AbdonMarinho - O DESASTRE CIVILIZATÓRIO BRASILEIRO.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Domingo, 24 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

O DESAS­TRE CIV­I­LIZA­TÓRIO BRASILEIRO.

O DESAS­TRE CIV­I­LIZA­TÓRIO BRASILEIRO.
OUTRO DIA ouvi alguém dizer que Brasil é um país que envel­he­ceu sem pas­sar pela fase do amadurec­i­mento. Referia-​se, pois ao fato de não ter­mos aproveitado a imensa pop­u­lação eco­nomi­ca­mente ativa para igualar-​se a out­ras nações dos chama­dos países em desen­volvi­mento.
O Brasil, com tan­tas condições nat­u­rais favoráveis e, até, com uma pop­u­lação que poderíamos dizer «na medida certa», não saiu do lugar, tendo retro­ce­dido em diver­sos setores. O país tem ficado para trás.
A India, uma nação com desafios bem maiores que os nos­sos, seja pelas imen­sas desigual­dades, por uma cul­tura de cas­tas, por uma enorme pop­u­lação, quase seis vezes a nossa, com prob­le­mas sérios para ali­men­tar a todos, com base ter­ri­to­r­ial menor e diver­sos prob­le­mas climáti­cos, não faz muito tempo bateu um recorde na cor­rida espa­cial ao colo­car mais de uma cen­tena de satélites em órbita simul­tane­a­mente, feito nunca alcançado pelas nat­u­rais «super­potên­cias».
Não bas­tasse a crise moral e ética que tomou de conta do Brasil nos últi­mos anos, com quadrilhas incrus­tadas nos mais altos escalões da República, o ano de 2017, teve iní­cio com as bar­báries nos presí­dios, com seres humanos aos quais o Estado tomou para si a respon­s­abil­i­dade de cuidar e pro­te­ger, sendo decap­i­ta­dos, esquar­te­ja­dos, exibidos como troféu pelos ver­dadeiros sen­hores dos presí­dios: os chefes das quadrilhas que dão as ordens lá den­tro e aqui, do lado de fora.
E, haverão de dizer: — eram ban­di­dos, não tinha nen­hum inocente por lá, mere­ce­ram e mere­cem tudo que lhes acon­te­ceu e acon­tece.
Pois é, mal se saiu da crise dos presí­dios tive­mos outro esclare­ce­dor exem­plo do que é a sociedade brasileira. O exem­plo nos chegou ao vivo e a cores vindo do estado do Espírito Santo. Lá, por conta do aquar­te­la­mento de poli­ci­ais mil­itares, assistiu-​se a uma espé­cie de faroeste fora de época, com a pop­u­lação tran­cada por mais de uma sem­ana den­tro de casa, já sofrendo, além da pri­vação da liber­dade a pri­vação de ali­men­tos. Lazer, vis­i­tar ami­gos e par­entes seria algo impen­sável, alguns que arriscaram acabaram por pagar com os bens e até com a vida. Vitória e out­ras cidades maiores viveram aquilo assistíamos no cin­ema, no século pas­sado: tornaram-​se cidades sem lei. E o pior ainda estava por vir. Quem pode­ria imag­i­nar que, além dos mar­gin­ais, os «cidadãos de bem» iriam aproveitar a ausên­cia de poli­ci­a­mento para pro­mover saques em lojas de roupas, joal­he­rias, etc.?
A visão mais escan­car­ada da incivil­i­dade brasileira foi exibida em redes soci­ais e de tele­visão, para os resto do país é do mundo. Mas esse lado nefasto do brasileiro é mais comum que se possa imag­i­nar. De norte a sul do país, basta um cam­in­hão de mer­cado­rias (seja o que for) ameaçar tombar para que «pop­u­lares», «cidadãos de bem» avancem sobre a carga com gri­tos de «perdeu», «perdeu».
Que país é esse onde a pop­u­lação ao invés de indignar-​se com rou­bos – mesmo naque­les –, com víti­mas fatais, faz é achar nor­mal?
Mas tem coisa bem pior. Os com­er­ci­ais na tele­visão aler­tam, mas tam­bém é pos­sível con­statar no dia a dia a grave e crim­i­nosa explo­ração sex­ual de cri­anças. Dizem que são mais de 500 mil meni­nas e meni­nos explo­rados anual­mente no país. Isso não ocorre ape­nas nos grandes cen­tros. É sabido que ocorre em todos os lugares, mesmo nos menores municí­pios temos notí­cias deste tipo explo­ração. Esta sem­ana, numa reunião da qual par­ticipei, o pro­mo­tor da Comarca de Caru­ta­pera e Luís Domingues, pedia ao prefeito apoio para o enfrenta­mento desta questão neste último. Um municí­pio que tem pouco mais de 6 mil habi­tantes, onde todo mundo se con­hece enfrentando prob­le­mas desta natureza. Até bem pouco tempo demorava-​se décadas para que se reg­is­trasse um ato de vio­lên­cia.
Que tipo de sociedade faz vis­tas grossas ou admite a explo­ração de suas cri­anças?
Mas, se há algo pior que a explo­ração de cri­anças em si, esse algo pior é a explo­ração dar-​se por patrocínio ou conivên­cia ou incen­tivo dos pais ou de par­entes próx­i­mos, aque­las pes­soas que têm o dever ético e moral de protegê-​las.
No Brasil de agora nada mais abstrato que os con­ceitos de pater­nidade ou mater­nidade. Os pais não querem e não sen­tem quais­quer respon­s­abil­i­dades por aque­les que troux­eram ao mundo.
O desas­tre civ­i­liza­tório brasileiro, como temos visto, vai muito além da falta de edu­cação, do furar a fila em tudo que é ambi­ente, do desre­speito aos idosos, cri­anças, defi­cientes, do esta­ciona­mento em locais proibidos, do parar em fila dupla, tripla, da ten­ta­tiva de tirar van­tagem em tudo, do ofer­e­cer ou solic­i­tar «uma cerve­jinha» para se livrar de uma multa ou agilizar um doc­u­mento numa repar­tição.
A sociedade brasileira é a cúm­plice maior de todas as nos­sas maze­las. É ela que acha nor­mal o político des­on­esto fazer for­tuna roubando os cofres públi­cos, desde que este alcance lhe traga alguma van­tagem de caráter pes­soal. É isso que temos visto ao longo dos tem­pos. A cada eleição assis­ti­mos o quadro político se dete­ri­o­rar. Can­di­da­mente mil­hões de eleitores fin­gem descon­hecer o caráter dos seus rep­re­sen­tantes, suas fol­has cor­ri­das, seus pas­sa­dos.
Se bem anal­is­ar­mos, o brasileiro não vota mal. Ele vota nos seus iguais. Esse é nosso desas­tre maior.
Durante anos me iludi pen­sando que nosso maior prob­lema fosse a edu­cação. Não, não é. Nosso maior prob­lema é a civ­i­liza­ção – a falta dela.
Abdon Mar­inho é advogado.