AbdonMarinho - Uma falsa polêmica na sucessão estadual.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

Uma falsa polêmica na sucessão estadual.


UMA FALSA POLÊMICA NA SUCESSÃO ESTADUAL.

Por Abdon Marinho.

POLÊMICA é o sub­stan­tivo fem­i­nino que sig­nifica dis­cussão sobre ideias ou pen­sa­men­tos que causa divergên­cias; alter­cação, con­tes­tação ou ainda, dis­cussão ou debate no mundo das ideias, con­forme con­ceitu­ação dos dicionários nacionais.

Uma falsa polêmica, logo, é uma dis­cussão sobre um pen­sa­mento que não causa qual­quer divergên­cia uma vez que não há moti­vação con­tra­ditória.

Ainda no fim de sem­ana que pro­duzo o pre­sente texto, vejo em alguns meios de comu­ni­cação ou mesmo gru­pos de con­versa por aplica­tivos, uma falsa polêmica em curso: a que trata de uma suposta ineleg­i­bil­i­dade do pres­i­dente da Assem­bleia Leg­isla­tiva por conta do afas­ta­mento do gov­er­nador Car­los Brandão para trata­mento de saúde em outro estado da federação.

Como o gov­er­nador era vice, o primeiro na linha sucessória seria o pres­i­dente da Casa de Manoel Bequimão.

Há cerca de quinze dias um jor­nal­ista me per­gun­tou o que achava.

Foi uma sim­ples per­gunta através de um aplica­tivo, que respondi de forma igual­mente sus­cita: — olha muito emb­ora respeite os que pen­sam difer­ente, ao meu sen­tir, a ineleg­i­bil­i­dade não pode ser atraída desta forma.

Esqueci do assunto e até pen­sava que o pres­i­dente da Assem­bleia Leg­isla­tiva estava em pleno exer­cí­cio da sua presidên­cia.

Só na sem­ana pas­sada soube que ele, o pres­i­dente, se encon­trava fora do estado, suposta­mente, temendo que se pisasse no estado ficaria inelegível.

E, não ape­nas ele, irmã, esposa e, até mesmo, um papa­gaio de esti­mação que pre­tende fazer incursão pela política.

Custei a acred­i­tar, aliás, custo a acred­i­tar que isso tenha se dado. Até porque, como pres­i­dente de um poder o pres­i­dente é asses­so­rado por com­pe­tentes advo­ga­dos e procu­radores, com con­hec­i­mento pro­fundo do dire­ito eleitoral.

Se, por um momento, chegaram a pen­sar ou a sug­erir que o pres­i­dente poder-​se-​ia tornar-​se inelegível pelo sim­ples fato de encontrar-​se no estado mesmo com o pres­i­dente do Tri­bunal de Justiça exercendo a interinidade plena do cargo de gov­er­nador, acred­ito que tenha se dado por excesso de cautela.

Seria uma espé­cie de bi ineleg­i­bil­i­dade: a do pres­i­dente da Assem­bleia e a do pres­i­dente do TJMA – e seus par­entes –, que estava (está) ocu­pando o cargo de gov­er­nador.

A suposta ineleg­i­bil­i­dade nunca ocor­reu e a dis­cussão em torno do tema, ao meu sen­tir, não pas­sou de uma falsa polêmica, den­tre tan­tas out­ras que povoam às vésperas de eleições.

Quando, mesmo de longe, assisto essas coisas invari­avel­mente lem­bro de uma aula do pro­fes­sor Alberto Tavares, min­istrada numa manhã de terça-​feira na Uni­ver­si­dade Fed­eral do Maran­hão.

Dizia o mestre, com out­ras palavras: —a lei e a inter­pre­tação jurídica devem ser de tal forma sim­ples que o homem médio seja capaz de com­preen­der e aceitar como razoável.

Uma lição que nunca esqueci e que venho apli­cando nestes últi­mos trinta anos.

Sem­pre que me deparo com uma situ­ação jurídica me per­gunto se o homem médio acharia razoável o encam­in­hamento dado a ela, tanto pela lei quanto pelos tri­bunais.

Claro que isso nem sem­pre é pos­sível, sobre­tudo, nos dias atu­ais em que, muitas das vezes, a lei nada mais é do que aquilo que pensa o juiz, o desem­bar­gador ou o min­istro, que ela seja.

Como a lei tornando-​se o que pensa os seus apli­cadores, os seus des­ti­natários, tam­bém, pas­saram a achar que podem interpretá-​la ou contorcê-​la aos seus desígnios e fil­i­ações ide­ológ­i­cas e políti­cas.

Daí os dias difí­ceis que vive­mos na atu­al­i­dade.

Voltando à falsa polêmica envol­vendo o pres­i­dente da Assem­bleia, li em algum lugar que o afas­ta­mento do gov­er­nador para trata­mento de saúde o estaria prej­u­di­cando, pois o mesmo não estava podendo fazer sua cam­panha ao cargo de dep­utado estad­ual.

