AbdonMarinho - A REPÚBLICA MICROCEFÁLICA.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

A REPÚBLICA MICROCEFÁLICA.

A REPÚBLICA MICROCEFÁLICA.

QUANDO, no futuro, algum his­to­ri­ador sério se debruçar para anal­isar os dias atu­ais, con­statará que os atu­ais donos do poder não legou à pat­uleia, ape­nas mil­hares de cri­anças com a grave micro­ce­falia, situ­ação que, em maior ou menor grau, as con­dena a uma existên­cia mais sofrida e imi­tada que o restante de nós. Estes, donos do poder, nos lega tam­bém a micro­ce­falia das insti­tu­ições republicanas.

Faltam-​lhes o con­hec­i­mento e, sobre­tudo, o respeito por aquilo que o ex-​presidente José Sar­ney apeli­dou de “litur­gia do cargo”. Que, noutras palavras, sig­nifica o respeito pelas próprias insti­tu­ições. A Presidên­cia, os Min­istérios de Esta­dos, assim como o Poder Judi­ciário, o Senado da República, a Câmara dos Dep­uta­dos, o Min­istério Público e tan­tos out­ros, são insti­tu­ições da nação. Seus inte­grantes e/​ou rep­re­sen­tantes pre­cisam pos­suir um mín­imo de decoro próprio para integrá-​la e, prin­ci­pal­mente, para representá-​las.

Nos últi­mos tem­pos, mais pre­cisa­mente nes­tas últi­mas década, sobre­tudo a última – a par­tir da chegada do Par­tido do Tra­bal­hadores — PT ao poder –, os padrões éti­cos pas­saram a ser nive­la­dos numa escala menor, uma espé­cie de “fulaniza­ção» dos cos­tumes. Tudo pas­sou a ser normal.

Seria inimag­inável, noutras eras, que «per­sonas» do naipe de Renan Cal­heiro, respon­dendo a tan­tas questões judi­ci­ais, éti­cas e morais, pre­sidisse o Senado da República; ou Eduardo Cunha pre­sidisse à Câmara dos Dep­uta­dos. Na ver­dade, eles e tan­tos out­ros, sequer seriam inte­grantes de tais instituições.

Pois é, mas são mem­bros, presi­dem e são impor­tantes fig­uras da política nacional. Fiadores da governança.

Mas o que podemos esperar de país em que os pres­i­dentes da República – como os dois últi­mos – são eleitos fazendo da instân­cia maior da justiça eleitoral uma “lavan­de­ria” recur­sos escu­sos e fica tudo por isso mesmo? Será que há uma “viva alma” neste país que não saiba que as cam­pan­has do ex-​presidente Lula e da atual, sen­hora Dilma Vana Rouss­eff, foram finan­ciadas com recur­sos ori­un­dos de propinas e “lava­dos» no TSE?

As notas, tanto do par­tido quanto do insti­tuto do ex-​presidente sobre o tema, são ver­dadeiras exal­tação ao cin­ismo: “as doações foram legais e declar­adas à justiça eleitoral”.

Quanto cin­ismo. O vício é de origem, dos méto­dos usa­dos para con­seguir a doação.

Em comu­ni­cado ao TSE, respon­dendo a inda­gação daquela Corte, o juiz Sér­gio Moro afirma com todas as letras que recur­sos ori­un­dos de “propinas» finan­cia­ram aque­las cam­pan­has. Tem sen­tença ate­s­tando isso.

E o que acon­te­ceu com respon­sáveis por tais fatos: os tesoureiros ou arrecadadores? Os arti­fi­cies destas tramoias, se não estão pre­sos, estão quase todos abo­le­ta­dos nos min­istérios, são autori­dades impo­lu­tas, come­teram toda sorte de crimes e ainda são pagos pelos contribuintes.

Estran­hamente, enti­dades e cidadãos que pas­sam os dias cobrando lisura nos pleitos eleitorais nada dizem ou cobram providên­cias ou a apu­ração dos fatos pos­tos nos autos e recon­heci­dos por quase uma dezena de cidadãos que recor­reram ao insti­tuto da delação pre­mi­ada em troca de diminuição de suas penas.

O silên­cio obse­quioso rev­ela bem a “fulaniza­ção» das práti­cas, dos cos­tumes, das instituições.

Querem ver outro exem­plo claro do que falo?

O Min­istério da Justiça é o mais antigo do país. Antes da com­pan­heirada chegar ao poder o seu tit­u­lar tinha a pre­cedên­cia sobre todos os demais.

