AbdonMarinho - GOLPISTAS?
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

GOLPISTAS?

GOLPIS­TAS?
Acho que fica em 1987. O então pres­i­dente da República, José Sar­ney, vis­i­tava o Rio de Janeiro, com­pro­mis­sos ofi­ci­ais, obras, etc. Em um dos tra­je­tos uma man­i­fes­tação orga­ni­zada pelo Par­tido dos Tra­bal­hadores — PT, Par­tido Democrático Tra­bal­hista — PDT, Cen­tral Única dos Tra­bal­hadores — CUT e out­ros movi­men­tos soci­ais, atacaram com paus e pedras o ônibus que con­duzia o pres­i­dente e sua comi­tiva. Os man­i­fes­tantes protes­tavam con­tra as políti­cas do gov­erno e bra­davam o FORA SAR­NEY!
Pois é, há ape­nas dois anos do fim do cír­culo mil­i­tar que durara vinte e um anos, mil­i­tantes par­tidários protes­tavam con­tra o gov­erno – até fazendo uso da vio­lên­cia –, e ninguém ousava dizer que pre­gavam o golpe ou, por vias trans­ver­sas, o estim­ulava ao pedi­rem a renún­cia, a cas­sação ou o imped­i­mento do pres­i­dente.
Está bem, dirão que Sar­ney não fora eleito pelo povo e sim como vice-​presidente de Tan­credo Neves no Colé­gio Eleitoral. Acon­tece que este tipo de eleição era a pre­vista na Con­sti­tu­ição de então. Ainda assim era um pres­i­dente da República. Seu afas­ta­mento – por qual­quer – razão rep­re­sen­taria um risco a con­sol­i­dação das insti­tu­ições. Sem perder de vista que o Régime Mil­i­tar pode­ria voltar numa situ­ação de risco ou de vazio de poder.
As lid­er­anças políti­cas do PT, PDT e CUT não enten­diam assim. Estava em curso uma man­i­fes­tação legí­tima, ainda que vio­lenta, con­tra o usurpador Sar­ney, que se danasse as insti­tu­ições ou a pos­si­bil­i­dade de retorno dos mil­itares ao poder.
Em 1992, os mes­mos par­tidos, jun­ta­mente com dezenas de out­ras orga­ni­za­ções estavam na linha de frente das man­i­fes­tações que pediam o FORA COL­LOR!
As man­i­fes­tações servi­ram de com­bustível ao processo de impeach­ment que o primeiro pres­i­dente da República eleito dire­ta­mente pelo povo, sofreu. A Câmara dos Dep­uta­dos rece­beu a denún­cia for­mu­lada pela Asso­ci­ação Brasileira de Imprensa — ABI e pela Ordem dos Advo­ga­dos do Brasil — OAB, afas­tou o pres­i­dente que dois meses depois era jul­gado pelo Senado da República e cas­sado o mandato. Abrindo lugar para o vice-​presidente Ita­mar Franco que con­cluiu o mandato para os quais foram eleitos em 1989.
Estes par­tidos, enti­dades, asso­ci­ações e a sociedade em geral, praticaram golpe con­tra Col­lor? Colo­caram em risco a democ­ra­cia? As insti­tu­ições?
No gov­erno de Fer­nando Hen­rique Car­doso, que sucedeu a Ita­mar Franco, eram comuns man­i­fes­tações dos par­tidos de oposição, prin­ci­pal­mente do Par­tido dos tra­bal­hadores — PT, pedindo a saída pres­i­dente, sua cas­sação, seu imped­i­mento, con­fec­cionaram até ade­sivos para car­ros e pro­duzi­ram diver­sos mate­ri­ais com a marca FORA FHC!
Estas man­i­fes­tações eram golpis­tas, anti­democrática, con­tra a ordem insti­tu­cional? Eram um apelo para que o país caísse no abismo? Voltasse ao comando dos mil­itares?
