AbdonMarinho - O BOOK ROSA DO MARANHÃO.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

O BOOK ROSA DO MARANHÃO.

O BOOK ROSA DO MARANHÃO.

Por Abdon Marinho.

DURANTE os anos de chumbo do régime comu­nista polonês era prática cor­riqueira daquela ditadura colo­car a polí­cia sec­reta e mesmo a osten­siva no encalço dos homos­sex­u­ais para doc­u­men­tar sua vida pri­vada e íntima e uti­lizar aquele mate­r­ial cole­tado pelo Estado como instru­mento de perseguição política, chan­ta­gens, achin­cal­hes e até tor­turas, prisões e mortes.

Eram os chama­dos “books rosas”, muitos dos quais foram local­iza­dos ou se encon­tram per­di­dos até hoje com o fim daquele régime.

Um filme em exibição no stream­ing Net­flix trata desse assunto: Entre Frestas.

Antes das agên­cias de mod­elo ou da Rede Globo pop­u­larizarem o nome a expressão book rosa era um instru­mento de perseguição a artis­tas e int­elec­tu­ais homos­sex­u­ais na Polô­nia comu­nista.

O ideól­ogo do comu­nismo, Karl Marx (18181883), na obra “Dezoito Brumário de Louis Bona­parte”, de 1852, cun­hou uma frase que restou imor­tal­izada até hoje: “A história se repete, a primeira vez como tragé­dia e a segunda como farsa”.

Suposta­mente – digo isso porque negado peremp­to­ri­a­mente pelos envolvi­dos –, e sem que ninguém se desse conta, a história dos “books rosas” do antigo régime comu­nista polonês e a frase do comu­nista Marx se encon­traram no nosso velho Maran­hão cansado de guerra, até bem pouco tempo coman­dado no núcleo do poder pelos “bolcheviques”, desta vez como farsa.

Como se recor­dam, o assunto mais comen­tado no final de sem­ana pas­sada em todas as “rodas” foi um suposto fla­grante de uma guarnição mil­i­tar em um dep­utado estad­ual que suposta­mente estaria prat­i­cando sexo oral em um rapaz, suposta­mente seu fun­cionário, em plena orla da cap­i­tal maran­hense.

Primeiro foi dis­tribuída uma not­inha anôn­ima de rede social nar­rando em tons pornográ­fi­cos o mila­gre, sem dec­li­nar o nome do santo. Lá con­tinha que durante abor­dagem de rotina o par­la­men­tar fora encon­trado – se não me falha a memória o termo uti­lizado foi fla­grado –, fazendo sexo oral no rapaz referido como sendo seu motorista e que na vis­to­ria do veículo foram encon­tra­dos din­heiro (três mil reais), uma pasta preta con­tendo doc­u­men­tos da ativi­dade par­la­men­tar, além alguns cig­a­r­ros de maconha (atribuí­dos ao suposto motorista) é um falo de bor­racha medindo 22cm.

Tendo aguçado a curiosi­dade geral da plateia, não tar­daram a espal­har as fotografias do dep­utado e de um rapaz, suposta­mente envolvi­dos no suposto episó­dio de “fla­grante” nar­rado na not­inha mali­ciosa ante­ri­or­mente divul­gada.

Muito emb­ora as fotografias não fos­sem do suposto episó­dio foi o que bas­tou para “incen­diar” ainda mais os comen­tários da pat­uleia afoita por escân­da­los.

Acho que somente no dia seguinte o dep­utado suposta­mente envolvido no suposto episó­dio denun­ciou que estaria sendo vítima de uma rede de “fake news” patroci­nada pelo gov­erno estad­ual por conta de sua ativi­dade par­la­men­tar e por ter denun­ci­ado supos­tos esque­mas de cor­rupção de inte­grantes do gov­erno, bem como, reafir­mando pública e desnec­es­sari­a­mente sua ori­en­tação sex­ual, neste ponto sendo con­tes­tado pela malta maledi­cente com a seguinte frase: “não se com­bate fake news com fake news”.

Pois bem, ami­gos, o pre­sente texto não trata do suposto episó­dio de cunho sex­ual, até porque sexo con­sen­sual envol­vendo adul­tos só se torna assunto de “inter­esse público” nas ditaduras mais tacan­has.

Se o fato tivesse acon­te­cido – ainda que faça alguma obser­vação quanto ao local, a con­tro­versa posse de dro­gas –, este seria um assunto estri­ta­mente pri­vado e não inter­es­saria a ninguém, ape­nas rev­e­lando a série de pre­con­ceitos ainda exis­tentes na nossa sociedade. Até porque, se fosse uma excelên­cia, nas mes­mas condições, “pegando” uma “gos­tosa” não seria noti­cia ou, se o fosse, seria para “fes­te­jar” a façanha e não para dene­grir os supos­tos envolvi­dos como fiz­eram com a exposição pública do dep­utado e do rapaz, violando-​lhes, clara­mente, princí­pios con­sti­tu­cionais con­ti­dos no artigo 5º da carta, como o dire­ito à intim­i­dade, a vida pri­vada e o dire­ito de imagem.

