AbdonMarinho - TRINTA ANOS DE UMA CAMPANHA MEMORÁVEL III. Episódio 3 - A “traição”.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

TRINTA ANOS DE UMA CAM­PANHA MEM­O­RÁVEL III. Episó­dio 3 — A “traição”.


(Foto da inter­net)
TRINTA ANOS DE UMA CAM­PANHA MEM­O­RÁVEL III.

Episó­dio 3 — A “traição”.

Por Abdon C. Marinho.

QUANDO o Par­tido Social­ista Brasileiro — PSB “bateu” o martelo a favor de Cafeteira, acho que em março ou abril, houve uma “gri­taria” enorme dos diri­gentes, fil­i­a­dos e mil­i­tantes do PDT con­tra o que chama­ram de “traição”.

Foi o próprio Jack­son Lago que cun­hou a frase de que o par­tido ou Con­ceição (a ex-​prefeita Con­ceição Andrade) foram “con­t­a­m­i­na­dos pelo vírus da traição”.

Depois disso – pelos meses e anos seguintes –, não par­avam de repe­tir, como se fosse um mantra, que Con­ceição fora con­t­a­m­i­nada pelo vírus da traição; que Con­ceição rimava com traição; que o PSB rimava com traição, e out­ros adje­tivos semel­hantes.

O motivo para tanta vir­ulên­cia (só para aproveitar o “vírus”) devia-​se ao fato de acharem que o PSB dev­e­ria seguir com eles (PDT) por terem sido “respon­sáveis” pela eleição de Con­ceição Andrade em 1992.

Durante minha “car­reira” de mil­i­tante político só tive uma fil­i­ação par­tidária, no PSB, onde fiquei fil­i­ado de 1991 a 2021.

Naquele tempo, quando ainda vivíamos os primeiros anos da aber­tura política, o PSB tinha uma car­ac­terís­tica muito dis­tinta das demais agremi­ações par­tidárias: pelo menos no Maran­hão, era um par­tido sem “dono”, sem uma lid­er­ança política capaz de impor sua “von­tade” ou visão para os demais mem­bros.

Isso o tor­nava um par­tido único.

Enquanto no PDT tinha a lid­er­ança forte de Jack­son Lago, no cenário local e Brizola no cenário nacional dando a primeira ou a última palavra, que depois todos ref­er­en­davam; enquanto nos par­tidos comu­nistas (PCdoB e PCB) tin­ham o chamado “cen­tral­ismo democrático”, con­tra­ditório, não? E, mesmo no PT, com suas infini­tas cor­rentes, todos “obe­de­ciam” as ordens que vin­ham “de cima”, no PSB, as opiniões de tra­bal­hadores rurais como Diquinho, Louz­inho, Zé Maria, Roberto Mor­eira, do Mearim; Tota, Pongó, da Baix­ada; Domin­gos Paz, João Teix­eira, do Alto Turi e de tan­tos out­ros fil­i­a­dos e mil­i­tantes de todos os can­tos do estado, eram lev­adas em con­sid­er­ação e tin­ham o mesmo peso que as opiniões de Con­ceição Andrade, prefeita da cap­i­tal, José Car­los Sabóia, dep­utado fed­eral, Juarez Medeiros e Zé Costa, dep­uta­dos estad­u­ais.

Essas pes­soas não saiam de seus municí­pios, seus povoa­dos para virem servir de “vaquin­has de presé­pio” nas reuniões do par­tido.

Suas opiniões tin­ham o mesmo peso dos que tin­ham man­da­dos, dos que tin­ham “cur­rículo”.

Os ali­a­dos de Cafeteira, quando foram con­vi­da­dos a par­tic­i­par de um dos con­gres­sos ou reunião do diretório acharam tudo “muito com­plexo”, uma vez que nos seus par­tidos bas­tava a lid­er­ança ou pres­i­dente do par­tido dizer com quem iria se aliar, quem iria ser can­didato e ninguém ques­tionaria ou diria qual­quer coisa.

Naquela eleição de 1994, teve isso.

O dep­utado Ader­son Lago que era uma das pes­soas que Cafeteira ouvia e era dos coor­de­nadores e entu­si­asta da sua can­di­datura, inúmeras vezes me disse não enten­der como pode­ria fun­cionar um par­tido como o PSB.

Nota: anos depois ele filiou-​se ao PSB onde pas­sou uma tem­po­rada chegando a dis­putar uma indi­cação para dis­putar a eleição da cap­i­tal con­tra o advo­gado José Anto­nio Almeida e per­dendo num critério de desem­pate.

Em 1994, nem a dire­ita nem a esquerda con­seguiam enten­der o fun­ciona­mento do par­tido e, em decor­rên­cia dessa falta de con­hec­i­mento, acabaram por não enten­der o fato do PSB ter deci­dido por Cafeteira e não por Jack­son Lago. Talvez, fosse mais cômodo ir com o ex-​prefeito da cap­i­tal, talvez Con­ceição Andrade, prefeita que fora apoiada por ele, quisesse isso, assim como out­ras lid­er­anças.