Claro que não. Na opinião de todos estes par­tidos políti­cos e orga­ni­za­ções, eram todas man­i­fes­tações democráti­cas que for­t­ale­ciam a democ­ra­cia.
Agora, alguém diz que atual pres­i­dente é feia e seus par­tidos ali­a­dos (os mes­mos que estavam gri­tando fora para todos os pres­i­dentes antes dela), pas­sam a dizer que se trata de um golpe, que a sociedade não pode falar em impeach­ment da pres­i­dente, que são dire­itis­tas, que querem a volta da ditadura, dos tem­pos som­brios, do fim das liber­dades indi­vid­u­ais e fun­da­men­tais dos cidadãos brasileiros.
Tem algo fora do lugar. Só agora protes­tar é anti­democrático? Golpista?
A pres­i­dente superou, em impop­u­lar­i­dade, dois ex-​campeões da cat­e­go­ria: Sar­ney e Col­lor. Ape­nas 8% (oito por cento), dizem que seu gov­erno é bom ou ótimo, 20% (vinte por cento) que é reg­u­lar e o restante que é ruim ou pés­simo.
Esta imensa maio­ria, segundo os nos­sos sábios, não podem protes­tar ou pedir, den­tro da lei e de forma pací­fica, que a pres­i­dente seja afas­tada, sofra processo de cas­sação, sim­ples­mente, gri­tar, como out­rora podia: FORA DILMA!
Se fiz­erem isso são golpis­tas, mil­i­taris­tas, defen­sores da ditadura. Ainda mais, quando a pop­u­lação, com razão, se sente enganada pela pres­i­dente e por seu par­tido, que fiz­eram o oposto do que prom­e­teram à pop­u­lação no processo eleitoral.
Ora, então a opinião da larga maio­ria de nada vale numa democ­ra­cia? Vive­mos uma ditadura da mino­ria.
Vejam bem, não estou aqui defend­endo o processo de impeach­ment em si. Antes disso, defendo o dire­ito da sociedade – que todas as pesquisas infor­mam ser a grande maio­ria –, de protestarem, de pedi­rem o afas­ta­mento da pres­i­dente ou de quem quiser, sem ser tachada de rea­cionária.
O dire­ito de protes­tar é uma das nos­sas con­quis­tas.
O imped­i­mento, caso venha, tam­bém não é motivo de alarme ou de sepul­ta­mento da democ­ra­cia e das insti­tu­ições.
Não é.
Pelo con­trário é a prova cabal que as insti­tu­ições estão em reg­u­lar fun­ciona­mento.
O que temos que garan­tir é que tudo que venha ocor­rer, acon­teça den­tro das bal­izas da Con­sti­tu­ição e da lei.
O orde­na­mento jurídico pátrio, todos sabem, pos­suem regras dis­ci­plinando como deve e quando dever ocor­rer o imped­i­mento do gov­er­nante. Basta seguir, como já fize­mos na noutra opor­tu­nidade, sem que o mundo viesse abaixo.
A Con­sti­tu­ição no artigo 79 trás a pos­si­bil­i­dade de sub­sti­tu­ição por imped­i­mento e sucessão: «Art. 79. Sub­sti­tuirá o Pres­i­dente, no caso de imped­i­mento, e suceder– lhe-​á, no de vaga, o Vice-​Presidente.«
Não existe palavras inúteis na lei. Se con­sta a pos­si­bil­i­dade de imped­i­mento e sucessão no curso do mandato, não passa de tolice a argu­men­tação que o eleito tem que com­ple­tar o mandato para o qual foi eleito. O vice-​presidente não é eleito só para a even­tu­al­i­dade de ocor­rer uma morte no curso mandato.
Defender que um gov­erno, que possa haver cometido os deli­tos, de que trata a Con­sti­tu­ição, ao argu­mento de que isso levará o país ao caos, ao golpe, a insta­bil­i­dade, não passa de uma tolice e de um desserviço à nação.
Abdon Mar­inho é advogado.