AbdonMarinho - A JUSTIÇA CAVA SUA SEPULTURA.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

A JUSTIÇA CAVA SUA SEPULTURA.

A JUSTIÇA CAVA SUA SEPULTURA.

O pior que pode acon­te­cer a uma democ­ra­cia é suas insti­tu­ições ger­arem descon­fi­ança aos cidadãos. Diante disso, reg­istro, com pesar, que os últi­mos tem­pos têm reg­istrado o enfraque­c­i­mento da justiça brasileira. A cada dia que passa cresce o número de pes­soas com motivos para olhar com descon­fi­ança aque­les que fig­u­ram com guardiões e cidadela der­radeira da cidadania.

Não passa um dia sem que um fato desabonador chegue ao con­hec­i­mento dos cidadãos. São notí­cias de cor­rupção, de abu­sos, de injustiças, de favorec­i­men­tos, de inter­esses pes­soais se sobre­pondo aos inter­esses da coletividade.

Ape­sar dos escân­da­los se suced­erem numa veloci­dade alu­ci­nante, alguns fatos me chama­ram atenção nos últi­mos dias. Todos, infe­liz­mente, com capaci­dade de con­tribuir com o seu enfraquecimento.

Outro dia, foi a entre­vista de min­istro do Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF, colo­cando, na sua opinião os riscos daquela Corte começar a gan­har inte­grantes, mais por sua incli­nação política, lig­ada ao ideário dos donos do poder, que pro­pri­a­mente, aos inter­esses da justiça e/​ou a guarda da Con­sti­tu­ição Federal.

No mesmo período, mais uma notí­cia nos dá conta que o Supremo Tri­bunal Fed­eral deter­mi­nou que fosse encam­in­hada a sua pro­posta de orça­mento para próx­imo exer­cí­cio, con­forme elab­o­rada pelo Judi­ciário, garantindo-​lhes um aumento e ele­vando seus salários para mais de 35 mil reais, e não, con­forme, o con­ti­gen­ci­a­mento feito pelo Poder Exec­u­tivo que garan­tia ape­nas um aumento para o pata­mar na faixa de 31 mil reais. No caso, não se dis­cute a reg­u­lar­i­dade da decisão. Com certeza está cal­cada no orde­na­mento jurídico, sobre­tudo pelo fato deste tipo de con­ti­gen­ci­a­mento só poder ser feito pelo Poder Leg­isla­tivo, que sabe­mos, não fará.

Não resta dúvida que a decisão deve está cor­reta. O que está errado, é que fica pare­cendo que os jul­gadores ten­tam se colo­car acima dos demais cidadãos, prin­ci­pal­mente quando sabe­mos que no último ano se aumen­tou o numero de mis­eráveis no país. Decerto que suas excelên­cias e os demais con­frades nas demais instân­cias do Poder Judi­ciário e do Min­istério Público, não gan­ham o sufi­ciente para tão ele­vadas funções e respon­s­abil­i­dades. Entre­tanto, esperava-​se que um poder da República não se fur­tasse a par­tic­i­par dos esforços feitos pelo país diante de uma crise. O salário mín­imo nacional, trinta vezes menor, em média, ao que ganha os poderosos do país, tam­bém não é sufi­ciente, sequer para aten­der às neces­si­dades mais pre­mentes, ape­sar disso, nada podem fazer. Aos cidadãos comuns não lhes vale petições ou embargos.

Não sat­is­feitos em defend­erem com unhas e dentes um inter­esse, que emb­ora justo, não deixa de ser pes­soal, bus­caram agravar ainda mais a situ­ação. Noticia-​se, tam­bém, que a corte pas­sou a “advogar\» que haja um aumento de idade para aposen­ta­do­ria compulsória.

O tema já é antigo. Não dis­cordo, em tese, que o lim­ite de setenta anos possa está ultra­pas­sado para a aposen­ta­do­ria com­pul­sória, quando con­sid­er­amos o aumento da expec­ta­tiva de vida do brasileiros e o avanço da med­i­c­ina, garan­ti­ndo uma qual­i­dade de vida bem mel­hor aos mais idosos.

