AbdonMarinho - CENTRO HISTÓRICO: UMA REFLEXÃO PARA O FUTURO.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Domingo, 24 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

CEN­TRO HISTÓRICO: UMA REFLEXÃO PARA O FUTURO.

UMA ini­cia­tiva do secretário munic­i­pal de abastec­i­mento de São Luís, Ivaldo Rodrigues, tem agi­tado a ilha. Falo da feir­inha do pro­du­tor que acon­tece aos domin­gos na Praça Bened­ito Leite, no Cen­tro Histórico da capital.

Quase todos os dias ouço elo­gios a ini­cia­tiva e con­vites: – a feir­inha é ótima; – vamos à feirinha.

Por morar do outro lado da ilha, na zona rural de Riba­mar, ainda não me dis­pus a conhecê-​la. Sei, entre­tanto, que tem sido muito bem fre­quen­tada pelas autori­dades munic­i­pais e mesmo estad­u­ais, além da sociedade como um todo.

Além de pro­du­tos fres­cos, direto do pro­du­tor, a pro­gra­mação – reli­giosa­mente disponi­bi­lizada pela sec­re­taria –, há uma vasta pro­gra­mação cul­tural, levando vida a um espaço normalmente

morto” fora do horário com­er­cial e, sobre­tudo, nos fins de sem­ana e feriados.

O sucesso é tamanho que dia desses li num veículo de comu­ni­cação qual­quer que tal tra­balho cre­den­cia o atual secretário a dis­putar o cargo maior do paço municipal.

A assertiva reflete duas coisas: o quanto o cen­tro histórico cativa nossa pop­u­lação e o quanto esta mesma pop­u­lação encontra-​se à mín­gua de perspectivas.

O secretário – a quem estimo muito –, pos­sui inúmeros tal­en­tos a credenciá-​lo e, cer­ta­mente, é mere­ce­dor do sufrá­gio dos seus con­ci­dadãos, pelo menos tem sido eleito em suces­sivos mandatos a vereador, entre­tanto, não é uma feira (na ver­dade, um feir­inha, no diminu­tivo), que cre­den­cia alguém a qual­quer coisa, muito menos ao cargo de prefeito.

O que, entre­tanto, se torna pre­sente na ideia que uma feir­inha cre­den­cia a can­di­datura de alguém a um cargo político é o desejo da nossa pop­u­lação em ver Cen­tro Histórico da cap­i­tal devolvido aos seus habitantes.

Infe­liz­mente nos­sas autori­dades não con­seguem enx­er­gar isso.

Outro dia li que um país do leste europeu estava retomando sua arquite­tura clás­sica – se não me falha a memória –, a Hun­gria, que estaria remod­e­lando seus caixotes de con­creto e ferro do tempo do comu­nismo e devolvendo-​os às cidades com sua arquite­tura histórica.

Leio e ouço de muitos cole­gas com­para­ções que que o nosso cen­tro é uma espé­cie de “pequena Lis­boa”. O que não deixa de ser verdade.

Ora, ape­sar disso de tanta riqueza histórica e cul­tural, este é um patrimônio que se esfacela a cada dia que passa, seja pela ação dos homens, seja por sua inação. Os pré­dios estão ruindo, as pedras de can­taria e azule­jos sendo rou­ba­dos e ven­di­dos “no quilo” nas ime­di­ações do Mer­cado Central.

Desde o gov­erno Cafeteira I1986-​1990), ou seja, há quase trinta anos que não se ver uma inter­venção séria no Cen­tro Histórico de São Luís – quando muito uma ação iso­lada aqui ou ali –, tal aban­dono tem sus­ci­tado ques­tion­a­men­tos se a cidade merece ou não osten­tar o título de Patrimônio da Humanidade con­ce­dido pela Unesco.

O pro­jeto Reviver pre­cisa ser retomado, recu­per­ado o que se perdeu e ampli­ado para as demais áreas do centro.

Lem­bro que quando foi entregue no gov­erno Cafeteira a revi­tal­iza­ção de parte do Cen­tro Histórico, mais pre­cisa­mente o setor da Praia Grande, a pop­u­lação voltou a ocu­par aquele espaço – e ainda hoje, ape­sar do aban­dono e vio­lên­cia que toma conta da região –, con­tinua fre­quen­tando, sobre­tudo quando lá é desen­volvida alguma pro­gra­mação artís­tica e cultural.