Cri­ado, antes mesmo da Inde­pendên­cia do Brasil, por decreto do príncipe regente D. Pedro, em 03 de julho de 1822. Con­sta no seu site na rede mundial de com­puta­dores que “vul­tos emi­nentes do Império e da República ocuparam-​no, na busca pelo apri­mora­mento das insti­tu­ições jurídi­cas, pro­movendo mel­ho­rias nos serviços judi­ciários e a har­mo­nia entre os poderes”.

Pois bem, será que acham nor­mal ou ético que o seu tit­u­lar atual saia para encon­tros extra-​agenda com advo­ga­dos de inves­ti­ga­dos? ou que saia por aí ante­ci­pando a inocên­cia de inves­ti­ga­dos por seus sub­or­di­na­dos, no caso da inves­ti­gação da Polí­cia Fed­eral que tem por alvo o ex-​presidente Lula? ou, ainda, que saia ate­s­tando a reg­u­lar­i­dade de con­tas de cam­panha da atual pres­i­dente, antecipando-​se a juízo do Tri­bunal Supe­rior Eleitoral? Isso, ape­nas para citar os fatos de con­hec­i­mento público. Decerto que nada disso está certo, não é ético e é moral­mente reprovável.

Como é pos­sível achar aceitável que Polí­cia Fed­eral esteja inves­ti­gando fatos tidos por crim­i­nosos e, na outra ponta o min­istro da justiça, supe­rior hierárquico da insti­tu­ição, esteja dizendo que fulano ou bel­trano é inocente e que não houve qual­quer crime nas con­tas de A ou B?

Pas­mem! Quase que diari­a­mente esta­mos nos deparando com este tipo de coisa. O min­istro, no mín­imo, corre o risco de ser des­men­tido pelos fatos. Como, aliás, já o está sendo.

A falta de noção destes que estão no poder e de seus satélites é tamanha que chegam a sug­erir a sub­sti­tu­ição do min­istro da justiça, não pelas con­du­tas inad­e­quadas demon­stradas acima, mas porque o mesmo não se mostrou capaz de inter­ferir no curso das inves­ti­gações, sobre­tudo, para elidir os crimes dos “com­pan­heiros” e crim­i­nalizar os seus adver­sários. São mesmo muito audaciosos.

Mas, meu pai, que não tinha muitas letras, cos­tu­mava dizer que cada casa era o retrato do dono. Se o dono era um porco, cer­ta­mente a casa seria um chiqueiro; se dono fosse asseado e limpo, cer­ta­mente a casa seria também.

Aí, cheg­amos ao ponto cru­cial. A ban­dalha chegou a esses níveis porque temos na chefia da nação uma pes­soa abso­lu­ta­mente inepta para o cargo. Mais, que não pos­sui a dimen­são do que seja a insti­tu­ição chamada Presidên­cia da República.

Vejam, os com­pan­heiros de seu par­tido cobravam da pres­i­dente uma defesa clara do Planalto em relação aos per­rengues que passa o ex-​presidente Lula, acos­sado por denún­cias para as quais ele, sem­pre loquaz, não pos­sui nen­huma resposta.

Até acho nor­mal que quem não sabe peça con­sel­hos a out­rem, prin­ci­pal­mente se essa pes­soal sabe alguma coisa – o que não é o caso.

A sen­hora Dilma foi além na mis­são par­tidária: mandou-​se para São Paulo, às cus­tas do con­tribuinte, para, suposta­mente, aconselhar-​se com o ante­ces­sor, cuja a con­duta é objeto de inves­ti­gação poli­cial e do Min­istério Público.

Exi­s­tiria ato maior de sub­serviên­cia? Quem foi a São Paulo ren­der hom­e­na­gens a um inves­ti­gado não foi ape­nas a sen­hora Dilma, foi a insti­tu­ição que ela rep­re­senta: a Presidên­cia da República.

Isso mesmo, a Presidên­cia da República foi ren­der hom­e­na­gens a um inves­ti­gado. A sim­bolo­gia do gesto diz muito mais que a declar­ação dela de que “o ex-​presidente Lula é objeto de grande injustiça”.

A leitura que faço do ato é que a Presidên­cia da República colocou-​se a serviço de um inves­ti­gado, como se ele (o inves­ti­gado) estivesse acima de tudo, inclu­sive da lei.

A pres­i­dente é useira e vezeira neste tipo de ati­tude: ren­der hom­e­na­gens ao ex-​presidente, de ir a São Paulo, só se con­sul­tar com ele e ates­tar sua própria inap­tidão. Agora foi além. Demon­strando não pos­suir noção de coisa alguma foi servir de escudo a um cidadão inves­ti­gado por out­ras insti­tu­ições republicanas.

Só não acred­ito que cheg­amos ao fundo do poço, porque esta turma sem­pre pos­sui uma pá à mão para cavarem um pouco mais.

Abdon Mar­inho é advogado.