AbdonMarinho - UM AUMENTO DE MENTIRINHA E UMA IMPRENSA DESINFORMADA.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Domingo, 22 de Setem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

UM AUMENTO DE MEN­TIR­INHA E UMA IMPRENSA DESINFORMADA.

UM AUMENTO DE MEN­TIR­INHA E UMA IMPRENSA DESIN­FOR­MADA.

Por Abdon Mar­inho.

AINDA é recente a demis­são do Secretário Nacional de Cul­tura por ter usado em um pro­nun­ci­a­mento para a inter­net toda a estética nazista e, até mesmo, pla­giado partes de um dis­curso de Goebbels. Tratei do assunto em um texto especí­fico na ocasião.

Volto a Goebbels porque como min­istro da pro­pa­ganda nazista – cargo que ocupou de 1933 a 1945, quando matou a família, inclu­sive os seis fil­hos e suicidou-​se –, e um dos seus prin­ci­pais ideól­o­gos, cun­hou frases que foram imor­tal­izadas e, pior, prat­i­cadas, que alcança os nos­sos dias, uma delas diz: “uma men­tira repetida mil vezes torna-​se ver­dade”.

Tal frase ganha relevo, sobre­tudo, nos dias atu­ais quando as pes­soas e, prin­ci­pal­mente, os gov­er­nantes dão pouca importân­cia à ver­dade e até a rel­a­tiviza.

Em tal con­texto caberia à boa imprensa o rel­e­vante papel de pon­tuar a ver­dade, esclare­cer os fatos e não se deixar iludir com men­ti­ras ou com meias ver­dades. Esse é o impor­tante papel que lhe des­ti­nou a Con­sti­tu­ição Fed­eral e para o qual lhe deu garantias.

Infe­liz­mente, o que temos visto é o oposto disso.

Há um fato que ilus­tra bem o que acabo de dizer. Na segunda-​feira, o gov­er­nador do Maran­hão anun­ciou, de próprio punho, através de uma rede social, o seguinte: “Novo piso de remu­ner­ação para os pro­fes­sores 40 h no Maran­hão deve pas­sar para R$ 6.358,96. Pro­posta será envi­ada hoje para Assem­bleia Leg­isla­tiva. Lem­bro que o valor nacional é de R$ 2.886,24”.

Emb­ora a lin­guagem seja trun­cada e própria para con­fundir, isso não isenta a imprensa local – e até mesmo a nacional –, da “bar­ri­gada” exaus­ti­va­mente difun­dida de que o piso salar­ial dos pro­fes­sores no Maran­hão seria de R$ 6.358,96 para os pro­fes­sores com 40 horas sem­anais. Isso porque aquilo que o gov­er­nador difundiu – e a imprensa “com­prou” como ver­dade –, não tem sus­ten­tação na real­i­dade dos fatos.

O gov­er­nador como advo­gado sabe, e a imprensa, por dever de ofí­cio dev­e­ria saber, que a definição de Piso Salar­ial é bem especí­fica, sig­nifica o menor salário que pode ser pago den­tro de uma cat­e­go­ria profis­sional especí­fica, no caso, os pro­fes­sores. Esse con­ceito é ele­men­tar, nem pre­cisa viver no mundo do dire­ito ou sindi­cal para saber disso.

Logo, piso salar­ial é o salário-​base do servi­dor sobre o qual incide todas as van­ta­gens, pro­gressões, etc.

Já sabia – como todos devem saber –, que o gov­er­nador não man­dou men­sagem para a Assem­bleia Leg­isla­tiva estip­u­lando o piso salar­ial no valor infor­mado na rede social. Na ver­dade, para que a patranha não ficasse tão em evidên­cia, sua excelên­cia não usou o termo piso salar­ial, “criou” a figura do “piso de remu­ner­ação”.

A razão disso? Con­fundir a opinião pública estad­ual e nacional de que a edu­cação está sendo mais val­orizada que em qual­quer outro lugar do país.

Na ver­dade, há cinco anos que os demais servi­dores públi­cos não têm aumento real. E mesmo os pro­fes­sores não estão recebendo os aumen­tos salari­ais con­forme deveriam.

Pesquisando sobre assunto encon­trei uma tabela de remu­ner­ação para o ano de 2020 dis­tribuída nas redes soci­ais por uma fonte insus­peita: o sindi­cato da cat­e­go­ria, que pos­sui lig­ações umbil­i­cais com o governo.

Na tabela do sindi­cato con­sta que a remu­ner­ação dos pro­fes­sores com carga horária de 40 horas varia de R$ 6.358,96 a R$ 8.092,07, mas isso com a Grat­i­fi­cação de Ativi­dade de Mag­istério — GAM e out­ras van­ta­gens.

O piso na ver­dade varia de R$ 2.886,24 (o valor pro­posto pelo gov­erno fed­eral) a R$ 3.672,87.

Se o leitor ficou atento aos números perce­beu que o aumento con­ce­dido pelo gov­erno estad­ual na ver­dade, para esta cat­e­go­ria, var­iou de 5 a 10% em relação aos salários que já vin­ham sendo pagos em 2019.

Os per­centu­ais de aumento con­ce­dido pelo gov­erno estad­ual será prati­ca­mente “con­sum­ido” pela ele­vação da alíquota prev­i­den­ciária aprovada pelo gov­erno no ano pas­sado, ou seja, de R$ 5.839,45 a R$ 10 mil, incidirá 14,5%.

A GAM é uma con­quista dos pro­fes­sores desde mea­dos dos anos noventa, se não me falha a memória, mantendo-​se no Estatuto do Mag­istério, Lei nº. 9.860, DE 1º DE JULHO DE 2013 desde então.

