AbdonMarinho - AS VÍSCERAS EXPOSTAS DA REPÚBLICA.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sexta-​feira, 22 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

AS VÍSCERAS EXPOSTAS DA REPÚBLICA.

AS VÍSCERAS EXPOSTAS DA REPÚBLICA.
NO INÍ­CIO desta Sem­ana Santa, logo na segunda-​feira, recebi a visita de um amigo e este indagou-​me qual a leitura que fazia do atual quadro político, sobre­tudo, o estad­ual.
A minha resposta a ele foi que achava pre­cip­i­tada qual­quer análise, ainda mais, se con­sid­erásse­mos que a Oper­ação Lava Jato, pode­ria apre­sen­tar novi­dades sobre os atores envolvi­dos no processo político nacional e/​ou estad­ual.
Fui além, disse-​lhe: uma pesquisa que coloca o atual gov­erno estad­ual com ape­nas 60% (sessenta por cento) de prefer­ên­cia, não dev­e­ria ser motivo de comem­o­ração, mas de levar os gov­ernistas a acen­derem o alerta ver­melho.
E, expli­cava o por quê. Pon­der­ava que este um gov­erno que sim­boliza toda a esper­ança de um povo que não con­hecia outro mod­elo de gov­er­nança que não o rep­re­sen­tado pelos quase cinquenta anos do grupo Sar­ney. Dizia mais. O gov­erno estava «ditando pauta», gov­er­nando soz­inho, sem, prati­ca­mente ninguém, com estatura política se apre­sen­tando para lhe fazer som­bra ou lhe causar embaraços.
Aproveitei para fazer troça. Imag­inemos uma luta de MMA (disse boxe), o locu­tor com sua empol­gação pecu­liar nar­raria: – vaaaaai começar a luta. De um lado o desafi­ado, peso pesadís­simo, com 1,90 m de altura, pesando 140 kg(?); do outro lato, o desafi­ante, con­hecido por ninguém, sem altura, sem peso.
Incom­preen­sível que nes­tas condições, o desafi­ado tivesse ape­nas sessenta por cento e «ninguém», o desafi­ante, dom­i­nasse os out­ros quarenta.
Con­cluía a análise pon­derando que depen­dendo do real desafi­ante pode­ria até ser que o desafi­ado crescesse, mas que tudo isso depen­de­ria, tam­bém, dos des­do­bra­men­tos das oper­ações judi­ci­ais em anda­mento.
Voltarei ao Maran­hão na con­clusão deste texto.
Na tarde do dia seguinte o Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF, divul­gou a relação dos inquéri­tos que abriria, no caso dos que pos­suem foro por pre­rrog­a­tiva de função (foro priv­i­le­giado), o encam­in­hamento dos demais envolvi­dos as autori­dades autori­dades com­pe­tentes. Na edição espe­cial do diário da Corte, os despa­chos con­tendo um breve resumo do que os colab­o­radores falaram de cada um. Fez mais, levan­tou o sig­ilo dos casos sobre sua alçada e per­mi­tiu que a sociedade tivesse acesso, as nar­ra­ti­vas dos basti­dores da nação, as propinas pagas, a troca de favores, as nego­ci­ações de inter­esses, os sac­ri­fí­cios da nação em proveito da casta de políti­cos. O Brasil foi apre­sen­tado ao Brasil de ver­dade. Num outro para­lelo, foi como se saísse­mos do Jor­nal Nacional, da Globo, para o Brasil Urgente, da Band. Só que este Brasil Urgente está sendo exibido por todas as emis­so­ras, todos os dias, todas as horas.
Desde a noite de terça-​feira, talvez pelo vol­ume amazônico de infor­mações, a nação parece está em sus­pense, uma espé­cie de delírio cole­tivo, um estu­por, um sen­ti­mento de incredul­i­dade. Não é para menos, os fatos nar­ra­dos são de gravi­dade ímpar. Parece que tudo vimos antes e que sabíamos exi­s­tir, era ape­nas um aper­i­tivo para o esta­mos assistindo agora.
Por incrível que pareça não esta­mos, ainda, no ápice, emb­ora a Ode­brecht seja a maior cor­rup­tora, sua atu­ação era mais restrita. O próprio coman­dante da empresa, no seu depoi­mento, deixou claro que não se metia na esfera munic­i­pal, por exem­plo, deixando esta atu­ação para out­ras «par­ceiras» e, que ao fazer isso, descon­taria a propina da conta cor­rente de propina do gov­erno cen­tral.
