AbdonMarinho - A loucura conduz a cegueira no Brasil.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Domingo, 22 de Setem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

A lou­cura con­duz a cegueira no Brasil.

A LOU­CURA CON­DUZ A CEGUEIRA NO BRASIL.

Por Abdon Marinho

PARECE que a des­graça shake­spear­i­ana abateu-​se sobre o país.

Nunca uma citação fez tanto sen­tido em relação a um país, em um deter­mi­nado momento, quanto uma de Shake­speare pro­fe­ria há quase 420 anos: «É uma infe­li­ci­dade da época, que os doi­dos guiem os cegos». William Shakespeare.

Parto do pres­su­posto de que mesmo os mais devo­tos do sen­hor Bol­sonaro já devam ter perce­bido que ele não goza de per­feita saúde men­tal. Aliás, não ape­nas ele mas muito no seu entorno desen­volveram algum tipo de com­por­ta­mento para­noico, manias de perseguição, psi­co­pa­tia e, tam­bém, um com­por­ta­mento dis­so­ci­ado da real­i­dade.

Noutras palavras: lou­cura, psi­co­pa­tia e alien­ação.

Desde que assumiu o poder, o pres­i­dente da República, a quem caberia a defesa da nação, tra­balha incansavel­mente para conflagra-​la. Já nos primeiros meses de gov­erno lá estavam ele e seus ali­a­dos ten­tando se sobre­por aos demais poderes, pior, pre­gando aber­ta­mente que fos­sem extin­tos ou fecha­dos.

As ima­gens estão aí para quem quiser confrontá-​las, fazer uma linha do tempo. O pres­i­dente em pes­soa par­ticipou de tais even­tos. Um dos fil­hos, dep­utado fed­eral, chegou ao descara­mento de dizer que para fechar o Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF, instân­cia máx­ima da justiça do país, bas­taria um cabo e um sol­dado. Noutra opor­tu­nidade, em entre­vista, chegou a dizer que tal coisa não seria se, mas quando iria ocor­rer.

O con­fronto com os demais poderes con­sti­tuí­dos foi perseguido pelo pres­i­dente – e con­tinua sendo –, dia após dia, através de provo­cações para a claque do “cer­cad­inho” ou das redes sociais.

A estraté­gia sem­pre foi tes­tar os lim­ites das insti­tu­ições e, até mesmo, das pes­soas que as inte­gram. Por der­radeiro, pas­sou atacar sem trégua o sis­tema eleitoral brasileiro.

Já se vão três anos per­di­dos quando se dev­e­ria usar as ener­gias para solu­cionar os graves prob­le­mas que atrav­essa o país, sobre­tudo, o desem­prego e a inflação.

O primeiro, nega dig­nidade ao cidadão de bem, enquanto o segundo destrói as con­quis­tas dos que ainda tra­balha.

Como não qual­i­ficar de lou­cura o com­por­ta­mento daquele que trama con­tra o próprio gov­erno, as insti­tu­ições, a pátria e a tran­quil­i­dade da sociedade.

A lou­cura se faz perce­ber por um outro viés: o de atribuir aos out­ros as con­se­quên­cias de seus próprios atos.

Ora, desde o começo, basta um pouco de isenção e hon­esti­dade, para perce­ber que o pres­i­dente sem­pre tra­bal­hou, perseguiu uma rup­tura insti­tu­cional. Sabedor das próprias lim­i­tações, busca a per­manên­cia no poder através do golpe mil­i­tar – con­forme vimos diver­sas vezes incen­ti­vando atos neste sen­tido –, e/​ou “vendendo” a nação aos cor­rup­tos de sem­pre.

Há quase quarenta anos que não víamos um pres­i­dente da República ou mesmo out­ras autori­dades fed­erais falar em colo­car tropas nas ruas, bus­car tutela das Forças Armadas para gov­ernar ou out­ros chiliques – a última vez que eu me recordo disso ter ocor­rido foi em 1984, por ocasião da votação da emenda Dante Oliveira –, agora, todo dia, o pres­i­dente, seus ali­a­dos e out­ros malu­cos, não param de falar isso, repetem como se fosse um mantra.

