AbdonMarinho - CAMINHONEIROS, UNÍ-VOS.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

CAM­IN­HONEIROS, UNÍ-​VOS.

CAMIN­HONEIROS, UNÍ-​VOS.

Era um menino em 1984. As lem­branças que trago deste período são tur­vas depois de tan­tos anos. Lem­bro, entre­tanto, que foi naquele ano que ouvi falar, pela primeira vez, na chamada Lei de Segu­rança Nacional, o nome cor­reto, na ver­dade é Lei dos Crimes Con­tra a Segu­rança Nacional.

A ditadura mil­i­tar vivia seus ester­tores, o povo, já cansado do régime mil­i­tar, não se con­tinha mais. Assim, em dezem­bro do ano ante­rior, fiz­era aprovar a lei nº. 7,170, de 14 de dezem­bro de 1983, trazendo e definindo os crimes con­tra a segu­rança nacional, a ordem política e social, esta­b­ele­cendo seu processo e julgamento.

Lem­bro que por ocasião da votação da emenda das dire­tas, ouvia-​se nas emis­so­ras de tele­visão e rádio os porta-​vozes do gov­erno infor­mar que iriam fazer uso da lei de segu­rança nacional, dec­re­tar estado de sítio e todas essas coisas que pare­ciam per­di­das na memória.

No dia da votação a cap­i­tal foi fechada, os mil­itares pos­tos nas ruas.

Remem­oro estes fatos para traçar um para­lelo entre o atual gov­erno, da pres­i­dente Dilma Rouss­eff, e o gov­erno do gen­eral João Figueiredo, o último dos generais-​presidentes que encer­rou o régime mil­i­tar depois de vinte e um anos.

O trata­mento dis­pen­sado pelo gov­erno do par­tido dos tra­bal­hadores à greve dos cam­in­honeiros é mais tru­cu­lento que o dis­pen­sado pelos mil­itares naque­les dias de fim de régime. A pres­i­dente só não invo­cou, ofi­cial­mente, a LSN – pode­ria até tê-​lo feito já que se encon­tra em vigor –, mas reprime o movi­mento pare­dista dos cam­in­honeiros da mesma forma.

O min­istro Car­dozo pode­ria, pela forma como se man­i­festa, pas­sar pelo gen­eral New­ton Cruz, que época ocu­pava a chefia do Serviço Nacional de Infor­mação — SNI.

A pres­i­dente vem a tele­visão e defende a livre man­i­fes­tação dos cam­in­honeiros, mas, porém, entre­tanto, desde que essa obe­deça aos req­ui­si­tos esta­b­ele­ci­dos pelo gov­erno. Não pode atra­pal­har a livre cir­cu­lação de mer­cado­rias, não pode provo­car desabastec­i­mento, não pode isso, não pode aquilo.

O gov­erno do Brasil quer criar a primeira greve chapa branca da história.

Indi­re­ta­mente, usando, enver­gonhada­mente, out­ros instru­men­tos, como o da Medida Pro­visória, mul­tas, apreen­sões de carteiras e veícu­los, pela Polí­cia Rodoviária Fed­eral, apelam para a Lei de Segu­rança Nacional, a lei dos ester­tores da ditadura.

A repressão ao movi­mento do cam­in­honeiros é mais uma fac­eta para a coleção de ver­gonhas dos atu­ais poderosos da República, que deve se somar ao apar­el­hamento do Estado, à cor­rupção como estraté­gia e manutenção do poder, à des­or­ga­ni­za­ção da econo­mia e à incom­petên­cia gerencial.

Sem con­strang­i­mento defen­dem as medi­das tomadas con­tra os cam­in­honeiros, esque­cendo que o tipo de man­i­fes­tação que pro­tag­on­i­zam é o mesmo tipo que os donos do poder sem­pre protagonizaram.

Na oposição não lem­bro de vê-​los pre­ocu­pa­dos com livre cir­cu­lação veícu­los e pes­soas, com abastec­i­mento das cidades, com o impacto econômico, com mil­hares e mil­hares de alunos sem aula, com as indus­trias fechadas, etc.

Ainda hoje, os que se man­i­fes­tam a favor do gov­erno têm livre trân­sito, não sofrem qual­quer repressão dos entes estatais. Muitos são sub­sidi­a­dos por empre­sas públi­cas, por ban­cos estatais, para fechar ruas, impedir tra­bal­hadores de irem tra­bal­har, etc.

Quan­tas vezes não tive­mos ceceado nosso dire­ito de ir e vir por conta de um ou outro ato de protesto? Onde estavam as autori­dades? O que fizeram?

A resposta é inúmeras vezes.

A resposta que as autori­dades se calaram, se omitiram.

A resposta é que as autori­dades não fiz­eram nada.

O fato é que, difer­ente dos gen­erais que repu­di­avam quais­quer atos, o atual gov­erno só repu­dia os atos con­trários ao gov­erno; só repu­diam as man­i­fes­tações daque­les que não são sub­sidi­a­dos pelo Estado para protestarem a favor (essa é uma ino­vação da nova repub­lica boli­var­i­ana brasileira, o protesto a favor).

O silên­cio diante de tamanho abuso por parte daque­les que sem­pre se vesti­ram de defen­sores das liber­dades, é outra ver­gonha para coleção.

Não vejo um dos que se diziam defen­sores das liber­dades indi­vid­u­ais, lev­antarem a voz con­tra a repressão aos caminhoneiros.

Não vejo um protesto con­tra o «régime de exceção” implan­tado con­tra um movi­mento específico.

Estes loquazes silen­ciosos dev­e­riam ter a cor­agem de vir pub­li­ca­mente defend­erem a apli­cação da Lei dos Crimes Con­tra a Segu­rança Nacional – apon­tada por eles, por tanto tempo como um entulho da ditadura –, con­tra os cam­in­honeiros. Deviam ter a cor­agem de vir a público defend­erem o régime dos gen­erais. Não defen­dem o atual gov­erno que está fazendo o mesmo? Não estão fazendo até mais do fez o gen­eral Figueiredo naquele ano de 1984?

O Brasil pre­cisa acor­dar desta pesadelo vergonhoso.

Abdon Mar­inho é Advogado.