ESCRITO NAS ESTRELAS.
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- Criado: Segunda, 28 Setembro 2015 22:33
- Escrito por Abdon Marinho
ESCRITO NAS ESTRELAS.
É verdade que ainda carrego um certo sentimento de culpa por ter votado no Partido dos Trabalhadores — PT em todas as eleições, incluindo a que o levou ao poder em 2002. Além do sentimento de culpa que sinto, também não consigo deixar de sentir uma certa vergonha, constrangimento, toda vez que sou compelido a escrever sobre as lambanças, corrupção e outros atos de extremo despudor com a coisa pública que praticaram e praticam à frente do poder.
Trata-se de uma espécie de vergonha alheia, ao assistir, por exemplo, um cidadão como Hélio Bicudo, fundador do partido, que enfrentou todas as dificuldades que alguém pode enfrentar na defesa da liberdade, da democracia, da probidade, dos direitos humanos, do alto dos seus 95 anos, ser achincalhado, por reconhecer que não foi esse o projeto de país que tanto lutou e se tornar signatário do pedido de impeachment daquele partido que ajudou a construir e a colocar no poder.
Diferentemente de Bicudo que começou a perceber o naufrágio apenas em 2005, percebi bem mais cedo, que o governo que ajudamos a eleger não era o mesmo que passara a governar o país a partir de 2003.
Conduzidos por Lula e Dirceu, o governo e o partido, ao invés de buscarem a interlocução com a sociedade, com as forças progressistas, fizeram o contrário, buscaram sustentação nas forças mais reacionárias do país.
Não foram enganados ao fazerem isso. Agiram assim de forma consciente, tinham um projeto de poder e pretendiam comprar os apoios para tal intento, o que não se daria com pessoas com formação moral ou ideológica e que pudesse contestá-los, não queriam correr esse risco, dai preferir comprar o apoio criando e sofisticando os esquemas de corrupção já existentes.
Tanto eu quanto qualquer outro que não se deixasse cegar por ilusões tolas ou interesses obscuros, perceberia que não tinha como aquilo funcionar. Estavam deslumbrados, arrogantes.
Uma das primeiras medidas do novel governo foi mudar a legislação para alterar a ordem de precedência dos ministros, tudo isso para tornar o vaidoso Sr. Dirceu incontestável como capitão do time, como aliás se referiu a ele, certa fez, o ex-presidente Lula. Algo bem parecido com o que a presidente Dilma Rousseff alterando a legislação para fazer-se chamar presidenta. Uma tola vaidade.
Logo na formação do primeiro governo, nas primeiras atitudes, já se percebia qual era o verdadeiro intento dos novos donos do poder.
Desta época, um episódio, em especial, me chamou a atenção e corroborou com o que já pensava: o chá de cadeira dispensado pelo Sr. Dirceu ao então deputado Fernando Gabeira e outros parlamentares que foram a palácio para uma visita de cortesia. A demora foi tamanha que o parlamentar desistiu de esperar.
Nos dias posteriores ao acontecido comentei com um amigo – já ausente –, que não devíamos esperar muito de pessoas assim à frente do governo.
Ora, se faziam aquilo com o Gabeira – o mesmo que se ocupara em sequestrar o embaixador americano para negociar a soltura do Dirceu e outros militantes –, não teriam lá muita consideração por causa alguma, tratar-se-ia do poder pelo poder.
O estrutura de poder construída eram tão frágil que na primeira ordem dada por Roberto Jefferson para que Dirceu deixasse o poder, ele arrumou as gavetas. Isso já em 2005, por ocasião do escândalo do mensalão (a negociata promovida pelo governo para a compra de apoio político da base de sustentação no Congresso Nacional). Quem não lembra do de Jefferson dizendo: – saí daí Zé! E nos dias seguintes lá estava o capitão do time abandonando o posto. Já sabia que muito mais escândalos se seguiriam aquele.
Naquela ocasião um amigo ligado ao partido tentou me convencer de que qualquer projeto político tinha que fazer esse tipo de coisa para se manter no poder. Claro que argumentei que ele ele estava equivocado e que as concessões que faziam – um eufemismo barato para corrupção – eram consequências dos equívocos praticados na formação do governo, no caminho que escolheram seguir. E que a realização de uma conquista aqui ou ali não servia de desculpa para os esquemas de corrupção montados nem para que se tentasse comprar apoios no Congresso Nacional.
A revelação do que vinham fazendo aqueles a quem se confiou o poder máximo da República, levou muitas pessoas de bem, integrantes do partido, a deixá-lo, por terem sido enganadas ou por discordar de suas práticas. Serviu também para abrir os olhos de grande parcela da sociedade.
O mensalão, ato – não só eticamente reprovável como criminoso –, foi censurado com as penas aplicadas as principais lideranças do partido como do governo.
Aqueles que encarnaram por anos o bastião da ética e da lisura foram julgados e condenados pelo Supremo Tribunal Federal por crimes como corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro dentre outros delitos.
O destrinchar do novo escândalo conhecido como petrolão revela algo ainda maior: o grupo que assumiu o poder não apenas instituiu o maior esquema de corrupção que se tem notícia na história da humanidade, como o seu propósito vai muito além da «causa», na verdade, querem poder para roubar e roubam para manter o poder e, no meio do caminho – como ninguém é de ferro –, vão fazendo seu pezinho de meia (mais para «ão» que «inho»), o senhor Lula, pelo que amealhou com suas «palestras» é milionário, seu filho de zelador de zoológico, virou empresário de sucesso em vários ramos de empreendimentos, o senhor Dirceu é outro que também ficou milionário com suas «consultorias», demonstrando tanto talento pela iniciativa privada e pelo capitalismo selvagem que faturou até durante o tempo em era hóspede do Estado no presídio da Papuda. E assim foi com tantos outros.
A ideia de que os desvios eram atalhos para uma causa maior – infelizmente para o meu amigo que morreu sem ser confrontado com a verdade –, não resiste sob qualquer ângulo que se examine. E ainda que se fosse por uma «causa». É de se indagar que causa justificaria que se saqueasse o Estado em nome de um projeto de poder de quem quer que fosse?
Na verdade, estamos diante de um agrupamento de salteadores que pensaram e ainda pensam, poder roubar os recursos da nação, como tantos outros que já se locupletaram do poder conquistado. Esta, na verdade, a única e derradeira justificativa dos atuais ladrões: fazem o que outros já faziam antes deles.
Só este alento lhes restou: o de serem apenas ladrões, como tantos outros.
Estava escrito nas estrelas que isso aconteceria.
Abdon Marinho é advogado.