Achei bisonha a colo­cação, mas não dei crédito.

Quando tra­bal­hei na Assem­bleia Leg­isla­tiva, de 1991 a 1995, lem­bro de ter acom­pan­hado um ou dois casos de escusas a assunção de cargo, nen­hum, claro de gov­er­nador, mas que pela sime­tria pode­ria ser apli­cada.

Em um dos casos, o cidadão era vereador da cap­i­tal e ficara numa das primeiras suplên­cias. Com o afas­ta­mento do tit­u­lar e suplente para assumir algum cargo ou por motivo de saúde, ele foi chamado a assumir o cargo de dep­utado e apre­sen­tou a escusa de assumir naquele momento para não perder o mandato de vereador, sem pre­juízo de assumir caso sur­gisse uma outra opor­tu­nidade ao tér­mino da leg­is­latura na Câmara Munic­i­pal.

Se não me falha a memória, o caso a que refiro deu-​se com o vereador José Joaquim Ramos.

Além do caso, lem­bro de mais um ou dois no mesmo sen­tido. Ou seja, já havia prece­dentes na própria Assem­bleia de como fazer.

O fato do dep­utado não ter assum­ido agora não lhe tirou o dire­ito de vir assumir noutra opor­tu­nidade, caso surja e se assim dese­jar.

Não existe aquela história das brin­cadeiras infan­tis de: “foi ao vento perdeu o assento”. Rsrsrs.

De igual modo não pre­cis­aria ausentar-​se do estado para furtar-​se a assumir, bas­taria, como parece que fez agora, comu­nicar sua impos­si­bil­i­dade de assumir para não ficar inelegível nas eleições que se aviz­in­ham.

O pará­grafo sétimo do artigo 14 da Con­sti­tu­ição esta­b­elece a ineleg­i­bil­i­dade moti­vadora da falsa polêmica: “§ 7º São inelegíveis, no ter­ritório de juris­dição do tit­u­lar, o côn­juge e os par­entes con­sangüí­neos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do Pres­i­dente da República, de Gov­er­nador de Estado ou Ter­ritório, do Dis­trito Fed­eral, de Prefeito ou de quem os haja sub­sti­tuído den­tro dos seis meses ante­ri­ores ao pleito, salvo se já tit­u­lar de mandato ele­tivo e can­didato à reeleição”.

Vejam que a Con­sti­tu­ição é clara ao esta­b­ele­cer quem são os inelegíveis em vir­tude da juris­dição do tit­u­lar do mandato ou de quem o haja sub­sti­tuído nos seis meses ante­ri­ores ao pleito. Diz clara­mente: “ou de quem os haja sub­sti­tuído den­tro dos seis meses ante­ri­ores ao pleito, salvo se já tit­u­lar de mandato ele­tivo e can­didato à reeleição”.

Emb­ora exista quase uma una­n­im­i­dade na crítica à redação da Lei das Ineleg­i­bil­i­dades, a Lei nº. 64/​1990, ela vem no mesmo sen­tido – e não pode­ria ser difer­ente: “§ 3° São inelegíveis, no ter­ritório de juris­dição do tit­u­lar, o côn­juge e os par­entes, con­sangüí­neos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do Pres­i­dente da República, de Gov­er­nador de Estado ou Ter­ritório, do Dis­trito Fed­eral, de Prefeito ou de quem os haja sub­sti­tuído den­tro dos 6 (seis) meses ante­ri­ores ao pleito, salvo se já tit­u­lar de mandato ele­tivo e can­didato à reeleição”.

Não tendo o pres­i­dente da Assem­bleia “sub­sti­tuído” o gov­er­nador não há que se falar em ineleg­i­bil­i­dade, para si ou para qual­quer um dos lis­ta­dos na Con­sti­tu­ição.

Não existe a “ineleg­i­bil­i­dade por pre­sunção” ou pelo fato do cidadão encontrar-​se legal­mente na ordem sucessória.

Nesta linha de raciocínio – e porque assim manda a Con­sti­tu­ição –, estão inelegíveis os par­entes até segundo grau ou por adoção do gov­er­nador Car­los Brandão, bem como, os par­entes na mesma situ­ação, do pres­i­dente do Tri­bunal de Justiça, desem­bar­gador Paulo Vel­ten.

Claro que toda esta falsa polêmica teria sido evi­tada se desde o primeiro dia o pres­i­dente tivesse feito um requer­i­mento de dois pará­grafos dizendo que não tinha inter­esse em assumir o cargo de gov­er­nador por motivo de força maior, sem pre­juízo de vir a fazê-​lo noutra opor­tu­nidade.

Mas, na política tudo pode acon­te­cer, inclu­sive nada, ou, como dizia Vitorino Freire, “no Maran­hão até boi ‘avoa’”.

Abdon Mar­inho é advogado.