AbdonMarinho - SERIA O MARANHÃO A GRANJA DO SOLAR?
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Domingo, 22 de Setem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

SERIA O MARAN­HÃO A GRANJA DO SOLAR?

SERIA O MARAN­HÃO A GRANJA DO SOLAR?

Por Abdon Marinho.

DIZEM que a vida imita a arte – ou seria o con­trário: a arte que imita a vida –, seja como for, ao exam­i­nar a atual quadra da história maran­hense tenho por mim que esta é inspi­rada no clás­sico da lit­er­atura inglesa “A Rev­olução dos Bichos”, de George Orwell. O livro que teve sua primeira edição lançada em 1945 trazia o sub­tí­tulo “Um conto de fadas”, emb­ora, ape­sar de nar­rar a tomada do poder na granja solar pelos bichos, todos soubessem tratar-​se de uma clara alusão à Rev­olução Russa, de 1917, que levou os comu­nistas ao poder – e seus des­do­bra­men­tos. O que teríamos a arte a imi­tar a vida.

Aqui, por sua vez, todos somos sabedores, que não fiz­eram um “roteiro” de gov­er­nança inspi­rado na obra referida – é até provável nunca ten­ham lido tal obra, muitos até duvi­dam que saibam ler –, entre­tanto, em quase tudo, é como se a vida imi­tasse a arte.

Claro, tudo muito car­i­cat­ural e, como toda car­i­catura, sobressaindo-​se mais os defeitos que as supostas e invisíveis qual­i­dades.

Se tomásse­mos o Maran­hão pela Granja do Solar, veríamos os anti­gos donos da “granja” foram apea­dos do poder pelos comu­nistas que tais como os ani­mais do conto de fadas, se auto­de­nom­i­nam de “cama­radas”.

Tal como no conto, as promes­sas foram se esvaindo a ponto de os bichos já não perce­berem a difer­ença na admin­is­tração da “granja”, entre os humanos, a família Jones e os seus cama­radas que agora estavam no poder.

Muitas coisas para o con­junto dos bichos até pio­raram.

No poder os novos líderes da granja retomaram muitas das vel­has práti­cas ori­un­das da antiga admin­is­tração, e, dizem, “elegeram” alguns pro­te­gi­dos, com direto a rece­berem reg­u­lar­mente os favores da admin­is­tração da granja em detri­mento de outros.

Con­sta do livro a repressão a todos aque­les que “ousassem” dizer qual­quer coisa con­tra o que se pas­sava. De uma só vez diver­sos bichos foram sac­ri­fi­ca­dos ou expul­sos da granja.

Por fim, restaram na granja ape­nas aque­les que con­cor­davam com tudo que o líder dizia e aque­les que não tin­ham cor­agem de dizer nada em con­trário.

A con­cordân­cia pela con­veniên­cia e/​ou pelo medo.

No livro con­sta que cir­cu­laram boatos de uma aliança entre os bichos que estavam na admin­is­tração da granja e os anti­gos pro­pri­etários, a família Jones. Alguma verossimilhança?

Ape­sar de come­ter uma indel­i­cadeza devo dizer que a obra encerra com a granja sendo chamada pelo antigo nome e alguns bichos enquanto olham pelas frestas da casa grande onde acon­te­cia uma festa dos líderes já não enx­er­gavam mais como aque­les que os lid­er­aram no iní­cio da tomada do poder dos humanos.

O livro “A Rev­olução dos Bichos” é incon­tornável para enten­der­mos, a par­tir de uma visão crítica, o que passa ao nosso redor. Lem­bro de tê-​lo lido pela primeira vez em mea­dos dos anos oitenta, quarenta anos depois de lançado, e, desde então, mais algu­mas vezes.

Noutras ocasiões – e, tam­bém, me referindo a atual quadra política no estado –, já o tinha citado.

Nos últi­mos dias alguns acon­tec­i­men­tos – entre tan­tos –, me fiz­eram recor­dar o velho livro.

