AbdonMarinho - CONCESSIONÁRIA ESTATAL
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Domingo, 24 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

CON­CES­SIONÁRIA ESTATAL

CONCES­SIONÁRIA ESTATAL.
Por Abdon Mar­inho.
POUCOS dias um dep­utado estad­ual, da tri­buna da Casa de Manoel Bequimão, “denun­ciou” que o gov­erno estad­ual apreen­dera e leiloara mais de onze mil veícu­los. O dep­utado reforçando a linha argu­men­ta­tiva dis­tribuiu os quan­ti­ta­tivos nos anos de gestão do atual gov­erno.
Achei o número ele­vado, mas, con­siderando que ninguém da ban­cada gov­ernista ou mesmo do próprio gov­erno os con­testou, tenho-​os como expressão da ver­dade.
E, assim sendo, o gov­erno estad­ual, em número de ven­das de veícu­los poderá até con­cor­rer ao prêmio de mel­hores vende­dores de veícu­los da cap­i­tal, e, quem sabe, até mesmo fat­u­rar uma pas­sagem para Dis­ney como bônus de desem­penho.
Com números elo­quentes, acred­ito que os atu­ais comu­nistas venderam mais veícu­los na cap­i­tal – e mesmo no estado – que os seus anti­gos cama­radas – que por aqui estiveram no final dos anos oitenta e iní­cio dos noventa –, vendendo seus quadra­dos “ladas”, já nos ester­tores do régime da antiga União das Repúbli­cas Social­is­tas Soviéti­cas — URSS.
Deixando a brin­cadeira de lado – até por que o assunto é sério –, o que mais ouvi­mos são recla­mações dos cidadãos em relação ao excesso de apreen­sões de veícu­los por parte do gov­erno estad­ual.
Outro dia alguém denun­ciou num grupo de What­sApp, que uma guarnição o parou na porta de casa para aplicar-​lhe uma multa, suposta­mente por ter desvi­ado o cam­inho para não pas­sar por uma blitz; de um outro recebo a denún­cia que fora autor­izado a pas­sar pela bar­reira poli­cial e, em seguida, perseguido – inclu­sive com tiros – para que fizesse o teste do bafômetro, sendo lev­ado à del­e­ga­cia onde constatou-​se a ausên­cia com­pleta de sinais de bebida – e ainda assim, rece­beu a multa de quase três mil reais –, sob o argu­mento da recusa do teste; outro disse pos­suir teste­munhas que, emb­ora aten­dendo ao sinal de parada na bar­reira poli­cial, os dili­gentes agentes enten­deram como recusa sua nor­mal demora – ao seu sen­tir –, em fazer o teste e, tam­bém, aplicou-​lhe a multa.
Tudo isso, e mais as apreen­sões, em série, de veícu­los por atraso na reg­u­lar­iza­ção de doc­u­men­tos – paga­men­tos de impos­tos e taxas dev­i­das –, têm ger­ado inces­santes dis­cussões nos gru­pos de mídia social.
Argu­men­tam que o gov­erno não tra­balha com a per­spec­tiva de facil­i­tar as “coisas” para os con­tribuintes, levando os seus veícu­los a leilão em tempo bem exíguo – pouco mais de 30 dias, mais ou menos –, insu­fi­ciente, por­tanto, para evi­tar a perda do bem, em tem­pos de crise tão aguda.
Estas man­i­fes­tações de irres­ig­nação – e por vezes revolta – não são sen­ti­das ape­nas na cap­i­tal, acred­ito, até, que no inte­rior, onde a crise, o desem­prego, chegou com mais agudeza, isso desde 2012, os reclames são mais inten­sos. É o que sinto nas min­has via­gens. E, não sem razão.
Muitas das vezes o cidadão mal con­segue pagar a prestação do veículo, não lhe sobrando din­heiro para mantê-​lo reg­u­lar.
Essa era a prática comum: comprava-​se o veículo e cir­culavam com ele, a não mais poder, muitas vezes mesmo sem placa, que dirá os impos­tos e taxas em dias.
Aqui, claro, não nos colo­camos con­trários à ação estatal de fis­calizar o trân­sito com rigor, sobre­tudo nos dias de hoje em que sabe­mos ser a segu­rança pública a questão mais pre­mente da sociedade.
A fis­cal­iza­ção deve ser intensa e ter esse papel: pre­venir e evi­tar o come­ti­mento de ilíc­i­tos. Quanto a isso não temos dúvida em apoiar, pois trata-​se de uma neces­si­dade.
Por outro lado – e aqui se encerra a grande questão –, não é aceitável que o poder estatal use do poder de polí­cia que pos­sui para con­fis­car os bens dos cidadãos.
Tal vedação estar inserta na Con­sti­tu­ição da República, que traz uma seção denom­i­nada: “Das Lim­i­tações do Poder de Trib­u­tar”, e, no seu artigo 150, da mesma seção, resta a matéria bem explícita: “Art. 150. Sem pre­juízo de out­ras garan­tias asse­gu­radas ao con­tribuinte, é vedado à União, aos Esta­dos, ao Dis­trito Fed­eral e aos Municí­pios: … IV — uti­lizar trib­uto com efeito de con­fisco;”.
