GOVERNO E MESTRES ‘FALTAM» AO DEBATE ESSENCIAL.
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- Criado: Sábado, 18 Março 2017 14:07
- Escrito por Abdon Marinho
GOVERNO E MESTRES ‘FALTAM» AO DEBATE ESSENCIAL.
VEÍCULOS comunicação, sobretudo, a mídia digital e redes sociais, dão conta de um certo “stress» nas relações entre o governo do Maranhão e parte da categoria dos professores estaduais.
O descontentamento teria sido causado pelo fato do governo ter feito sua base política aprovar uma Medida Provisória (MP 230) que modificou os critérios de aumento dispensado à categoria. Segundo dizem os insatisfeitos a medida retira «direitos da categoria» e que governo e parlamentares que a aprovaram seriam “traidores» dos professores. E, indo além, ameaçam fazer mais uma greve (mais uma).
Este é um assunto interessante e merece algumas considerações de nossa parte.
Decerto que os professores não ganham bem. Se compararmos seus vencimentos aos de outros países, veremos um enorme descompasso. Mas ninguém – exceto alguns potentados – ganha bem no país. A classe trabalhadora mal consegue o suficiente para se sustentar e a sua família, temos um salário mínimo que não atende as necessidades básicas do que se propõe.
A somar-se a isso, o país tem hoje 13 milhões de pessoas procurando emprego. Como o número de desempregados é medido pela quantidade de pessoas que procuram emprego, esse número é bem maior, pois as pessoas, por algum motivo, desistiram, simplesmente de buscar emprego.
Neste contexto, sem querer desmerecer o pleito dos educadores, entendo assistir razão ao governo estadual, ainda mais, quando este apresenta dados de que pagava o segundo maior salário da categoria no país e que, com aumento que hora propôs e foi aprovado, o estado pagará o maior salário do país.
A menos que provem que os dados apresentados pelo governo estadual não são verdadeiros, estamos diante de um fato histórico a ser considerado. Temos um estado dos mais pobres da federação pagando o maior salário a categoria dos professores.
Este é um fato que não pode ser desconsiderado por ninguém. A menos, repito, que provem que os dados não são verdadeiros.
Querer dizer que o Maranhão pagar um salário maior que São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e outros, não merece ser reconhecido?
Me perdoem, não acho isso justo.
Outro fato a ser considerado é que a categoria dos professores vem sendo valorizada nas últimas décadas, não apenas pelo governo federal, mas também pelos governos estaduais e municipais. Claro que esta valorização tem de ocorrer dentro das condições do país, dos estados e dos municípios, sobretudo, destes últimos que possuem limitações financeiras bem maiores e ficam impedidos de aplicar uma política de valorização de todos os servidores uma vez que têm a obrigação de cumprirem a Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF.
Na questão financeira um princípio de bom senso deve conduzir os debates: os recursos públicos são finitos. Os gestores não possuem meios de irem além dos seus orçamentos e, tirando daqui, certamente, fará falta ali.
Mais, quando o legislador impôs limites aos gastos com pessoal, partiu do princípio que os recursos públicos são «públicos» (veja que coisa) ou seja, pertencem a todo o conjunto da população, devendo, pois, servir a todos e não apenas ao funcionamento da máquina pública.
Registe-se que são limites altos: União 50% (cinquenta por cento), Estados e Municípios 60% (sessenta por cento), conforme artigo 19, da Lei Complementar 101⁄2000.
Gastar com pessoal, cinquenta ou sessenta por cento é um descompasso com as necessidades do país, pois se tem a minoria da minoria populacional consumindo uma parcela significativa dos orçamentos públicos.
Sem que os servidores consigam compreender isso o debate não avançará, pois todos se acharão com razão e direito de buscar sempre mais de um lugar onde os recursos são limitados e que, ainda que se queira, não têm com atender a todos.
Feitas essas considerações de caráter genérico e voltando para questão educacional, entendo que nas últimas décadas tanto governos quanto mestres – e mesmo a população – têm se furtado ao debate essencial: a qualidade do ensino ofertado.
Em que pese a significativa valorização dos mestres (acho que poucos haverão de discordar disso) os números revelam que a qualidade do ensino no país não apresenta melhoria ou, quando muito, não acompanhou o investimento feito, pelo contrário, o Brasil se posiciona atrás de inúmeros países que investem bem menos em educação (considerando o PIB) e em valorização dos educadores.
Os indicadores estão aí para mostrar que o Brasil está na rabeira fila.
Quando trazemos esta análise de dados para a realidade maranhense o descompasso aumenta e começa o jogo de empurra– empurra para explicar como um estado que pagava o segundo melhor salário da categoria (agora primeiro, segundo o governo) aparece nas últimas posições (não raro na última) em qualquer indicador que trate do tema.
Será que ninguém percebe que tem algo errado? Onde está a falha? Na estrutura física das escolas? Na baixa qualificação dos educadores? Ou será que acham que são as crianças “burras” e não conseguem aprender? Ou a culpa é do Sarney? Ou, culturalmente, somos propensos à ignorância?
O Brasil, o Maranhão e, principalmente, os municípios, não vêm cumprindo – salvo exceções – as metas do IDEB, que diga-se de passagem, são modestas, de longo prazo. Ainda hoje vemos municípios “zerando» o IDEB.
Desde a Constituição de 1988 e, depois com a implantação do FUNDEF (FUNDEB) o país vem investindo de forma regular em educação (investindo mais que inúmeros países ditos de primeiro mundo) sem que estes recursos se convertam no fim a que se destina: na educação, no aprendizado das crianças e dos adolescentes e, cada ano, só aumenta a quantidade de analfabetos funcionais.
O debate essencial a ser enfrentado é melhorar a qualidade do ensino ofertado. Criar condições mínimas de aprendizagem para as crianças e adolescentes.
A falta deste debate faz com que gerações se percam e ninguém ousa discutir este fato. Não se ver ninguém fazendo uma “mea culpa» ou apresentando qualquer solução. O responsável é sempre outra pessoa. Ninguém reconhece que está em divida com estas crianças que têm o futuro negado.
Há mais de trinta anos que acompanho movimentos paredistas no Maranhão (e é assim no Brasil inteiro), a pauta começa sempre com melhorias na qualidade do ensino, na estrutura física, nas melhorias salariais, e outros. Ficam trinta, sessenta dias parados – as vezes mais –, quando o governo acena com uma melhoria salarial, uma vantagem para a categoria, aceitam a proposta e esquecem as outras reivindicações que poderiam impactar na qualidade do ensino.
Muitas das vezes os estudantes cerram fileiras ao lado dos seus mestres, apoiando suas reivindicações e no final são prejudicados, perdem o ano, o concluem dentro outro perdendo conteúdo ou mesmo outras oportunidades.
Quando o debate educacional se volta para apenas um dos seus componentes e, sobretudo, quando esquece o seu principal destinatário, certamente não se vai muito longe.
Os governos e a sociedade têm a responsabilidade de enfrentarem esse problema que é urgente e só se agrava a cada dia que passa.
Abdon Marinho é advogado.