O primeiro, aprovação pela assem­bleia leg­isla­tiva do pro­jeto de lei que alterou a alíquo­tas de con­tribuição dos servi­dores.

Os sen­hores dep­uta­dos quase que aprovam a matéria pou­cas horas depois da chegada ao par­la­mento. Só não o fiz­eram em razão de algum par­la­men­tar haver pedido vis­tas, o que levou a aprovação “vapt-​vupt” para o dia seguinte.

Não se ouviu um protesto. Nem mesmo dos “valentes” rep­re­sen­tantes das cat­e­go­rias.

Como disse em um texto sobre o assunto, ainda que a matéria fosse impor­tante e se estivesse ape­nas repli­cando uma norma con­sti­tu­cional aprovada pelo Con­gresso Nacional, a inter­dição ao debate democrático é con­trária a qual­quer sen­ti­mento do que seja democ­ra­cia.

Mesmo aque­les pas­sam os dias crit­i­cando o gov­erno fed­eral – e o pres­i­dente –, acusando-​o de dita­dor, tru­cu­lento, e tan­tos out­ros xinga­men­tos de baixo calão, emude­ce­ram. Calaram-​se, diante da forma como o gov­er­nador do Maran­hão aprovou a matéria que “gar­fou” parte dos rendi­men­tos dos servi­dores públi­cos. Ainda que todos saibam que foi o atual gov­erno que que­brou a previdência.

Agora mesmo, no Paraná, onde o gov­erno local levou a Assem­bléia Leg­isla­tiva matéria semel­hante, tive­mos protestos vio­len­tos por parte dos servi­dores.

O segundo, foi o episó­dio em que um aux­il­iar do gov­erno estad­ual foi com­pelido a desculpar-​se por falar a ver­dade. Nunca tinha visto algo semel­hante. Talvez no tempo do can­gaço, em que, nos bailes, os cidadãos de bem pediam des­cul­pas aos can­ga­ceiros quando tin­ham a infe­li­ci­dade de ter os pés pisa­dos por eles.

Pois bem, o aux­il­iar do gov­erno, arti­c­ulista de um jor­nal local, escreveu, com base em dados téc­ni­cos, uma crítica à edu­cação munic­i­pal. No texto, tendo o cuidado de não “ofender” ninguém lançou a respon­s­abil­i­dade pelo desas­tre da edu­cação munic­i­pal a uma enti­dade abstrata.

Pra quê?! Os cama­radas comu­nistas par­ti­ram para cima do homem “com tudo”, por pouco não dis­seram que a edu­cação munic­i­pal é mod­elo para o Brasil – a mesma patranha que dizem em relação a edu­cação estad­ual.

Menos de quarenta e oito horas depois de pub­li­cado o texto, lá estava o aux­il­iar gov­er­na­men­tal pedindo des­cul­pas por “dizer a ver­dade”.

Ficou a dúvida se ele men­tiu ao escr­ever o texto ou ao pedir des­cul­pas por tê-​lo escrito.

O arti­c­ulista tra­balha com edu­cação e aux­ilia o gov­erno jus­ta­mente nisso. Aí você vê que essa pes­soa não pode dizer aquilo que pensa, fun­dado em dados téc­ni­cos inques­tionáveis, sem sofrer uma repri­menda dos diri­gentes par­tidários do gov­erno.

Onde esta­mos? Na União das Repúbli­cas Social­is­tas Soviética — URSS, stalinista?

Vejam, a edu­cação pública munic­i­pal é uma ver­gonha.

Ainda hoje se tra­balha com “escol­in­has” comu­nitárias e, se os números apre­sen­ta­dos pelo aux­il­iar do gov­erno estad­ual cor­re­spon­derem à ver­dade, a edu­cação pública munic­i­pal é, tam­bém, crim­i­nosa, por pri­var um grande número de cri­anças do acesso a edu­cação pública de qualidade.

Querem saber mais? A edu­cação pública estad­ual é tam­bém uma des­graça.

