AbdonMarinho - Cotidiano
Bem Vindo a Pagina de Abdon Marinho, Ideias e Opiniões, Sexta-feira, 22 de Novembro de 2024



A palavra é o instrumento irresistível da conquista da liberdade.

A JUSTIÇA CAVA SUA SEPULTURA.

O pior que pode acontecer a uma democracia é suas instituições gerarem desconfiança aos cidadãos. Diante disso, registro, com pesar, que os últimos tempos têm registrado o enfraquecimento da justiça brasileira. A cada dia que passa cresce o número de pessoas com motivos para olhar com desconfiança aqueles que figuram com guardiões e cidadela derradeira da cidadania. 

Não passa um dia sem que um fato desabonador chegue ao conhecimento dos cidadãos. São notícias de corrupção, de abusos, de injustiças, de favorecimentos, de interesses pessoais se sobrepondo aos interesses da coletividade.

Apesar dos escândalos se sucederem numa velocidade alucinante, alguns fatos me chamaram atenção nos últimos dias. Todos, infelizmente, com capacidade de contribuir com o seu enfraquecimento.

Outro dia,  foi a entrevista de ministro do Supremo Tribunal Federal - STF, colocando, na sua opinião os riscos daquela Corte começar a ganhar integrantes, mais por sua inclinação política,  ligada ao ideário dos donos do poder, que propriamente, aos interesses da justiça e/ou a guarda da Constituição Federal.

No mesmo período, mais uma notícia nos dá conta que o Supremo Tribunal Federal determinou que fosse encaminhada a sua proposta de orçamento para próximo exercício, conforme elaborada pelo Judiciário, garantindo-lhes um aumento e elevando seus salários   para mais de 35 mil reais, e não, conforme, o contigenciamento feito pelo Poder Executivo que garantia apenas um aumento para o patamar na faixa de 31 mil reais. No caso, não se discute a regularidade da decisão. Com certeza está calcada no ordenamento jurídico, sobretudo pelo fato deste tipo de contigenciamento só poder ser feito pelo Poder Legislativo, que sabemos, não fará.

Não resta dúvida que a decisão deve está correta. O que está errado, é que fica parecendo que os julgadores tentam se colocar acima dos demais cidadãos, principalmente quando sabemos que no último ano se aumentou o numero de miseráveis no país. Decerto que suas excelências e os demais confrades nas demais instâncias do Poder Judiciário e do Ministério Público, não ganham o suficiente para tão elevadas funções e responsabilidades. Entretanto, esperava-se que um poder da República não se furtasse a participar dos esforços feitos pelo país diante de uma crise. O salário mínimo nacional, trinta vezes menor, em média, ao que ganha os poderosos do país, também não é suficiente, sequer para atender às necessidades mais prementes, apesar disso, nada podem fazer. Aos cidadãos comuns não lhes vale petições ou embargos.

Não satisfeitos em defenderem com unhas e dentes um interesse, que embora justo, não deixa de ser pessoal, buscaram agravar ainda mais a situação. Noticia-se, também, que a corte passou a “advogar\" que haja um aumento de idade para aposentadoria compulsória. 

O tema já é antigo. Não discordo, em tese, que o limite de setenta anos possa está ultrapassado para a aposentadoria compulsória, quando consideramos o aumento da expectativa de vida do brasileiros e o avanço da medicina, garantindo uma qualidade de vida bem melhor aos mais idosos. 

O que acho errado, grave e abusivo, é perceber a mais elevada Corte de Justiça do país pleitearem uma mudança na Constituição da qual são detentores  da guarda em um claro, flagrante e cristalino interesse pessoal. 

Diferente do caso do aumento em que há fundamento legal, onde, o que se questiona, é mais inoportunidade da proposta, no segundo caso estamos diante de algo muito mais serio. Temos os guardiões da Constituição buscando algo a lhes favorecerem diretamente. Noutros tempos, tal coisa, não seria sequer cogitado. 

Aos ministros é lícito a interpretação da carta constitucional e até legislar em face da ausência do Poder Legislativo, jamais afrontar a própria Constituição da qual são guardiões. 

Essa é a questão de gravidade ímpar. É isso que não podemos aceitar. Não é admissível que ministros do STF ajam como um clube de cafajestes defendendo interesses mesquinhos próprios. O Supremo não é isso, nunca  foi, não pode começar a fazer isso agora em pleno limiar do século 21. 

Claro que não se defende a imutabilidade de quaisquer regras. O Congresso Nacional pode fazer esse tipo de alteração, mas, entendo, para as gerações futuras, jamais em benefício de qualquer um dos atuais integrantes. Podem, talvez criar uma regra para valer daqui a vinte ou trinta anos. Talvez uma regra que estabeleça mandatos definitos aos integrantes do Supremo Tribunal Federal e de todos os demais tribunais superiores. Nada contra ou a opor.

O que devemos nos atentar é para a gravidade de ter os uma Corte que se quede aos interesses corporativos e busque a satisfação de interesses pessoais. Essa inquietação, vai muito além de meras insatisfações manifestadas por associações de juízes – eles mesmos contumazes defensores de interesses corporativos em detrimento da sociedade –, e da própria OAB que rotineiramente tem se manifestado a favor das teses do Poder Executivo sem se dar conta que alimenta o gênesis do próprio estado bolivariano. Ficam bancando inocentes úteis, como se não vissem o que se passa à sua volta.       

A ditadura bate à porta quando instigada pelo apodrecimento de suas instituições, o Poder Judiciário, por suas diversas instâncias, e principalmente, por sua instância máxima não pode ceder a esse tipo de canto da sereia.

A prova maior do quanto dissociado está a justiça brasileira do sentimento de cidadania também materializou-se por esses dias, quando o TJRJ confirmou uma condenação de uma agente de trânsito que fez uma abordagem a um magistrado – que infringira todas as normas – e disse que ele era apenas juiz e não Deus. O tribunal entendeu que agente – tão servidora quanto o magistrado, apenas separados pela quantidade de zeros nos contracheques e no senso de honradez – agira com abuso de poder e  zombara do magistrado. 

A decisão assentou: \"Ao apregoar que o demandado era \'juiz, mas não Deus\', a agente de trânsito zombou do cargo por ele ocupado, bem como do que a função representa na sociedade”.  

Quantos equívocos em tão poucas linhas. Mas faz sentido, talvez os julgadores não apenas se achem deuses, talvez sejam. Só isso justifica que ignorem o sentimento daqueles que lhes pagam os gordos salários. 

Abdon Marinho é advogado.