O que acho errado, grave e abu­sivo, é perce­ber a mais ele­vada Corte de Justiça do país pleit­earem uma mudança na Con­sti­tu­ição da qual são deten­tores da guarda em um claro, fla­grante e cristal­ino inter­esse pessoal.

Difer­ente do caso do aumento em que há fun­da­mento legal, onde, o que se ques­tiona, é mais ino­por­tu­nidade da pro­posta, no segundo caso esta­mos diante de algo muito mais serio. Temos os guardiões da Con­sti­tu­ição bus­cando algo a lhes favore­cerem dire­ta­mente. Noutros tem­pos, tal coisa, não seria sequer cogitado.

Aos min­istros é líc­ito a inter­pre­tação da carta con­sti­tu­cional e até leg­is­lar em face da ausên­cia do Poder Leg­isla­tivo, jamais afrontar a própria Con­sti­tu­ição da qual são guardiões.

Essa é a questão de gravi­dade ímpar. É isso que não podemos aceitar. Não é admis­sível que min­istros do STF ajam como um clube de cafa­jestes defend­endo inter­esses mesquin­hos próprios. O Supremo não é isso, nunca foi, não pode começar a fazer isso agora em pleno lim­iar do século 21.

Claro que não se defende a imutabil­i­dade de quais­quer regras. O Con­gresso Nacional pode fazer esse tipo de alter­ação, mas, entendo, para as ger­ações futuras, jamais em bene­fí­cio de qual­quer um dos atu­ais inte­grantes. Podem, talvez criar uma regra para valer daqui a vinte ou trinta anos. Talvez uma regra que esta­beleça mandatos defini­tos aos inte­grantes do Supremo Tri­bunal Fed­eral e de todos os demais tri­bunais supe­ri­ores. Nada con­tra ou a opor.

O que deve­mos nos aten­tar é para a gravi­dade de ter os uma Corte que se quede aos inter­esses cor­po­ra­tivos e busque a sat­is­fação de inter­esses pes­soais. Essa inqui­etação, vai muito além de meras insat­is­fações man­i­fes­tadas por asso­ci­ações de juízes – eles mes­mos con­tu­mazes defen­sores de inter­esses cor­po­ra­tivos em detri­mento da sociedade –, e da própria OAB que rotineira­mente tem se man­i­fes­tado a favor das teses do Poder Exec­u­tivo sem se dar conta que ali­menta o gêne­sis do próprio estado boli­var­i­ano. Ficam ban­cando inocentes úteis, como se não vis­sem o que se passa à sua volta.

A ditadura bate à porta quando insti­gada pelo apo­drec­i­mento de suas insti­tu­ições, o Poder Judi­ciário, por suas diver­sas instân­cias, e prin­ci­pal­mente, por sua instân­cia máx­ima não pode ceder a esse tipo de canto da sereia.

A prova maior do quanto dis­so­ci­ado está a justiça brasileira do sen­ti­mento de cidada­nia tam­bém materializou-​se por esses dias, quando o TJRJ con­fir­mou uma con­de­nação de uma agente de trân­sito que fez uma abor­dagem a um mag­istrado – que infringira todas as nor­mas – e disse que ele era ape­nas juiz e não Deus. O tri­bunal enten­deu que agente – tão servi­dora quanto o mag­istrado, ape­nas sep­a­ra­dos pela quan­ti­dade de zeros nos con­tra­cheques e no senso de hon­radez – agira com abuso de poder e zom­bara do magistrado.

A decisão assen­tou: \«Ao apre­goar que o deman­dado era \“juiz, mas não Deus\», a agente de trân­sito zom­bou do cargo por ele ocu­pado, bem como do que a função rep­re­senta na sociedade”.

Quan­tos equívo­cos em tão pou­cas lin­has. Mas faz sen­tido, talvez os jul­gadores não ape­nas se achem deuses, talvez sejam. Só isso jus­ti­fica que ignorem o sen­ti­mento daque­les que lhes pagam os gor­dos salários.

Abdon Mar­inho é advogado.