Até mesmo des­file mil­i­tar fora de época resolveram inven­tar. Claro que foi patético, ridículo e ino­por­tuno o des­file mil­i­tar que pro­moveram no dia 10 de agosto, pas­sado.

A não ser pela lou­cura com resquí­cios de alien­ação, não fazia qual­quer sen­tido “desviar” sol­da­dos e equipa­men­tos mil­itares em treina­mento para pas­sar pela esplanada dos min­istérios para entre­gar um con­vite ao pres­i­dente.

Não sabem que já inven­taram o e-​mail, aplica­tivos de men­sagens ou mesmo que pode­riam man­dar por algum serviço de entrega ráp­ida? Pode­riam, mesmo, só ligar. Evi­tando, assim, mais despe­sas para o país.

A não ser, que não tenha sido uma “trág­ica coin­cidên­cia” pro­gra­marem o des­file mil­i­tar para o mesmo dia em que o plenário da Câmara dos Dep­uta­dos votaria um pro­jeto de emenda con­sti­tu­cional de inter­esse do pres­i­dente.

Pois é, a “trág­ica coin­cidên­cia”, de que tra­tou o pres­i­dente da Câmara, reme­teu jus­ta­mente ao último “ato de força” do último pres­i­dente do régime mil­i­tar por ocasião da votação da emenda Dante de Oliveira.

A difer­ença entre o que acon­te­ceu naquela opor­tu­nidade e agora foi que o remake foi ridículo em todos os aspec­tos.

Para quem diz a cada meia hora que só se pre­ocupa com a “liber­dade do povo” pareceu-​nos extrema­mente patético que tenha se inspi­rado em uma lem­brança dos tem­pos da ditadura brasileira, ou de tan­tos out­ros regimes autoritários ao redor do mundo na atu­al­i­dade, como a Rús­sia, a China ou a Cor­eia do Norte, os dois últi­mos regimes total­itários comu­nistas – que o pres­i­dente e seus ali­a­dos dizem repu­diar.

Em um ato falho, aliás, um dep­utado bol­sonar­ista usou ima­gens de um des­file mil­i­tar da China, o demônio comu­nista, como se fosse o min­guado des­file ocor­rido na esplanada.

Outro exem­plo da lou­cura e da psi­co­pa­tia que acomete os gov­er­nantes é a con­dução da pan­demia – ou a não con­dução –, o país, até aqui é o segundo em número de mortes cau­sa­dos pelo vírus, com quase 570 mil mor­tos, muitas destas mortes teriam sido evi­tadas se o gov­erno cen­tral não tivesse min­i­mizado o vírus e sab­o­tado as medi­das de dis­tan­ci­a­mento social recomen­dadas pelos espe­cial­is­tas e, se no tempo certo, tivesse se mobi­lizado para o desen­volvi­mento e aquisição de vaci­nas.

Na sua lou­cura psi­co­pata o pres­i­dente semi-​analfabeto “investiu-​se” de Deus como se só ele tivesse a solução para o problema.

Depois, para fugir da respon­s­abil­i­dade, pas­sou a recla­mar que Supremo havia reti­rado seus poderes para con­dução da crise san­itária.

Uma men­tira repetida infinita vezes por eles e seus ali­a­dos já tan­tas vezes des­men­ti­das mas que ainda insis­tem em dizer.

Na ver­dade o que o STF fez ape­nas dizer, numa decisão, o que esta­b­elece a Con­sti­tu­ição Fed­eral, que:

“Art. 18. A orga­ni­za­ção político-​administrativa da República Fed­er­a­tiva do Brasil com­preende a União, os Esta­dos, o Dis­trito Fed­eral e os Municí­pios, todos autônomos, nos ter­mos desta Constituição”.

Em out­ras palavras: os Esta­dos, o Dis­trito Fed­eral e os Municí­pios, nos ter­mos da Con­sti­tu­ição, são autônomos e, espe­cial­mente, na questão da saúde pos­suem com­petên­cia comum com os demais entes, con­forme esta­b­elece o artigo 23, II, verbis:

Art. 23. É com­petên­cia comum da União, dos Esta­dos, do Dis­trito Fed­eral e dos Municí­pios: II — cuidar da saúde e assistên­cia pública, da pro­teção e garan­tia das pes­soas por­ta­do­ras de deficiência”.

