AbdonMarinho - Como no tempo da KGB.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Domingo, 24 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

Como no tempo da KGB.

COMO NO TEMPO DA KGB.

Por Abdon Marinho.

ALGUÉM sabe qual é o grande sonho do gov­erno Bol­sonaro quando “crescer” – se crescer?

Resposta: ser igual ao gov­erno Flávio Dino.

Isso, claro, não se rela­ciona a qual­quer obra ou feito extra­ordinário para o bem da pop­u­lação, pois isso não existe.

O gov­er­nador pegou um estado mis­erável e já avançando pelo sexto ano o tem deix­ado mais mis­erável ainda.

Mas, como diria o ex-​presidente Lula, “ainda bem” que apare­ceu esse maldito vírus para o gov­er­nante estad­ual colo­car toda a culpa pelo insucesso e fra­casso do seu governo.

A “inveja” de Bol­sonaro em relação ao gov­erno do “nosso líder” diz respeito a “apro­pri­ação” do Estado, e dos seus instru­men­tos, em bene­fí­cio próprio e da “causa”.

O pres­i­dente da República atual­mente enfrenta uma das maiores crises do seu gov­erno por, suposta­mente, ten­tar inter­ferir ou ingerir ou coisa que o valha, nos des­ti­nos e na con­dução da Poli­cia Fed­eral.

Até um inquérito, com des­do­bra­men­tos impre­visíveis, corre no Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF, depois que o ex-​ministro da justiça deixou o cargo, apon­tando como motivo para tal decisão, essa ten­ta­tiva, pouco repub­li­cana, do sen­hor Bolsonaro.

Por aqui ninguém jamais cog­i­tou ques­tionar o uso da Polí­cia Judi­ciária pelo gov­er­nante de plan­tão.

A começar pelo fato da própria sec­re­taria de segu­rança ser coman­dada por um fiel e ardoroso mil­i­tante, um ver­dadeiro “homem de par­tido”, do Par­tido Comu­nista do Brasil — PCdoB.

O gov­er­nador nomeou o mil­i­tante do par­tido no primeiro dia que chegou ao gov­erno e o mundo não veio abaixo.

Segundo as incon­fidên­cias do ex-​ministro da justiça o pres­i­dente da República choramin­gando apelou: –– Poxa, Moro, só quero um super­in­ten­dente (o do Rio de Janeiro), você fica com os out­ros vinte e seis.

É sobre o fato da poli­cia se prestar a servir o gov­er­nante que nos ocu­pare­mos neste texto. Antes, porém, cabe dizer que no fundo, no fundo, toda ani­mosi­dade entre o gov­er­nador do Maran­hão e o pres­i­dente da República e vice-​versa, é porque um enx­erga no outro os seus próprios defeitos.

Como em um espelho em que os vai­dosos se exam­i­nam e odeiam os defeitos que o outro (o espelho) revela.

Essa é a ver­dadeira razão da ani­mosi­dade – ainda que oculta por más­caras psicológicas.

Iso­lado há mais de sessenta dias por conta da pan­demia – e só me infor­mando através do leio e escuto –, sou infor­mado que poli­cia estad­ual “sen­tou à pua” em um grupo de What­sApp. Segundo o jor­nal­ista, que nar­rou o fato em “pod­cast”, os inte­grantes do grupo foram chama­dos à polí­cia por “falarem mal do gov­er­nador e do gov­erno” e, tam­bém, por orga­ni­zarem, através do grupo, uma man­i­fes­tação paci­fica con­tra as medi­das de iso­la­mento social dec­re­tadas pelo gov­er­nador para com­bater a pan­demia do novo coro­n­avírus.

Na nar­ra­tiva, o jor­nal­ista nos informa que os inte­grantes do grupo de What­sApp são (ou eram) pes­soas comuns que foram tratadas como mar­gin­ais e sofr­eram diver­sos tipos de con­strang­i­men­tos por se verem naquela situ­ação e serem chama­dos às falas como se fos­sem marginais.

Decerto que os del­e­ga­dos – e demais agentes poli­ci­ais –, agi­ram den­tro dos lim­ites da lei – jamais pen­saria difer­ente.

Mas ven­hamos – e con­ven­hamos –, tratava-​se de cidadãos comuns, mem­bros de um grupo de What­sApp, What­sApp, repita-​se mil vezes, e não de uma célula ter­ror­ista; o que estes cidadãos faziam (ou ainda fazem) eram críti­cas ao gov­erno – um dire­ito deles, gostem-​se das crit­i­cas ou não –, o ato suposta­mente pro­gra­mado, ainda que infringisse o decreto de iso­la­mento, não se tratava da pro­gra­mação para colo­carem bom­bas para explodi­rem as pontes sobre o Rio Anil, o palá­cio do gov­erno, o cen­tro admin­is­tra­tivo ou mesmo o edifí­cio João Goulart, recen­te­mente inau­gu­rado e pelo qual o estado paga uma boa grana mensalmente.

A dis­cussão que se trava aqui é sobre a escal­ada autoritária do gov­erno estad­ual, a ponto da poli­cia mon­i­torar gru­pos de con­ver­sas por aplica­tivos e inti­mar as pes­soas a prestarem esclarec­i­men­tos por, suposta­mente, pro­gra­marem uma man­i­fes­tação pací­fica con­tra o gov­erno ou para “furarem” um blo­queio san­itário.

