AbdonMarinho - DEBATES EXTREMOS.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Domingo, 24 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

DEBATES EXTREMOS.

DEBATES EXTREMOS.

NÃO tenho lem­brança de ter acom­pan­hado, na história do Brasil, mesmo através da livros, dias em que os debates, sobre quais­quer temas, fos­sem tão rad­i­cal­iza­dos. Mesmo assun­tos do cotid­i­ano geram debates onde se opõem os gru­pos – políti­cos ou não –, com posições extremas.

Não vejo futuro para país nisso, pelo con­trário, assisto com per­plex­i­dade a cri­ação de fos­sos que aos poucos se tor­nam intransponíveis. Uma lástima.

Ape­nas para citar um exem­plo, atual­mente um dos assun­tos mais dis­cu­ti­dos e mais rad­i­cal­iza­dos é a tal da questão de gênero. Con­fesso, que até bem pouco tempo nem sabia do que se tratava. Depois desco­bri que por trás desta questão existe toda uma ide­olo­gia, o que me pare­ceu muito mais estranho ainda.

Adepto do rock nacional, imag­i­nava que Cazuza falava sério ao dizer que pre­cisava de uma ide­olo­gia para viver. E ao dizer isso, era – assim enten­dia –, que as ide­olo­gias, ao menos como fomos apre­sen­ta­dos nos tem­pos de mil­itân­cia política estivessem desa­pare­ci­dos. Daí o cla­mar: – ide­olo­gia, eu quero uma para viver.

Em tem­pos tão rad­i­cais, provavel­mente, seria satanizado, bem mais do que foi e do que ainda é.

Mas voltando a tal da ide­olo­gia de gênero, que citá­va­mos, como exem­plo retórico, ape­nas, temos um dos mais claros exem­p­los de extrem­is­mos neste debate e que reflete bem a quadra obscura que vive o país.

Pelo que pude enten­der, até aqui, de um lado temos uns «ilu­mi­na­dos» defend­endo a ideia de que a sex­u­al­i­dade dos seres humanos é uma mera con­venção social e que os seres nasce­riam desprovi­dos de sexo que estes papéis seriam definidos pela sociedade que os impõe como lhes con­vém, cer­ta­mente de forma «careta», «bur­guesa», «retrógrada» e todos os «ismos» pre­sentes e comuns nos debates extremos.

Já na outra ponta, temos um grupo a pre­gar, sem con­strang­i­men­tos, que todos os papéis dis­so­nantes são fru­tos de patolo­gias e que estes humanos (os que têm uma vida sex­ual dis­tinta dos demais) seriam abom­i­nações, con­forme, descrito em alguns tex­tos bíblicos.

Como podemos perce­ber, são posições inc­on­cil­iáveis. E, ouso dizer, equivocadas.

Não vejo como admitir-​se que que homens e mul­heres sejam iguais no sen­tido que pregam os tais ideól­o­gos de gênero. Não o são. São bio­logi­ca­mente difer­entes, fisi­ca­mente difer­entes e, tam­bém, têm per­cepções difer­entes das emoções e das coisas. Não vejo como pre­tender uma igual­dade onde ela não existe e trans­ferir à sociedade a respon­s­abil­i­dade por sua definição.

Antes que digam que estou sendo machista ou mis­ógino, não o sou, ape­nas estou assen­tando que homens e mul­heres são seres difer­entes. Nen­hum é supe­rior ao outro e ambos são mere­ce­dores e deten­tores dos mes­mos dire­itos, deveres e, prin­ci­pal­mente, respeito.

Noutra quadra, não há como igno­rar que, até cien­tifi­ca­mente, muitos destes seres não se iden­ti­fi­cam com o seu sexo biológico ou, mesmo havendo iden­ti­fi­cação biológ­ica, relacionam-​se com pes­soas do mesmo sexo. São mil­hões de trans­gêneros no mundo e muitos mais mil­hões, ainda a inte­grar a sopa de letrin­has dos papéis sex­u­ais exis­tentes. Ou vão vão dizer que não existem?

Muitas ditaduras ado­tam a negação como instru­mento de repressão política.

Certa vez ques­tionaram um diri­gente ira­ni­ano – que aliás foi bem fes­te­jado pelos gov­er­nos da era petista –, sobre o trata­mento dis­pen­sado por seus país à comu­nidade LGBT. respon­deu sim­ples­mente que não tin­ham este prob­lema uma vez que não exis­tiam homos­sex­u­ais em seu país.

Nunca com­preendi muito bem o inter­esse de cer­tas ditaduras sobre este aspecto da vida pri­vada de seus cidadãos. Reprimem, matam e/​ou os renegam aos “gue­tos» sociais.

