AbdonMarinho - O comediante, o covarde e o idiota.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

O come­di­ante, o covarde e o idiota.

O COME­DI­ANTE, O COVARDE E O IDIOTA.

Por Abdon Mar­inho.

CAR­NAVAL, enquanto o som de bom­bas apa­vo­ram uma pop­u­lação que não pediu uma guerra; enquanto mil­itares e civis são mor­tos; enquanto mul­heres, idosos, defi­cientes e cri­anças, numa tragé­dia sem prece­dentes fogem para os países viz­in­hos em busca de segu­rança, deixando para trás seus lares, patrimônio e, por assim dizer, suas vidas surge o idiota como uma das declar­ações mais entup­i­das ditas em qual­quer tempo e mais grave em tempo de guerra: “o povo ucra­ni­ano con­fiou a um come­di­ante os des­tino da nação”.

Algo mais ou menos assim em um dialeto entrecor­tado próx­imo do por­tuguês.

A frase do idiota depois copi­ada e “mes­mer­izada” por uma legião de seguidores “idi­o­ti­za­dos” “gan­hou” as redes soci­ais, inclu­sive com algu­mas ilus­trações e/​ou fotos dos dois pres­i­dentes e suas biografias onde se lia abaixo do ucra­ni­ano que fora ator, come­di­ante, etc., e, abaixo do russo sua car­reira como espião da KGB, campeão disso ou daquilo.

Como todo idiota é geral­mente um machista mis­ógino é como se dissesse: uma mul­her den­tro da sua casa com vestido curto está pedindo para ser vio­len­tada.

O BRASIL tem uma vasta rep­utação de bons come­di­antes, ver­dadeiros gênios que mesmo nos momen­tos de maiores difi­cul­dades, como nos duros tem­pos da ditadura, das suces­si­vas crises finan­ceiras, con­seguiam com sua inteligên­cia e per­spicá­cia nos fazer rir de nos­sas próprias des­graças.

Quem não traz na memória os céle­bres per­son­agens de Chico Any­sio, de Jô Soares ou de tan­tos out­ros?

Um bom come­di­ante até pode fin­gir ser um idiota, já o idiota jamais con­seguirá ser um bom come­di­ante.

Quando muito poderá con­tar alguma piada sem graça em que a audiên­cia rir-​se-​á mais dele do que da suposta piada.

Em exer­cí­cio de retórica, imag­ino que o nosso país estaria muito mel­hor posi­cionado no mundo se em algum momento de sua história tivesse sido con­duzido por um come­di­ante e não por boçais, imbe­cis e idio­tas.

Esta­mos assistindo isso “ao vivo”, enquanto um idiota tenta fazer piadas com o sofri­mento alheio e se equi­li­bra entre a covar­dia e ado­ração por um macho alfa, temos um come­di­ante na dis­tante Ucrâ­nia resistindo à invasão do seu país numa guerra injusta, cruel e covarde.

O come­di­ante de quem os idio­tas fiz­eram e fazem pouco caso é inspi­rador e inspi­rado por uma pop­u­lação que luta e resiste a numa guerra desigual.

Quase que diari­a­mente assis­ti­mos um profis­sional da comé­dia não fazendo graça, mas pedindo e pas­sando força para que o seu povo resista à tomada do seu país por uma potên­cia estrangeira.

O come­di­ante não fugiu ao ouvir as ameaças e o barulho das bom­bas que caíram e caem sobre o seu país, fez o oposto disso.

É a cor­agem e resil­iên­cia de um come­di­ante que tem inspi­rado a resistên­cia den­tro da Ucrâ­nia e mobi­lizado a sociedade civil ao redor do mundo con­tra uma guerra de expan­são, injusta e abso­lu­ta­mente deslo­cada no tempo.

Não tenho dúvi­das que o pode­rio mil­i­tar de uma super­potên­cia mundial em algum momento vai se sobre­por à garra e deter­mi­nação do povo ucra­ni­ano na defesa da sua pátria.

Mas ainda assim, quando isso ocor­rer, quem terá “ven­cido” a guerra será a Ucrâ­nia e não a Rús­sia.

O mundo inteiro já tem con­vicção que o covarde de Moscou é o agente provo­cador da guerra e que mesmo uma vitória pelas armas jamais o trans­for­mará em um vence­dor, mas, ape­nas em um inva­sor e/​ou ocu­pante de uma nação sober­ana.

Essa con­sci­en­ti­za­ção cole­tiva sobre a guerra de expan­são provo­cada pelo covarde de Moscou con­tra a Ucrâ­nia e a con­se­quente repulsa dos povos do mundo a ela só está sendo pos­sível por conta da resistên­cia firme e cora­josa de um come­di­ante que é inspi­rado e inspira toda uma nação.

Caso fosse um covarde ou idiota e tivesse fugido do país ao estampido das primeiras bom­bas cer­ta­mente o seu país já estaria anex­ado à potên­cia agres­sora e o mundo, sequer, ainda estaria falando da guerra.

Até aqui temos visto um come­di­ante se por­tar como o mais altivo dos coman­dantes de guerra não ape­nas no plano da resistên­cia interna, mas, prin­ci­pal­mente, reti­rando o mundo de sua cos­tumeira apa­tia e indifer­ença ao mostrar que a guerra que ocorre e destrói o seu país é uma guerra de toda sociedade civ­i­lizada con­tra a bar­bárie.

Assim tem con­seguido gal­va­nizar os sen­ti­men­tos con­trários à guerra da pop­u­lação, dos gov­er­nos e das empre­sas – nunca tín­hamos visto tan­tas empre­sas e tan­tas mar­cas se posi­cionarem con­tra uma guerra quanto agora.