A GAM, sobre a qual incide os encar­gos prev­i­den­ciários só é paga aque­les que esteja em efe­tivo exer­cí­cio do mag­istério, situ­ação bem dis­tinta se fosse piso.

Senão vejamos:

Art. 33. A Grat­i­fi­cação de Ativi­dade de Mag­istério — GAM é a van­tagem pecu­niária atribuída aos inte­grantes do Sub­grupo Mag­istério da Edu­cação Básica, em razão de seu desem­penho de Ativi­dade de Magistério.

§ 1º A grat­i­fi­cação de que trata o caput deste artigo con­sti­tui salário con­tribuição para o Sis­tema de Seguri­dade Social dos Servi­dores do Estado do Maranhão.

§ 2º A grat­i­fi­cação de que trata o caput deste artigo será auto­mati­ca­mente can­ce­lada se o servi­dor ativo deixar de desem­pen­har ativi­dade de Magistério”.

O artigo seguinte do mesmo estatuto esta­b­elece os per­centu­ais que serão pagos:

Art. 34. A Grat­i­fi­cação de Ativi­dade de Mag­istério é cal­cu­lada sobre o venci­mento, nos per­centu­ais de:

I — 75% (setenta e cinco por cento) aos ocu­pantes do cargo Pro­fes­sor I;

II104% (cento e qua­tro por cento) aos ocu­pantes dos car­gos Pro­fes­sor, Pro­fes­sor II, Pro­fes­sor III, Espe­cial­ista em Edu­cação, Espe­cial­ista em Edu­cação I e Espe­cial­ista em Edu­cação II e Pro­fes­sor I que este­jam desen­vol­vendo ativi­dades de Edu­cação Especial.

Os números rev­e­lam que o per­centual de aumento “ven­dido” como um feito extra­ordinário do atual gov­erno é bem infe­rior ao con­ferido pelo gov­erno fed­eral e, se chega ao final no valor infor­mado pela autori­dade, isso se deve às con­quis­tas históri­cas da cat­e­go­ria. O atual “aumento” con­ce­dido sig­nifica uma perda para a cat­e­go­ria.

Em relação aos pro­fes­sores com carga horária de 20 horas sem­anais, a situ­ação é idên­tica, exceto pela maior estrat­i­fi­cação.

O Piso, ou seja, o salário-​base vai de 1443,12 (metade do pro­posto pelo gov­erno fed­eral) a R$ 1.836,43 e, com a GAM, a remu­ner­ação varia de R$ 2.727,50 a 4.046,02, var­iando os per­centu­ais, em relação a remu­ner­ação rece­bida até agora, de 5 a 17,49%.

Para a grande maio­ria destes, incidirá uma alíquota prev­i­den­ciária de 14% (para os que os rece­berão de R$ 3 mil a R$ 5.839,45) e 12% (para os que rece­berem de R$ 2 mil a R$ 3 mil).

Um outro ele­mento a ser con­sid­er­ado antes de se fes­te­jar o “aumento” do “piso de remu­ner­ação” con­ce­dido pelo gov­erno é que sobre sua total­i­dade incidirão alíquo­tas de Imposto de renda a serem reti­das na fonte, 7,5% a 27,5%.

Tudo isso sem con­sid­erar a inflação real de 2019 que alcançou 4,31%.

Noutras palavras, emb­ora o gov­er­nador e seus ali­a­dos, seguidores, adu­ladores e a imprensa desin­for­mada este­jam tecendo loas e alguns até tirando div­i­den­dos políti­cos, para os servi­dores do mag­istério, efe­ti­va­mente, não sig­nifica nada ou quase nada de aumento, e, em algu­mas situ­ações, a con­ju­gação de alíquo­tas prev­i­den­ciárias e de imposto de renda, pode até trazer per­das no valor real dos salários.

Outra coisa que dev­e­ria mere­cer a atenção do sindi­cato da cat­e­go­ria é a vari­ação de per­centu­ais, o que é vedado pelo Estatuto do Mag­istério, no seu artigo 32: “Art. 32. O Poder Exec­u­tivo pro­ced­erá aos ajustes dos val­ores do venci­mento do Sub­grupo Mag­istério da Edu­cação Básica no mês de janeiro, no per­centual do Piso Salar­ial Profis­sional Nacional do Magistério.”

Quer dizer, o aumento dev­e­ria ser lin­ear, para todos, no mesmo per­centual estip­u­lado para o piso nacional.

Esse lit­eral des­cumpri­mento da lei futu­ra­mente, con­forme já sabe­mos, ense­jará infini­tas ações judi­ci­ais cobrando as difer­enças entre o maior e o menor per­centual, iguaiz­in­has as mil­hares que ainda exis­tem em trami­tação. O con­tribuinte sofre mas a advo­ga­cia agradece.

Os respon­sáveis, auferi­das suas van­ta­gens, mais uma vez, já estarão longe para serem respon­s­abi­liza­dos.

Vejam bem o que está acon­te­cendo: o gov­erno estad­ual “inventa” o aumento que na ver­dade não é aumento; a Assem­bleia Leg­isla­tiva vai chance­lar, como faz sem­pre; o sindi­cato dos servi­dores da edu­cação vai fin­gir que não está vendo nada, nem mesmo o fla­grante des­cumpri­mento do seu estatuto, que é uma lei estad­ual; e a imprensa vai fes­te­jar sua própria desin­for­mação enquanto desin­forma ainda mais.

Tudo isso a con­fir­mar o que disse Goebbels há mais de setenta anos.

Abdon Mar­inho é advo­gado.

PS. Acres­cen­tei um dado ao texto. Informei que a inflação de 2019 alcançou os 4,31%.