Muito emb­ora Con­ceição – e out­ras lid­er­anças –, tenha sido respon­s­abi­lizada (por conta da incom­preen­são) a decisão não foi dela ou de out­ros com mandato (nem sei se no primeiro momento votou a favor de apoiar Cafeteira), foi do con­junto do par­tido. Con­ceição aceitou a decisão e como lid­er­ança dis­ci­plinada e fiel ao par­tido a “per­son­ifi­cou” e por isso pagou o maior preço. O de ser difamada como “traidora”.

Con­forme esclareci no episó­dio ante­rior, a prefeitura de São Luís, emb­ora dirigida por uma lid­er­ança do par­tido, não era algo que, dig­amos, “irra­di­ava” para todo o par­tido, aliás, nem mesmo os fil­i­a­dos da cap­i­tal e do seu entorno, se “sen­tiam” fazendo parte daquele gov­erno con­sor­ci­ado com o PDT.

O que “pesou”, entre­tanto, foi a com­preen­são de que a can­di­datura de Cafeteira era muito mais viável para vitória con­tra o grupo Sar­ney que a can­di­datura de Jack­son.

Os debates – pena que não temos como fazer esse res­gate histórico –, eram no sen­tido de que ape­sar do ex-​prefeito ter feito uma boa gestão na cap­i­tal sua influên­cia não ia muito além do “Estre­ito dos Mos­qui­tos” enquanto Cafeteira tinha sido gov­er­nador que saiu-​se muito bem avali­ado a ponto de ter sido eleito senador qua­tro anos antes com quase sessenta por cento dos votos váli­dos.

Essa mesma análise apon­tava que Jack­son Lago não teria uma votação muito supe­rior a que tivera Con­ceição em 1990.

Mais, que os votos de Jack­son Lago, se ele não fosse can­didato migrariam todos para Cafeteira mas que o oposto não se daria.

Um outro fato que poucos sabem é que Cafeteira tinha votos, muitos votos, votos “fideliza­dos” mas não tinha grupo político (ou esse era muito restrito) e sem o apoio do PSB não teria como ser can­didato.

Já o PSB, como dito nos episó­dios ante­ri­ores teve origem no “Grupo Nossa Luta”, uma espé­cie de “cor­rente” par­tidária den­tro do PMDB, nos anos do bipar­tidarismo e nos primeiros anos da aber­tura polit­ica e mesmo após a rede­moc­ra­ti­za­ção do país.

Logo, Cafeteira não era um estranho para o PSB e já o tinha apoiado 1986.

Para vencer o grupo Sar­ney vale­ria a pena apoiar a can­di­datura de Cafeteira, naquela opor­tu­nidade já fil­i­ado ao PPR, par­tido “difamado” como sendo o par­tido de Maluf.

O resul­tado do primeiro turno con­fir­mou essa análise: Roseana Sar­ney teve 541.005 (47,18%); Cafeteira 353.032 (30,79%); Jack­son Lago 231.528 (20,19%) e Fran­cisco da Cha­gas (PSTU) 21.061(1,84%), dos votos váli­dos.

Nas avali­ações feitas entre o primeiro e segundo turno dizíamos que o PSTU “sal­vara” o segundo turno.

Uma análise mais detida, entre­tanto, ver­i­fi­camos que Cafeteira e Jack­son ape­sar de todos os con­fli­tos insu­fla­dos durante a pré-​campanha e a própria cam­panha, tiveram mais de cinquenta por cento dos votos. Sig­nif­i­cando que poderíamos ter ganho aquela eleição ainda no primeiro turno.

E se?

E se tivésse­mos todos unidos, sem intri­gas, sem picuin­has? E se, tive­mos gan­hado as eleições de 1994, ainda no primeiro turno?

O Maran­hão hoje seria diferente?

Em 1997, já bacharel, mas, ainda, sem carteira da OAB, só obtida em out­ubro daquele ano, Ader­son Lago, então dep­utado, me chamou para ini­cia­r­mos a orga­ni­za­ção da cam­panha de Cafeteira de 1998.

O comitê cen­tral de cam­panha era no antigo solar da família Archer, na Praça Gonçalves Dias, de onde se tem uma das mais belas vis­tas da nossa cap­i­tal.

Acho que foi pelo final de 1997 ou iní­cio de 1998, que liguei para Con­ceição Andrade, para que viesse somar conosco naquela cam­panha que se ini­cia­ria.

Disse que todos, agora, estariam jun­tos, Cafeteira, Jack­son, PSB, PDT.

Ela me ouviu com atenção que lhe é pecu­liar e depois respon­deu (senti um pouco mágoa e/​ou des­en­canto):

— ah, agora “eles” querem.

Em 1998, ela, Con­ceição, já apoiou Roseana Sar­ney, se não me falha a memória.

Abdon C. Mar­inho é advogado.

PS. No próx­imo episó­dio tratare­mos, até onde der, da cam­panha de 1994.