Até aqui já vimos o come­di­ante emo­cionar e arran­car lágri­mas e aplau­sos do Par­la­mento Europeu, debater com o Con­gresso Amer­i­cano e todos os dias ser con­sul­tado e gan­har a sol­i­dariedade de gov­er­nantes do mundo inteiro.

Se sair vivo desta guerra não duvido que con­quiste o Nobel da Paz e seja req­ui­si­tado como um pop Star por onde quer que passé.

Enquanto isso o covarde de Moscou segue cada dia que passa mais iso­lado.

Como trunfo para ser ouvido por alguém usa a ameaça do Armage­dom nuclear.

A cena mais patética desta guerra sem sen­tido é ver­mos o covarde sen­hor da guerra sentar-​se à uma dis­tân­cia de vinte met­ros dos seus gen­erais e ministros.

Sem cor­agem sequer para sentar-​se próx­imo aos seus com­pas­sas, manda jovens sol­da­dos, fil­hos de alguém, namora­dos de alguém, netos de alguém, lutarem na “sua guerra”.

Do seu quartel-​general a cen­te­nas de quilômet­ros de dis­tân­cia manda soltar bom­bas sobre cidades, sobre civis, sobre uma nação que sabe ser inca­paz de resi­s­tir ao pode­rio mil­i­tar russo, até porque, vol­un­tari­a­mente desarmou-​se lá atrás diante do com­pro­misso (vio­lado) de que nunca seria alvo de ataques.

O covarde mente descarada­mente para o povo russo ao dizer que não existe guerra – o termo foi, inclu­sive, proibido –, trata-​se de uma “oper­ação mil­i­tar espe­cial” para pro­te­ger cidadãos rus­sos que estariam sendo humil­ha­dos pelo gov­erno ucra­ni­ano.

Como a men­tira não se sus­tenta, impôs-​se a cen­sura com penas durís­si­mas (de até 15 anos de cadeia) para quem ousar divul­gar qual­quer notí­cia que esteja em desacordo com a ver­são ofi­cial do gov­erno.

Os canais de rádio o tele­visão estrangeiros já estão deixando o país; as redes soci­ais estão blo­queadas.

Ainda assim, o covarde enfrenta protestos cada vez mais fre­quentes inter­na­mente.

O povo, ape­sar da cen­sura, das retal­i­ações e opressão de se viver em um régime autocrático começa a ir para as ruas protes­tar ou mesmo manifestar-​se con­trário à guerra.

Em cada protesto ou man­i­fes­tações cen­te­nas de pes­soas são pre­sas, inclu­sive idosos e cri­anças.

O covarde, ainda que mande pren­der todos que protestarem con­tra a “sua guerra”, não con­seguirá escon­der a ver­dade de toda a pop­u­lação que começará a sofrer os efeitos da desval­oriza­ção da moeda, do blo­queio dos seus cartões de crédito, do fechamento ou encer­ra­mento de ativi­dades de quase todas grandes empre­sas que atuam naquele país, sem con­tar a insat­is­fação pela per­das de seus sol­da­dos.

Muito emb­ora este­jam acos­tu­ma­dos a pri­vações diver­sas, desde sem­pre, os rus­sos nas últi­mas três décadas ainda que vivendo sob o jugo de régime autoritário exper­i­men­tou os con­for­tos e como­di­dades da vida mod­erna.

Não acred­ito que vá aceitar com bom grado um retro­cesso para os tem­pos da União Soviética sem qual­quer insat­is­fação, ainda mais sabendo que a guerra só atende aos dese­jos pes­soais de um tirano de um grupo de oli­gar­cas que tem saque­ado a Rús­sia há décadas.

O idiota vis­i­tou o covarde de Moscou e na sua tosca imag­i­nação tornou-​se “amigo de infân­cia” dele.

Con­trar­iando posições históri­cas do nosso país e os mar­cos legais con­ti­dos na Con­sti­tu­ição, o idiota, até agora não man­i­festou sol­i­dariedade a uma nação sober­ana inva­dida e con­de­nou a ação do inva­sor. Para diminuir nossa ver­gonha a diplo­ma­cia brasileira, ainda que titubeante, con­de­nou a invasão.

Con­forme disse em texto ante­rior, o idiota não pre­cis­aria fazer nada além de reafir­mar o que esta­b­elece a Con­sti­tu­ição Fed­eral no que ref­ere à política externa do país. Trata-​se do artigo 4º, da Con­sti­tu­ição. Está tudo lá.

O idiota só pre­cis­aria dizer que a posição dele e do país é a con­tida na Con­sti­tu­ição. Só isso.

Ao fugir da Con­sti­tu­ição como o diabo foge da cruz para postar-​se implici­ta­mente ao lado do covarde russo, alçado à condição de “mel­hor amigo de infân­cia”, além de explici­ta­mente descumpri-​la, sus­peito que tenha vio­lado o artigo 84, que trata dos crimes de responsabilidade.

A sociedade moldada numa escala de val­ores.

O primeiro deles é a vida, seguido da liber­dade e daí pra frente.

O idiota não pos­sui hier­ar­quia de val­ores. Acha que um saco de adubo vale mais que uma vida humana. O idiota vai para a tele­visão, em plena guerra, com mil­hares sendo mor­tos, out­ros mil­hares per­dendo tudo para viverem como refu­gia­dos, e diz que o fer­til­izante é sagrado.

O idiota não sabe que a vida é sagrada e não fer­til­izantes.

Era car­naval, enquanto o come­di­ante orga­ni­zava a resistên­cia aos ataques aéreos e por terra do covarde de Moscou, o idiota passeava de jet-​ski.

Já os líderes do mundo solen­e­mente igno­ravam sua existên­cia.

Abdon Mar­inho é advo­gado.