As autori­dades estad­u­ais ten­tam, por todas as for­mas, apare­cer bem na fita, mas a real­i­dade é que os estu­dantes sabem cada vez menos, os pro­fes­sores não podem cobrar ou reprovar aque­les que não sabem o mín­imo para pas­sar de ano e, para com­ple­tar o tragé­dia, a rede estad­ual, em detri­mento do cur­rículo básico, está “treinando” os alunos para o Exame Nacional do Ensino Médio — ENEM, ao invés de educá-​los verdadeiramente.

Querem saber mais? A edu­cação brasileira é uma coisa hor­renda.

Os dados do PISA/​OCDE divul­ga­dos recen­te­mente ates­tam que o Brasil con­tinua na “rabeira” em tudo: lín­guas; ciên­cias e matemática.

A tragé­dia é pior. Os dados com­pro­vam que esse mod­elo edu­ca­cional “errado” estag­nou a apren­diza­gem no país na última década.

Os gov­er­nos brasileiros, sobre­tudo, munic­i­pais e estad­u­ais, “roubaram” uma década de edu­cação das nos­sas crianças.

Os “nos­sos” gov­er­nantes vão man­dar calar o PISA/​OCDE? Vão exi­gir que se desculpem?

Vejam, é ver­dade que o alcaide munic­i­pal não é o único respon­sável pela “tragé­dia” da edu­cação munic­i­pal, mas ele tem, sim, parcela de culpa. Ele está no poder há sete anos, o gov­er­nador há cinco anos, esse é tempo mais que sufi­ciente, senão para resolver um prob­lema que vem de décadas, pelo menos apre­sen­tar encaminhamentos.

O que fiz­eram? Nada ou quase nada?

Nos últi­mos sete anos, a notí­cia que se tem é que o Municí­pio de São Luís “perdeu” diver­sas creches e esco­las no padrão MEC, porque não foram capazes de exe­cu­tar os pro­je­tos, de con­seguir os ter­renos ou por out­ras coisas mais pro­saicas.

Em diver­sas out­ras áreas da admin­is­tração se deu a mesma coisa.

O que se diz do atual gestor é que somente agora, na reta final do sétimo ano de mandato, é que ele ressurgiu com algu­mas obras, nos sete anos para trás ninguém sabe onde estava.

Ora, temos que, para os atu­ais donatários do poder, dizer a ver­dade, expor a real­i­dade com dados é mais grave do que a situ­ação em si.

O ter­ceiro episó­dio – que já trata­mos aqui, mais de uma vez –, nos foi exposto por um jor­nal­ista em redes soci­ais. Den­tre tan­tos out­ros, narra-​nos que tem sofrido proces­sos judi­ci­ais do gov­erno estad­ual.

Não se trata de uma exe­cução de dívida inscrita na fazenda pública, ou coisa que o valha.

O “estado” sente-​se “ofen­dido” por algo que o jor­nal­ista escreveu, chama um dos seus procu­radores, pago pelo con­tribuinte, para proces­sar … o con­tribuinte.

Ape­sar da situ­ação dev­eras grave, pois não con­cebo que o estado processe cidadãos por, suposta­mente, se sen­tir “ofen­dido” – ato para o qual o Min­istério Público ainda não enx­er­gou impro­bidade admin­is­tra­tiva –, causa-​me per­plex­i­dade que não haja um protesto vee­mente de enti­dades jor­nalís­ti­cas; das de defesa da liber­dade de imprensa; das de garan­tias indi­vid­u­ais e da cidada­nia.

Além dos proces­sos que os jor­nal­is­tas já sofrem por parte das autori­dades, gov­er­nador, secretários e servi­dores diver­sos, não me parece razoável que o estado processe cidadãos pelo fato destes expres­sarem o que pen­sam sobre o estado.

Pelo con­trário, é papel do estado garan­tir que isso ocorra.

A prática do estado reprimir a liber­dade de expressão é incom­patível com a democ­ra­cia, sendo comum, ape­nas, nas ditaduras mais san­guinárias ou na Granja do Solar sob o comando dos cama­radas.

Abdon Mar­inho é advo­gado.