AGIOTAGEM: ORIGEM DO MAL.
Um ex-assessor do então governador Jackson Lago, disse-me, certa vez conversava com ele, colocando do grande avanço que teria o estado se conseguissem acabar com a corrupção na máquina pública. Jackson Lago, com a experiência acumulada durante anos retrucou: – se conseguirmos ao menos reduzir para metade, já teremos feito a maior revolução que o Maranhão já assistiu.
O governo do estado – já ouvi de diversos delgados –, determinou a investigação a fundo de um dos maiores males da sociedade maranhense: a agiotagem.
Ela (a agiotagem), está na raiz da maioria dos problemas do Maranhão, contaminando todas as instituições, e puxando o desenvolvimento do Estado para trás. O senador João Alberto Souza, quando ocupou o cargo de governador, declarou que o crime organizado estava enfronhado nos três poderes do estado, isso há mais de vinte anos. Hoje, sem dúvida alguma, uma das feições destas atividades criminosas se materializam através da agiotagem, da usura que sangram os cofres públicos e perpetua a miséria.
Trata-se de uma prática que foi se tornando institucionalizada e sofisticada, sendo ampliada cada vez mais, enveredando para outros tipos de crimes e para dominação da máquina do Estado.
Pode-se se dizer que foi a atividade que mais cresceu no Maranhão nos últimos 50 anos.
Desde que me entendo por gente, que ouço falar de pessoas que vivem de emprestar dinheiro a juros que chagavam até a 100% (cem por cento) do valor emprestado. Fortunas foram feitas assim.
Quando trabalhei a ALEMA, no começo dos anos 90, cansei de ouvir dizer que o dinheiro de determinados servidores não dava para nada porque grande parte do valor era repassado aos agiotas que cercavam aquela casa e atuavam com desassombro na sociedade. Ainda hoje se ouve falar isso. Todos, ou quase todos, sabem destes fatos, ao menos de "ouvir falar”.
O modus operandi é praticamente o mesmo. O cidadão sabe das dificuldades do outro e oferece dinheiro, dizem que a taxa de juros é tantos por cento. Em garantia recebe documentos de carros, assinados, de imóveis, etc. Se for pagando os juros mensais, tudo bem, se não pagar o agiota toma o patrimônio garantido, isso em último caso, pois a preferência é pela rede de dependentes pagando religiosamente os juros escorchantes.
O tempo foi passando e a miriade de agiotas passaram a enxergar no poder público um enorme filão. Com a proximidade das eleições, conforme verificam a viabilidade das candidaturas, oferecem para financiar as campanhas dos candidatos, entregando dinheiro em espécie e pegando cheques, escrituras, documentos de veículos. Muitos na falta disso, querem só o compromisso de ficarem com determinados setores das prefeituras, assumindo, o endividado o compromisso de entregar ao agente financiador as secretarias de educação, saúde, obras. Se ganham passam para dentro da prefeitura, nomeando pessoas de suas confiança e ficando como os melhores contratos nas mais variadas áreas. Com feição de legalidade, colocam diversas empresa para participarem das licitações, qualquer que ganhe está “em casa”. Têm empresas em todas as especialidades. E, segundo revelam as apurações preliminares, muitas destas de propriedade dos próprios agiotas, familiares ou prepostos.
Outra estratégia é, na escolha das candidaturas, colocarem um vice-prefeito da “confiança” do esquema para a eventualidade do prefeito ter que sair, ou ser colocado pra fora. Muitas das vezes alguém do próprio ramo.
Assim, tomam de conta das prefeituras, umas com mais ênfase, outras com mais discrição. Noutros casos, as quadrilhas montadas, simplesmente pagam um salário ao prefeito e terceiriza toda a gestão. O prefeito tem como missão só cumprir as ordens de quem o colocou no poder. Essa prática nefasta, alcança uma grande parcela dos municípios. Poucos, na verdade, são os que escapam do poder nefasto destas quadrilhas.
Devido, também, a isso, os serviços públicos não chegam aos mais necessitados. A cada gestão que passa, vemos os serviços públicos piorarem, as obras de infra-estrutura não durarem nada, muitas acabando antes mesmo da inauguração. Em tudo isso está o custo da agiotagem e da corrupção. Se você 100 mil para fazer uma obra e 50, 60 mim somem em propinas, não tenham dúvidas de que a obra não tem a mínima possibilidade de prestar.
As palavras de um ex-prefeito, confessando como a quadrilha agia em seu município não deixa dúvidas: vendiam alimentação escolar e entregavam algo bem próximo de lixo para alimentar as crianças. O ex-prefeito confessou isso.
Apesar de tudo, ninguém ousa tocar no tema, dizem que há envolvimento de pessoas dos mais altos escalões, e que os que têm aparecido, até o momento, não passam de bagrinhos, intermediários dos grandes responsáveis pela engrenagem. Dizem que há envolvimento de magistrados, de parlamentares, de empresários, empreiteiros, etc. Dizem ainda que são diversas quadrilhas atuando sob alguns comandos específicos, sangrando os municípios. Os prefeitos, que estão longe de serem santos, são, na maioria das vezes, apenas peões no xadrez destas quadrilhas.
O desvio das verbas públicas alcançam também as emendas parlamentares. Segundo dizem, o prefeito, com a administração dominada, sem conseguir fazer nada, aceita receber recursos do tesouro através emendas. O compromisso é facilitar que as quadrilhas vençam as licitações e repassar parte da verba (muitas das vezes mais de 30% do valor) para o parlamentar que conseguiu a emenda. Antes do dinheiro da emenda sair, o gestor deve entregar a parte do parlamentar em cheques, como garantia ao acordo.
Já ouvimos parlamentares denunciarem as quadrilhas de agiotagem, entretanto, nunca foram além. Nunca quiseram investigar com afinco essa situação, embora seja do conhecimento de todos a sua gravidade. Nem quando o assunto ganhou o destaque da mídia, como assassinatos, prisões e o escândalo envolvendo a Câmara de São Luís, suas excelências acharam oportuno investigar.
Os órgãos e controle podem e devem intervir neste assunto. Umas das primeiras medidas deveria ser a proibição dos bancos emitirem cheques às prefeituras municipais e outros órgãos, como câmaras, institutos de previdências e outros órgãos; outra medida seria o MPE de cada comarca acompanharem de perto as licitações dos órgãos e a execução dos serviços prestados, inclusive quanto a qualidade das obras, serviços e materiais fornecidos; mais: cobrarem o cumprimento da lei de transparência e acesso à informação.
A mim, parece ingênua a tentativa de fazerem a população acreditar que o mal do modelo político é causado pelo financiamento privado das campanhas. Vai muito além disso, o financiamento, privado, dentro lei e transparente não causaria maiores problemas se o poder político não tivesse sido sequestrado por quadrilhas.
Abdon Marinho é advogado.