AbdonMarinho - TRINTA ANOS DE UMA CAMPANHA MEMORÁVEL V. Episódio 5 - Aventuras de Dom José Farsante.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

TRINTA ANOS DE UMA CAM­PANHA MEM­O­RÁVEL V. Episó­dio 5 — Aven­turas de Dom José Farsante.


TRINTA ANOS DE UMA CAM­PANHA MEM­O­RÁVEL V.

Episó­dio 5 — Aven­turas de Dom José Farsante.

Por Abdon C. Marinho.

GRANDE EXPE­DI­ENTE. Com a palavra o dep­utado Juarez Medeiros. Assim o dep­utado Manoel Ribeiro, pres­i­dente da Assem­bleia Leg­isla­tiva, anun­ci­ava o último pro­nun­ci­a­mento daquele que fora um dos mais bril­hantes tri­bunos daquela Casa. Era o dia 12 de janeiro de 1995, quinta-​feira.

A assem­bleia leg­isla­tiva fora con­vo­cada para apre­ci­ação das primeiras medi­das do gov­erno Roseana Sar­ney.

Com a serenidade que sem­pre lhe foi car­ac­terís­tica, Juarez ini­cia seu pro­nun­ci­a­mento desculpando-​se por ocu­par, sobre­tudo, as pes­soas que ocu­pavam as gale­rias da Assem­bleia com assun­tos que não seriam suas pau­tas mais urgentes, como emprego, saúde, edu­cação. E, ao longo de bem mais trinta min­u­tos, exibindo, vídeos, matérias de jor­nais, doc­u­men­tos diver­sos, exibe para os dep­uta­dos, fun­cionários e todos os pre­sentes, a série de fraudes cometi­das nas eleições de 1994, muitas das quais sob o comando direto do ex-​presidente José Sar­ney.

O dis­curso que guardo há quase trinta anos (e que tentarei com­par­til­har com os leitores de alguma forma) não faz justiça aquele momento em que os pre­sentes, como ele próprio disse, só não pud­eram aplaudir, mas, em um silên­cio inusual, assi­s­ti­ram aos desnuda­mento de tudo que foram capazes de fazer para “tomarem” aquela eleição de Cafeteira.

Os pro­nun­ci­a­men­tos da Assem­bleia não recebem nomes, mas esse, em espe­cial, foi escrito e mon­tado pre­vi­a­mente por seu autor e rece­beu o nome que é o título deste episó­dio “Aven­turas de Dom José Farsante”.

No dia ante­rior, no Pequeno Expe­di­ente, Juarez havia lido um pequeno poema sobre Ana­cleto e o “seu pai”, no dia seguinte, con­forme anun­ci­ado, ele ini­ciou por repro­duzir o poema para ini­ciar o assunto que o levaria ao seu último pro­nun­ci­a­mento na Casa de Manuel Bequimão.

Enquanto ia falando e desnudando as eleições, seus asses­sores iam mostrando as provas cole­tadas ainda durante o segundo turno, mas, tam­bém depois da eleição ter find­ado.

Pois bem, como aqui se trata de um episó­dio, retornemos aos fatos ocor­ri­dos no primeiro turno. O Tri­bunal Supe­rior Eleitoral — TSE, apon­tou que naquele pleito houve 1.146.626 votos nom­i­nais (63,10%), 555.651 votos em branco (30,58%) e 114.902 votos nulos (6,32%) total­izando o com­parec­i­mento de 1.817.179 eleitores (68,48%).

Essa infor­mação é rel­e­vante para faz­er­mos um “bati­mento” com o resul­tado do segundo turno.

Como vimos ante­ri­or­mente, a chapa Roseana/​Zé Reinaldo obteve 541.005 votos (47,18%); a chapa Cafeteira/​Juarez Medeiros obteve 353.032 votos (30,79%); a chapa Jackson/​Jomar Fer­nan­des obteve 231.528 votos (20,19%); a chapa Fran­cisco Nascimento/​Francisco Alves da Cruz obteve 21.061 (1,84%).

O outro con­cor­rente daque­las eleições, que não nos refe­r­i­mos nos episó­dios ante­ri­ores foi Ricardo Murad, na época travava uma “guerra” con­tra Manoel Ribeiro pelo comando do PSD. Essa “guerra” teve de tudo, inclu­sive acam­pa­mento na porta do Tri­bunal Regional Eleitoral. Ricardo Murad era muito forte eleitoral­mente, havia sido pres­i­dente da Assem­bleia Leg­isla­tiva e era tido como um dos “herdeiros” políti­cos de Sar­ney. Seu irmão Jorge, esposo de Roseana era/​é o homem de “con­fi­ança” do ex-​presidente Sar­ney.

Essa con­fi­ança era de tal monta que durante o gov­erno Sar­ney o genro era tido como uma das eminên­cias par­das da República.

O certo é que essa briga pelo comando do par­tido e tam­bém famil­iar fez com que o reg­istro da can­di­datura de Ricardo Murad pelo PSD não avançasse e ele apare­cesse no resul­tado final das eleições no primeiro turno com 0 (zero) votos.