No a vida pri­vada inco­moda os que pen­sam difer­ente ou vivem de uma outra forma? O que tem demais em respeitar estas pessoas?

A existên­cia de mil­hões pes­soas no Brasil – e no mundo –, que vivem out­ras exper­iên­cias diver­sas é uma real­i­dade que está posta e que a ninguém é dado o dire­ito de tratar estas pes­soas como aber­rações ou abom­i­nações. Ou, ainda, como por­ta­do­ras de uma patolo­gia a mere­cer quais­quer tipo de cura. Ou, pior, agredir, humil­har ou mesmo matar estas pes­soas por sua ori­en­tação ou situ­ação sexual.

Estas pes­soas, difer­ente do que querem fazer crer cer­tos ideól­o­gos ou rad­i­cais reli­giosos são tão seres humanos e mere­ce­dores de iguais respeitos quanto todos os demais seres humanos. Por isso mesmo, não recla­mam ou mere­cem trata­mento difer­en­ci­ado ou supe­rior, querem sim, trata­mento igual e, sobre­tudo, respeito.

O Brasil de hoje (e mesmo out­ros países) exper­i­menta, infe­liz­mente, a real­i­dade da exclusão, onde todo aquele que não pensa den­tro do grupo é tido como um inimigo em poten­cial e é um alvo a ser eliminado.

O exem­plo acima citado em torno desta questão de gênero – que aliás, não con­sigo enten­der a razão de ocu­par o cen­tro dos debates nacionais –, é ape­nas uma a dividir a sociedade brasileira como nunca vimos antes, repito.

A prova maior do que digo é o fato das últi­mas pesquisas apontarem em primeiro e segundo lugares para uma even­tual dis­puta em segundo turno da eleição pres­i­den­cial do ano que vem, can­didatos destes extremos.

Os dois, pelo menos, no plano teórico, se com­por­tam como os rep­re­sen­tantes legí­ti­mos dos extremos a que nos referimos.

Aqui, e nesta opor­tu­nidade, não dis­cu­tirei méri­tos ou defeitos de nen­hum deles, que são de todos con­heci­dos, inclu­sive pela estridên­cia com que expõem suas ideias.

A minha reflexão é que a even­tual eleição de qual­quer dos dois ou um outro que advogue gov­ernar o país a par­tir de ideias extrem­is­tas, ape­nas nos trará mais incertezas e instabilidades.

Numa nação con­ti­nen­tal, como é o Brasil, um extremo, a não ser com muito der­ra­ma­mento de sangue, con­seguirá se impor ao outro ou lhe conquistar.

Assim, ter­e­mos, caso se con­firmem as pesquisas, um Brasil ainda mais divi­dido do se encon­tra agora pelos próx­i­mos anos.

Não pre­cisa ser espe­cial­ista, doutor neste assunto, para saber que o resul­tado dessa equação. Nação nen­huma no mundo con­seguiu o mila­gre de gov­ernar dos extremos sem que isso se desse através de bru­tal repressão com mil­hares de assas­si­natos. Aliás, já é isto que os par­tidários mais intol­er­antes pregam: a elim­i­nação do pen­sa­mento, e daque­les que vivem de uma forma difer­ente do que enten­dem ser a adequada.

Ora, quero acred­i­tar que em tem­pos de debates tão polar­iza­dos, o Brasil só encon­trará a paz se cos­tu­rar seu “pacto social” a par­tir da con­vergên­cia do cen­tro para as bor­das, “empurrando” os extrem­is­tas, de todos os matizes, para o seu real é dimin­uto espaço numa sociedade, como a nossa, for­jada na plu­ral­i­dade e tolerância.

Como sabe­mos, pen­sa­men­tos e gru­pos extrem­is­tas sem­pre exi­s­ti­ram por aqui, não os perce­bíamos porque suas ideias não encon­travam eco e estavam restri­tas a gru­pos bem reduzidos.

O vazio de poder a par­tir das con­vergên­cias cen­trais medi­anas, fiz­eram com que os dis­cur­sos extrem­is­tas gan­has­sem corpo e con­quis­tassem adep­tos a ponto de rep­re­sen­tar um grave prob­lema para o con­junto da sociedade brasileira, majori­tari­a­mente, tolerante.

Esta é a ver­dadeira iden­ti­dade nacional. O Brasil sem­pre teve pes­soas intol­er­antes, mas estes sem­pre foram uma mino­ria, o con­junto da sociedade nunca encon­trou difi­cul­dades para con­viver com as divergên­cias e a respeitar as diversidades.

Este Brasil de ódios, rad­i­cal­is­mos e intol­erân­cias, con­fesso, é algo novo, para mim, pelo menos.

O que nos resta é torcer para que a tragé­dia anun­ci­ada não se confirme.

Abdon Mar­inho é advogado.