Este é o ponto a ser exam­i­nado: será que o gov­erno à guisa de exercer o seu papel de garan­ti­dor da segu­rança do cidadão, fis­calizar e cobrar os trib­u­tos, estaria, na ver­dade, aprovei­tando para con­fis­car os bens dos cidadãos?
Indo além, a “fúria arreca­datória” estatal tem refletido na redução dos indi­cadores de vio­lên­cia, já que esta é a prin­ci­pal argu­men­tação?
E mais, o gov­erno ao se empen­har tanto na arrecadação dos trib­u­tos dos pro­pri­etários de veícu­los tem dado sua con­tra­partida em mel­hores rodovias e malha viária urbana?
O cidadão comum, mesmo aquele pos­suidor de uma única moto que foi apreen­dida e, pos­te­ri­or­mente, leiloada, por não se encon­trar com os impos­tos em dia, ao dizer que o gov­erno não “facilita as coisas”, estar dizendo, na ver­dade, que o trib­uto, emb­ora dev­ido, foi uti­lizado para con­fis­car o seu bem.
E, com uma espé­cie de sabedo­ria sim­plória acaba por iden­ti­ficar o prob­lema: o gov­erno pode­ria, em muitos dos casos, só aplicar e cobrar as mul­tas dev­i­das, inclu­sive judi­cial­mente, sem que o cidadão, antes do fim do processo legal fosse pri­vado do seu bem. Isso, seria “facil­i­tar as coisas”. Até porque, o cidadão sim­ples não é des­on­esto – exceções a jus­ti­ficar a regra –, e quer andar den­tro da lei.
Mais, o gov­erno pode­ria facil­i­tar o paga­mento destas dívi­das, parce­lar a “perder de vista”. Noutras palavras: ficar do lado do cidadão.
O que ouvi­mos é jus­ta­mente o con­trário: Que as mul­tas não podem ser parce­ladas; que, se em 30 (trinta) dias, con­ta­dos da apreen­são do veículo, não forem pagas, o bem vai a leilão, etc.
Não sei se devolvem ao pro­pri­etário do veículo o que “sobrou” descon­tado as taxas, mul­tas e impos­tos.
O com­por­ta­mento aço­dado, a pressa em trans­for­mar o veículo do cidadão em din­heiro para o Estado reforça a crítica dos que acham que o gov­erno viola a Carta Con­sti­tu­cional, para uti­lizar, como se fazia em tem­pos remo­tos, a cobrança de trib­u­tos com fins de con­fisco.
A per­cepção é reforçada, mais ainda, quando se ver­i­fica o vol­ume de veícu­los leiloa­dos nos últi­mos anos – a man­ter o ritmo, mais de 15 mil veícu­los leiloado até o final do ano. E, ainda mais, quando se sabe – e o gov­erno é o primeiro sabedor –, da crise que passa o país, e, prin­ci­pal­mente, o estado, uma vez que dados do IBGE rev­e­lam um aumento nos índices de pobreza no Maran­hão, nos últi­mos anos.
Ora, o cidadão não perde um veículo – muitas das vezes seu único bem –, por querer. Cer­ta­mente, não teve condições de pagar os impos­tos e mul­tas que lhe foram apli­cadas, pelo estado/​governo.
Estes cidadãos, são pes­soas pobres – e pobreza, ainda não é crime –, que, repito, adquiri­ram um car­rinho, uma moto, fazendo grande sac­ri­fico, em dezenas de prestações, muitas das vezes, com a renún­cia de out­ros dire­itos bási­cos para si e seus famil­iares.
São estas pes­soas que estão “per­dendo” os seus bens para o Estado. Logo no atual gov­erno que dev­e­ria com­preen­der a situ­ação dos cidadãos mais humildes.
É sabido que a inflação dos mais humildes é difer­ente daquela que atinge os ricos.
Assim, se na média da inflação temos que a mesma retro­cedeu, tal assertiva é inteira­mente falsa quando exam­i­namos o aumento do preço do boti­jão de gás, por exem­plo. Com o boti­jão a quase cem reais, temos um com­pro­me­ti­mento, sobre­maneira, na renda das famílias.
A mesma situ­ação ocorre em relação às cobranças de impos­tos e taxas pelo poder público, ainda mais quando lev­a­mos em conta que já pas­sam mais de cinco meses do ano tra­bal­hando ape­nas para pagar impos­tos, sem terem qual­quer con­tra­partida do estado.
Os ricos, os crim­i­nosos, não têm pre­ocu­pações desta natureza, seus veícu­los estão em com os trib­u­tos em dia. No caso dos crim­i­nosos, ainda mais, para não chamar a atenção da autori­dade poli­cial.
Uma das doutri­nas sobre o Estado leciona que o mesmo existe para evi­tar que os fortes explorem os mais fra­cos. Assim, não me parece razoável que o retire o pouco patrimônio que têm estes pobres para reforçar seu caixa.
Mas essa é ape­nas uma opinião.
Abdon Mar­inho é advogado.