Só a lou­cura e/​ou psi­co­pa­tia jus­ti­fi­caria essa celeuma diante do nada com tan­tos mil­hares de brasileiros mor­rendo.

O STF – não podia ser difer­ente –, recon­heceu a val­i­dade dos dis­pos­i­tivos acima no com­bate à pan­demia. Caberia o gov­erno fed­eral, respei­tando as bal­izas legais, coor­denar as ações macro, o que não fez, optando por fazer “biquinho” e sab­o­tar as medi­das que ele (gov­erno fed­eral) dev­e­ria ter ori­en­tado.

A lou­cura pela alien­ação é man­i­festa quando imag­i­nam, sug­erem e ameaçam que podem tomar o poder pela força usando as Forças Armadas como um fajuto poder mod­er­ador para tute­lar os poderes legí­ti­mos e con­sti­tu­cionais.

Os alien­ados acham que aos poderes da República são como cri­anças brig­ando e que o “paizão”, rep­re­sen­tado pelas Forças Armadas, chega lá e coloca cada um no seu lugar. Ou seja, coisa de alien­ados “tapa­dos”.

Se por estas e tan­tas out­ras coisas temos a con­vicção de que loucos con­duzem a nação, quem são os cegos que, não ape­nas se deixam con­duzir, como tam­bém defen­dem com unhas e dentes tais lou­curas?

A cegueira política existe desde sem­pre.

Dita­dores como Hitler, Mus­solini, Stálin, Mao, os Cas­tro, Chávez, ape­nas para ficar nos exem­p­los mais con­heci­dos, não pros­per­ariam se não con­tasse com o apoio de parte de seus con­ci­dadãos para chegarem ao poder e depois se man­terem os seus regimes de ter­ror.

No Brasil de agora não é difer­ente – vive­mos um surto autoritário com quase cem anos de atraso. Poderíamos, até mesmo, dizer que são os autoritários “retar­da­dos”.

São cegos os mil­itares (de pijama ou não) por não enx­er­garem que estão cor­roendo todo o prestí­gio que con­quis­taram graças a dis­crição e respeito a democ­ra­cia brasileira desde que deixaram o poder há quase quarenta anos.

Estão cegos pela vaidade desme­dida a ponto de acharem que a pop­u­lação irá aceitar e con­cor­dar com o retro­cesso do qual não sen­ti­mos nen­huma saudade.

Estão cegos pela ambição os políti­cos das casas do Con­gresso Nacional que se deixaram coop­tar por gor­das emen­das, e con­tra os inter­esses da nação, não fazem nada para bar­rar os absur­dos que vêm ocor­rendo no país.

Está cego o Min­istério Público que esque­cendo sua mis­são insti­tu­cional se tornou sócio de toda a crise insti­tu­cional que se aba­teu na nação, inclu­sive no mor­ticínio de 570 mil brasileiros. Se os cegos do MPF não tivessem se escu­sado de suas respon­s­abil­i­dades muito dos prob­le­mas que pas­samos não teriam ocorrido.

Está cega uma parcela da pop­u­lação (já minoritária) que apoia os delírios golpis­tas e todas as out­ras atro­ci­dades que vem sendo cometi­das como se estivessem fes­te­jando a con­quista da copa do mundo.

Tal cegueira a leva às ruas pedindo golpe mil­i­tar, pedindo fechamento do leg­isla­tivo e do judi­ciário e o retorno dos instru­men­tos de repressão do antigo régime mil­i­tar como o Ato Insti­tu­cional nº 05.

São os cegos pela ignorân­cia, por não saberem o que é viver sob o jugo de um régime dita­to­r­ial – não importa qual –, e ainda ousam usar as datas da pátria com suas pau­tas cor­romp­i­das.

Nunca Shake­speare fez tanto sen­tido no Brasil.

Abdon Mar­inho é advo­gado.