Ape­sar disso o que temos rev­e­lado até aqui mostra clara­mente o nível de rela­ciona­mento promis­cuo entre empre­sas e agentes públi­cos e como a cor­rupção foi se insti­tu­cional­izando a ponto desta empresa (sabe-​se que out­ras tan­tas) cri­asse um setor especí­fico para tratar do assunto. Temos a impressão que o poder cen­tral era exer­cido, na ver­dade, por esta é por out­ras empre­it­eiras ou gru­pos econômi­cos – isso em pleno gov­erno dito, «dos tra­bal­hadores » –, onde estes man­tinham os gov­er­nantes e sua base política como «ter­ce­i­riza­dos».
Vejam, o que está dito é que o sen­hor Lula, a sen­hora Dilma, através dos sen­hores Antônio Palocci e Guido Man­tega, man­tiveram uma conta-​corrente no depar­ta­mento de propina da Ode­brecht; o que está dito, é que além, disso, exec­u­tivos da empresa nego­ci­avam den­tro do Palá­cio, dos min­istérios e das casas do par­la­mento, leis, medi­das pro­visórias, incen­tivos fis­cais, emprés­ti­mos bil­ionários, junto a ban­cos ofi­ci­ais.
Não temos dúvi­das – e os depoi­men­tos apon­tam para isso – de que a cor­rupção alcançou à todos, com as muito hon­radas exceções para jus­ti­ficar a regra, mas no caso dos gov­er­nos petis­tas, ela foi muito além. Eles, tão refratários à política de ter­ce­i­riza­ção de mão de obra, ter­ce­i­rizaram o Estado inteiro e eram ban­ca­dos pelos donos do poder econômico.
É isso que se depreende dos depoi­men­tos do Marcelo Ode­brecht e dos exec­u­tivos e ex-​executivos da empresa que teve a delação rev­e­lada esta sem­ana.
Noutra quadra, ape­sar do vol­ume extra­ordinário de infor­mações, é necessário que se sep­are o joio do trigo. Como vimos, para os empresários cor­rup­tores, todo din­heiro que saía dos cofres das empre­sas era cor­rupção, inde­pen­dente de ser doação eleitoral nos ter­mos per­mi­ti­dos pela leg­is­lação eleitoral, doação ao chamado «caixa 2″, propina, ter­ce­i­riza­ção do Estado e out­ras modal­i­dades.
Ao colo­car­mos tudo no mesmo saco, emb­ora pareça ten­ta­dor, ape­nas está se igua­lando os desiguais e come­tendo injustiças.
Ora, para os cor­rup­tores, Brasília – e exten­sível aos palá­cios estad­u­ais – é um imenso shop­ping cen­ter, logo tudo mer­cado­ria a ser com­prada, a ser ven­dida, tudo na conta única da cor­rupção. A assertiva, emb­ora não seja de todo descar­tada, há que se pon­derar que existe uma difer­ença imensa entre doação para cam­panha eleitoral e man­ter uma conta-​corrente no depar­ta­mento de propina de uma empresa. Ainda uma doação através de «caixa 2″ é difer­ente de se nego­ciar paga­mento para não ser chamado a depor ou pela aprovação de uma lei que, em detri­mento do inter­esse público ben­e­fi­cie uma empresa ou grupo econômico.
Assim, faz-​se necessário esse dis­tin­guir.
Opor­tuno lem­brar que até o ano de 2014, den­tro dos lim­ites esta­b­ele­ci­dos na leg­is­lação eleitoral, eram per­mi­ti­das doações de empre­sas a can­didatos. E, emb­ora, desde sem­pre proibido, uma cam­panha fazer despe­sas não con­tabi­lizadas ou fazer de empre­sas para pagar as despe­sas que sobraram ao final do pleito, não era coisa de «outro mundo». Na ver­dade, até então, as prestações de con­tas eleitorais, sem­pre foram mais fic­cionais que reais.
Ao meu sen­tir, é desar­ra­zoado exam­i­nar, com rigor inquisitório e sem as dev­i­das gradações, con­du­tas que, até então, não eram crim­i­nosas ou con­sid­er­adas como tais no momento de sua prática. Noutras palavras, equivocam-​se aque­les que colo­cam no mesmo bal­aio alguém que nos anos noventa pediu doações de cam­panha (e aí nem se faz dis­tinção sobre por qual caixa) com alguém que nego­ciou emprés­ti­mos, medi­das pro­visórias ou ter­ce­i­ri­zou aos empresários seus gov­er­nos. Repito: é necessário sep­a­rar crime do que era uma prática «nor­mal».