A despeito disso era sabido que tinha força política e den­si­dade eleitoral para somar na cam­panha de Cafeteira.

A eleição do segundo turno estava mar­cada para 15 de novem­bro. E os dias seguintes após o primeiro turno foram de grandes trans­for­mações no Comitê do Sítio Leal. Se antes ape­nas eu, Chico Branco e Roberto está­va­mos per­ma­nen­te­mente no comitê, agora já achá­va­mos que tinha gente em excesso. Todos que sabiam não terem “chance” num even­tual gov­erno Roseana estavam ten­tando seu espaço de poder numa vitória de Cafeteira.

As trans­for­mações foram tam­bém físi­cas. Como os dep­uta­dos eleitos e não eleitos pode­riam se dedicar inte­gral­mente a cam­panha de Cafeteira pre­cisavam de espaço para tra­bal­har. Pas­samos a dividir os quar­tos trans­for­ma­dos em salas e a faz­erem out­ras adap­tações em caráter emergencial.

Os marceneiros tra­bal­havam sem parar. A área da piscina foi trans­for­mada em escritórios ocu­pa­dos basi­ca­mente por pes­soas do PSB; a área onde ficava a sin­uca é que nas tardes ociosas do primeiro turno Cafeteira nos brin­dava com suas piadas e tiradas, foi trans­for­mada em escritórios para a equipe de Ricardo Murad.

Con­tin­u­ava com meu “caderno” fazendo os con­tatos. Mas a cam­panha já estava noutro pata­mar. Era Ader­son Lago, Bened­ito Ter­ceiro, Juarez Medeiros, Zé Costa, Con­ceição Andrade, que tratavam da artic­u­lação política, das con­ver­sas de basti­dores.

A cada hora chegava a infor­mação de que um con­tato com um prefeito ou lid­er­ança havia sido inter­cep­tado e que Sar­ney, que coman­dava a cam­panha da filha chegara antes.

Era certeza que a cam­panha de Cafeteira sofria espi­onagem e tinha as con­ver­sas tele­fôni­cas gram­peadas.

O jogo era bruto tam­bém nos meios de comu­ni­cação. O Sis­tema Mirante é o Jorna O Estado do Maran­hão, os veícu­los de comu­ni­cação com maior alcance do estado, não tinha dia que não trouxesse uma notí­cia con­tra Cafeteira em destaque ainda que fosse para no dia seguinte colo­car uma not­inha escon­dida em um canto de página.

Tam­bém eram céle­bres as charge da página 3, ora era Cafeteira retratado como um ratão preto, ora era Ader­son retratado como um rat­inho gordinho e branco.

A rede desin­for­mação era estru­tu­rada e envolvia diver­sos agentes e setores da sociedade e do gov­erno.

Quando perce­biam que a cizâ­nia que ten­tavam espal­har não fun­cionaria bem se saísse primeiro nos seus veícu­los de comu­ni­cação faziam uso de out­ros veícu­los locais e até mesmo nacionais.

Um dos fetiches era a ten­ta­tiva de “intri­gar” Cafeteira com Jack­son, o que con­seguiram de deter­mi­nada maneira.

Se pudésse­mos com­parar, diria que aquele segundo turno foi uma espé­cie de “Game of Thrones”, ver­são para adul­tos.

Antes de exi­s­tir o con­ceito e o debate sobre as fake news, no Maran­hão, um falso morto e um irmão inex­is­tente foram uti­liza­dos para decidir a eleição estad­ual.

A chamada farsa Reis Pacheco, pelo seu grau de engenho e de deste­mor dos seus autores a coloca entre as primeiras do Brasil.

Foi, prin­ci­pal­mente, isso que foi denun­ci­ado naquele pro­nun­ci­a­mento de Juarez Medeiros em 12 de janeiro de 1995.

Por sua importân­cia esse será o tema do nosso sexto episó­dio.

Ape­sar de todos os abu­sos cometi­dos Segundo o Tri­bunal Supe­rior Eleitoral houve 1.489.742 votos nom­i­nais (94,27%) que, soma­dos aos 20.383 votos em branco (1,29%) e 70.113 votos nulos (4,44%), totalizaram o com­parec­i­mento de 1.580.238 eleitores (60,42%).

A chapa Roseana/​Zé Reinaldo sagrou-​se vito­riosa com 753.901 votos (50,61%) já a chapa Cafeteira/​Juarez obteve 735.841 votos (49,39%).

Para os que estão com preguiça de faz­erem a conta, ape­nas 18.060 votos foram difer­ença entre os gan­haram e os que perderam o gov­erno do estado.

Não existe pes­soa séria que descon­heça que aquela eleição foi con­quis­tada de forma ilícita pelos vence­dores. Como se um pai entre­gasse um pre­sente a um filho, con­forme bem ilus­tra a charge do amigo Cordeiro Filho que esteve lá e foi um dos que se diver­ti­ram naquela cam­panha e que choraram conosco aquela der­rota.

Nem antes nem depois houve no Maran­hão uma eleição como aquela.

Hoje todos con­frat­er­nizam jun­tos. Fes­te­jam mesmo o que?

Abdon C. Mar­inho é advo­gado.