O que fiz­eram aque­les cidadãos – e me é indifer­ente se o fato ocor­reu ou não –, foi algo muito grave e que dev­e­ria resvalar em uma apu­ração com o obje­tivo de encon­trar, respon­s­abi­lizar e punir de forma ade­quada os envolvi­dos.

Igual­mente grave, para dizer o mín­imo, é o fato de um dep­utado estad­ual acusar o gov­erno de se encon­trar por trás de uma rede de “fake news” para intim­i­dar os adver­sários – e ou man­ter sob con­t­role os ali­a­dos, ainda mais fazendo uso de instru­men­tos como a espi­onagem da vida pri­vada das pes­soas para chan­ta­gens políti­cas.

Repare que no caso do dep­utado, con­forme ele próprio denun­ciou, cri­aram uma “nar­ra­tiva” com fatos inverídi­cos para o chan­tagear politi­ca­mente por con­tas da sua atu­ação parlamentar.

Ora, se são capazes de “criar” um fato inex­is­tente com propósito tão escu­sos o que os impediriam de uti­lizarem os instru­men­tos de espi­onagem para bis­bil­ho­tar a vida das pes­soas incluindo o que fazem – e com quem fazem –, nas alcovas?

Em sendo ver­dade o que foi denun­ci­ado, fatos “cri­a­dos” con­tra um dep­utado para chantageá-​lo e o achincalhá-​lo por conta de sua ativi­dade par­la­men­tar, talvez, seja ape­nas a ponta ice­berg de um escân­dalo político, ético e moral envol­vendo o gov­erno estad­ual atual­mente gov­er­nado por pes­soas que sem­pre se venderam como respeita­do­ras dos dire­itos humanos e das garan­tias con­sti­tu­cionais, pre­tendendo, o gov­er­nador, até torna-​se imor­tal da Acad­e­mia Maran­hense de Letras — AML.

A menos que a perseguição seja fruto da inveja, nunca se sabe.

O dep­utado expôs uma série de per­fis de redes soci­ais fal­sos que estariam por trás da dis­sem­i­nação de notí­cias fal­sas a seu respeito e apon­tando como sendo “patrono” de tais per­fis o gov­erno estad­ual.

Como a assertiva do dep­utado não é um pen­sa­mento iso­lado, pois não é de hoje que se ouve “à boca pequena” que os donatários do poder se uti­lizariam dos legí­ti­mos instru­men­tos de inves­ti­gação do Estado para con­struir dos­siês con­tra os cidadãos – adver­sários ou não –, bem como, não é hoje insin­uam que os mes­mos “donos do poder” pode­riam “acabar” com esse ou aquele adver­sário em “três tem­pos”, acred­ito que o episó­dio que víti­mou o dep­utado dev­e­ria ser mel­hor inves­ti­gado.

Muito emb­ora não acom­panhe o dia a dia do par­la­mento estad­ual, não tenho notí­cia de que solic­i­tado ou foi deter­mi­nada qual­quer inves­ti­gação par­la­men­tar com o propósito apu­rar se o dep­utado estad­ual, de fato, foi vítima de uma trama para impedir-​lhe de desem­pen­har com plena liber­dade o seu mandato, bem como, se con­forme denun­ciou, tal crime par­tiu do gov­erno estad­ual.

Repito, o que ocor­reu e o que foi denun­ci­ado são fatos graves e que desafiam uma inves­ti­gação séria e isenta.

Estran­hamente ouve-​se um estron­doso silên­cio na Assem­bleia Leg­isla­tiva, no Min­istério Público Estad­ual, na Polí­cia e na sociedade civil. Como se fosse nor­mal o que acon­te­ceu.

Não é aceitável que em pleno século XXI o Estado ainda se uti­lize de bis­bil­ho­tagem ou crie uma rede de fake news com o propósito de chan­ta­gens con­tra adver­sários ou ali­a­dos, muito menos ainda que tais “bis­bil­ho­ta­gens” recaíam, inclu­sive, sobre a vida íntima, pri­vada ou sex­ual dos cidadãos.

Infe­liz­mente, por covar­dia ou medo, não se ouvem cobranças mais enfáti­cas por inves­ti­gações sobre fatos tão graves, repito.

Para fechar o ciclo comu­nista no Maran­hão, que superou de “lavagem” os piores indi­cadores da antiga oli­gar­quia que reinou por quase meio século, só fal­tava ressus­citarem os “books rosas” da Polô­nia comu­nista.

Segundo dizem, não falta mais.

Abdon Mar­inho é advo­gado.