então, o último a sair, apaga a luz.

Abdon Mar­inho é advo­gado.