Volte­mos ao Maran­hão de que tratá­va­mos no iní­cio do texto.
A citação do nome do gov­er­nador do Maran­hão, Flávio Dino, no con­texto do que trata­mos ante­ri­or­mente, merece uma con­sid­er­ação espe­cial.
O gov­er­nador é referido «no termo de depoi­mento do colab­o­rador José de Car­valho Filho (Termo de Depoi­mento n. 2), o qual relata que, no ano de 2010, par­ticipou de reuniões com o então Dep­utado Fed­eral Flávio Dino, tratando de questões acerca do Pro­jeto de Lei 2.279÷2007, o qual atribuiria segu­rança jurídica a inves­ti­men­tos do Grupo Ode­brecht. Num desses encon­tros, teria lhe sido solic­i­tada ajuda para cam­panha eleitoral ao gov­erno do Estado do Maran­hão, paga­mento efe­t­u­ado no total de R$ 400.000,00 (qua­tro­cen­tos mil reais). A senha para rece­ber o repasse teria sido entregue à época ao próprio par­la­men­tar, sendo a oper­ação real­izada pelo Setor de Oper­ações Estru­tu­radas e reg­istrada no sis­tema “Drousys”.«
Na esteira do que exter­namos acima, a situ­ação do gov­er­nador maran­hense, como todas as demais, merece o exame sob a luz da gradação. Ela não é grave pelo que está dito e sim pela forma como foi dita. A ver­são do fato se sobre­pondo aos mes­mos. A ver­são na visão do dela­tor que «linka» uma coisa à outra.
Vejamos: era/​é per­feita­mente nor­mal que exec­u­tivos de empre­sas, rep­re­sen­tantes de sindi­catos, de gru­pos ou de quais­quer cat­e­go­rias com inter­esses numa deter­mi­nada matéria em trami­tação nas casas do Con­gresso Nacional, vis­item os par­la­mentares, peçam audiên­cias e expon­ham seus argu­men­tos, ainda mais, quando este par­la­men­tar tem influên­cia no par­la­mento – que era a situ­ação do referido. Tam­bém, «per­feita­mente nor­mal», até então, que par­la­mentares son­hando com voos mais altos, solic­i­tassem con­tribuições de cam­panha, sim, era/​é promís­cuo, mas fazia (e, emb­ora proibido, ainda faz) parte da política brasileira.
Então, no con­texto em que se teria dado o fato, empresa defender uma matéria, um político pedir con­tribuição para cam­panha (nem ques­tiono, se por qual caixa), estava den­tro das regras «democráti­cas» vigentes.
A des­graça (se o fato tivesse exis­tido, como negam os gov­ernistas) seria o «link» entre as duas coisas: apoio à medida em troca do numerário, não que isso fosse um escân­dalo no par­la­mento nacional, mas por se tratar deste par­la­men­tar, espe­cial­mente, com car­reira jurídica sól­ida e ori­undo da mag­i­s­tratura nacional.
E, ainda, se o fato tivesse exis­tido, talvez tenha se dado ape­nas uma inter­pre­tação do exec­u­tivo. Acos­tu­mado a com­prar tudo e a todos no shop­ping Brasília, teria intuído que o dep­utado ao solic­i­tar uma con­tribuição de cam­panha, estaria, na ver­dade, condi­cio­nando uma coisa à outra.
Con­vém salien­tar que, até aqui, as ações da Polí­cia Fed­eral, do Min­istério Público Fed­eral, dos mag­istra­dos envolvi­dos nesta oper­ação con­hecida como Lava-​Jato, têm sido mais exi­tosas que fra­cas­sadas e têm se pau­tado com muito rigor, isso não sig­nifica, talvez pelo aço­da­mento do tema, que este­jam imunes a equívo­cos ou erros de inter­pre­tação, estes, sem­pre exi­s­tirão.
Nada é pior ao ser humano que ser vítima de acusação injusta, por isso mesmo, por toda sua história e por, prin­ci­pal­mente, rep­re­sen­tar um sopro de esper­ança, torço para que o gov­er­nador con­siga esclare­cer a todos este episó­dio, não per­mitindo que paire uma névoa de dúvida sobre o maior patrimônio do homem digno: sua honra.
Abdon Mar­inho é advogado.