Ora, ainda que fosse legit­imo esse mon­i­tora­mento indis­tinto de gru­pos de bate papo por aplica­tivo, por qual razão, ao tomarem con­hec­i­mento de que o grupo pre­tendia fazer um protesto pací­fico con­tra as medi­das do gov­erno, as autori­dades poli­ci­ais não noti­ficaram o Min­istério Público Estad­ual para que este ado­tasse as providên­cias que jul­gasse necessárias?

Aliás, o MPE ou mesmo a Defen­so­ria Pública se fiz­eram pre­sentes nas oitavas dos inte­grantes do grupo de What­sApp a fim de pre­venirem quais­quer abusos?

Muito além do ato iso­lado – pois mais abu­sivo que seja –, o que torna a situ­ação mais grave é padrão.

Quan­tas não foram as vezes que se ouviu histórias de que as forças poli­ci­ais do estado, suposta­mente, estariam enga­jadas no pro­jeto político do gov­er­nador e do seu grupo?

Quan­tas não foram as vezes que se ouviu boatos sobre a existên­cia de mon­i­tora­mento ou mesmo “grampo” telefônico/​telemática e dados con­tra os adversários?

Lem­bro que nas eleições de 2016 ouvi­mos depoi­men­tos de mais uma lid­er­ança, sobre­tudo, do inte­rior dando conta do uso da máquina pública con­tra os adver­sários do gov­er­nador, inclu­sive um ou outro dizendo que a polí­cia mil­i­tar aman­hecera em suas portas.

Aqui na cap­i­tal e região met­ro­pol­i­tana, nem se fala.

Em 2018 foi o escân­dalo denun­ci­ado pub­li­ca­mente de que a Polí­cia Mil­i­tar estaria mon­i­torando os gru­pos políti­cos no inte­rior, inclu­sive, ofi­cial­mente, com dire­ito a ofí­cios cir­cu­lares e planil­has de dados a serem cole­ta­dos.

Alguém sabe a quan­tas andam as inves­ti­gações sobre isso e se alguém foi punido ou responsabilizado?

A escal­ada autoritária com a uti­liza­ção da máquina pública tam­bém se volta con­tra a imprensa livre.

Quan­tas vezes não ouvi­mos notí­cias de jor­nal­is­tas sendo proces­sa­dos – e até mesmo cidadãos comuns –, por escreverem, falarem ou mesmo se man­i­festarem con­tra os novos “donos” do poder no Maranhão?

Uma vez, estava em meu escritório quando uma fun­cionária me avi­sou que deter­mi­nado cidadão que­ria falar comigo.

Pelo nome dito não lem­brei da pes­soa mas fui atendê-​lo numa sala ao lado.

O cidadão tinha ido me comu­nicar e até cog­i­tar me arro­lar como teste­munha em um processo ou inquérito que estaria respon­dendo por ter comen­tado, através de um pseudôn­imo, um artigo que havia escrito que fora repro­duzido por um dos blogues da cidade.

Diver­sos jor­nal­is­tas ou blogueiros respon­dem ou respon­deram proces­sos cíveis, crim­i­nais ou mesmo a inquéri­tos por crimes de opinião no atual gov­erno.

Quando não são as autori­dades a proces­sarem jor­nal­is­tas e cidadãos, o próprio Estado se encar­rega disso através de sua procuradoria.

A intenção é a aniquilação finan­ceira ou bus­car a con­de­nação das pes­soas para, no fundo, calar qual­quer um que ouse dis­sentir e se man­i­fes­tar con­tra o gov­erno e/​ou os gov­er­nantes.

Já ouvi de mais de um jor­nal­ista que nunca em qual­quer tempo da car­reira profis­sional fora perseguido quanto na atual quadra da polit­ica local.

São poucos os jor­nal­is­tas, no Maran­hão, que brava­mente resistem à pressão do apar­elho estatal ou dos demais mecan­is­mos de dominação.

Enquanto fazem tudo isso por aqui, este mes­mos pal­adi­nos da democ­ra­cia e da liber­dade, saem Brasil afora crit­i­cando a escal­ada autoritária do gov­erno fed­eral – com razão –, inclu­sive, através de reit­er­a­dos pedi­dos de impeach­ment, rep­re­sen­tações e ações judiciais.

É o nosso con­hecido espelho. Nos out­ros enx­ergo meus próprios defeitos – e eles são tão hor­ren­dos quanto a real face de Dorian Gray, da imor­tal obra de Oscar Wilde.

Os cidadãos de bem, não podemos silen­ciar diante de fatos de tamanha gravi­dade. Inti­mar e con­stranger inte­grantes de gru­pos de What­sApp é a prova der­radeira de que o autori­tarismo dos atu­ais gov­er­nantes estad­u­ais não con­hece limites.

O próx­imo passo será inti­mar a turma do happy hour? A galera da sin­uca? O grupo de ami­gas que ficam “fofo­cando” nas por­tas ao entardecer?

É o que falta.

Tomem tento! A única KGB da qual sen­ti­mos saudades é a antiga boate da Rua das Hor­tas, da nossa juventude.

Abdon Mar­inho é advogado.

Comen­tários

0 #1 abde­laziz san­tos 22-​05-​2020 19:22
Forte. Cor­reto Esclare­ce­dor. Não podemos com­pactuar com isso. Fere as regras democráticas.
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