Entendo, entre­tanto, que isso é muito pouco.

O gov­erno estad­ual, – em con­junto com a prefeitura e com o apoio do gov­erno fed­eral –, pre­cisa traçar uma estraté­gia de ocu­pação do cen­tro da cidade, traçando um perímetro do Par­que Urbano San­tos à Praia Grande e da Praça Gonçalves Dias à Madre Deus.

Isso será feita com a desapro­pri­ação dos pré­dios aban­don­a­dos e que estão ruindo ou virando esta­ciona­men­tos privados.

Acred­ito, até, que muitos pro­pri­etários não entregam estes pré­dios ao Estado por falta de incia­tiva deste em cobrar que os recu­pere ou lhes dêem um des­tino útil.

Acred­ito, inclu­sive, que se o gov­erno estad­ual pro­puser o paga­mento das ind­eniza­ções desapro­pri­atórias de forma parce­lada, poucos seriam os que recusariam.

Mas para isso, pre­cisamos de gov­er­nantes que vejam além das próx­ima eleições, que pensem o Estado para os próx­i­mos 30, 50 ou 100 anos.

O passo seguinte às desapro­pri­ações ou aquisições, seria o Estado trans­for­mar em aparta­men­tos e/​ou residên­cias mul­ti­fa­mil­iares, estes imóveis. Podendo des­ti­nar uns out­ros a escritórios ou empre­sas coletivas.

A ideia pro­posta é que ao invés dos gov­er­nos incen­ti­varem res­i­den­ci­ais no «meio do nada» na zona rural da ilha, tendo que gas­tar com infraestru­tura viária, de trans­porte, esco­las, etc., traria estas pes­soas para habitarem o Cen­tro, onde grande parte da infraestru­tura já está posta, bas­tando para tornar o Cen­tro bem mel­hor, inves­ti­men­tos em segu­rança, iluminação.

Quem não gostaria de morar a 10 ou 15 min­u­tos do serviço ao invés de morar a dezenas de quilômet­ros do mesmo, per­dendo, na maio­ria das vezes, uma ou duas horas (às vezes mais) ape­nas com deslocamentos?

Infe­liz­mente, até aqui, os gov­er­nos têm tra­bal­hado em sen­tido inverso: abrem ver­dadeiras “feri­das” em áreas rurais – que dev­eríamos preser­var –, e levam mul­ti­dões para locais com os quais estes não pos­suem quais­quer afinidades, levando junto, além da destru­ição ambi­en­tal, já referida, levam a vio­lên­cia, a inse­gu­rança às famílias, tan­tos as que estavam lá, quanto às que chegam.

A política de ocu­pação do solo urbano é caótica, desumana, onerosa e irre­spon­sável, demon­strando um claro descom­pro­misso com o futuro.

Mais, acabam cau­sando ônus finan­ceiros astronômi­cos nas finanças públi­cas para fazer chegar a estas áreas dis­tantes os serviços bási­cos essenciais.

A forma como a Ilha de São Luís vem sendo ocu­pada é crim­i­nosa, com esta e com as futuras ger­ações, ainda mais quando vemos na outra ponta da história, o maior patrimônio de todos os maran­henses se dis­solver pela água das chu­vas, ser dilap­i­dado, saque­ado e ven­dido por marginais.

Imag­ino em como seria um sonho se pos­suísse­mos autori­dades ver­dadeira­mente com­pro­meti­das com este patrimônio, que tivessem uma dimen­são do que tanta riqueza sig­nifica, e que tivessem um plano para ele.

A ver­dadeira riqueza do Maran­hão (de São Luís, prin­ci­pal­mente) é o seu patrimônio histórico. Este é o primeiro bem a ser preser­vado, mesmo porque, para recon­struir não é fácil. Não podemos andar na con­tramão da história.

As autori­dades não terão que rein­ven­tar a roda, basta olhar os exem­p­los de out­ras cap­i­tais com patrimônio histórico semel­hante ao redor do mundo. Só isso.

A cidade pre­cisa pul­sar de forma con­tínua e não ser fre­quen­tada por ocasião de um show, um fes­ti­val de reg­gae, uma feir­inha ou uma pro­gra­mação cul­tural qual­quer. A cidade pre­cisa estar viva. E quem lhe dar vida são seus habitantes.

Abdon Mar­inho é advogado.