AbdonMarinho - A COR DO PRAGMATISMO.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Domingo, 24 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

A COR DO PRAGMATISMO.

A COR DO PRAGMATISMO.

Por Abdon Mar­inho.

JAMAIS, acred­ito, recairá sobre o gov­er­nador do estado a acusação de que ele não é um homem prático; um legí­timo dis­cípulo da teo­ria filosó­fica desen­volvida a par­tir das ideias de Charles Sanders Pierce (18391914) e William James (18421910), segundo a qual deve-​se dar mais importân­cia às con­se­quên­cias práti­cas de con­ceitos e con­hec­i­men­tos do que a seus princí­pios ou pres­su­pos­tos teóricos.

Os cidadãos de bem, acos­tu­ma­dos com inque­bran­táveis princí­pios éti­cos e morais; e mesmo aque­les já cale­ja­dos pela ine­scrupu­losa política segundo a qual os fins jus­ti­fi­cam quais­quer meios, chegam a estran­har e, até mesmo, escandalizar-​se com o excesso de prag­ma­tismo político do “nosso coman­dante”.

Leio alguns blogues, desde o iní­cio da gestão, recla­marem do que chamam “inco­erên­cia” do gov­er­nante.

Só que isto que chamam de inco­erên­cia – e talvez exista alguma aqui e ali –, não passa do velho prag­ma­tismo em estado bruto.

E não vem de hoje.

O PCdoB em 1994 uniu-​se ao grupo Sar­ney per­manecendo no gov­erno da oli­gar­quia até que fos­sem colo­cado para fora cerca uma década depois.

Agora o gov­erno comu­nista — talvez com saudade dos anti­gos ali­a­dos — é for­mado, basi­ca­mente, por inte­grantes do grupo que juraram nunca mais ter espaço no poder. E cria-​se uma situ­ação bisonha: os anti­gos ali­a­dos do Sar­ney que viraram adep­tos do “comu­nismo” não têm mais defeitos, mas aque­les que per­manecem adep­tos do ex-​presidente, são a encar­nação de Satanás.

Nada mais sig­ni­fica­tivo deste “prag­ma­tismo” do que a con­venção que homol­o­gou a can­di­datura do atual gov­er­nador comu­nista para mais um período à frente dos des­ti­nos do estado.

Pelo que li, ao menos 15 par­tidos, quase metade dos reg­istra­dos justo a Justiça Eleitoral, inte­gram a col­i­gação de apoio.

Um arco de aliança que vai desde lib­erais con­vic­tos a comu­nistas enver­gonhados, além da velha chusma inter­mediária com­posta, quase sem­pre, por inúmeros fregue­ses dos códi­gos e leg­is­lação penal extrav­a­gante, criando-​se uma situ­ação onde os que dev­e­riam ser inves­ti­ga­dos e, ao cabo de tudo apu­rado, pre­sos, “con­ven­cionavam” com as autori­dades que têm a respon­s­abil­i­dade de fazer isso: investigá-​los e, se for o caso, prendê-​los.

Mas, cer­ta­mente, acham bonito reunir-​se em torno do atual gov­erno, par­tidos de todas as ver­tentes ide­ológ­i­cas, inclu­sive, algu­mas, pro­gra­mati­ca­mente, opostas ao par­tido que se encon­tra no poder.

Isso não acha bonito, pelo menos não os inco­moda, pelo con­trário, tanto que no site do par­tido comu­nista nacional, sem qual­quer con­strang­i­mento, fes­teja esse fato, essa negação ao que seja a boa política, a reunião de todo tipo de par­tido do espec­tro ide­ológico no mesmo palanque.

Assim, como não vêem nada demais em o gov­er­nador que se diz comu­nista, rezar a missa na Sé, penitenciar-​se no culto evangélico à tarde, ajoel­hado ainda que sob chuva tor­ren­cial e a noite rece­ber uma enti­dade num ter­reiro de can­domblé e, sobrando tempo, ainda par­tic­i­par da reunião da Loja Maçônica local.

Tudo com tanta nat­u­ral­i­dade e prag­ma­tismo que nem chega a tro­car de roupa para fazer tudo isso.

Uma coisa é você respeitar todas as religiões. Isso, aliás, é dever da autori­dade e do cidadão, outra coisa, bem difer­ente, é agir como se pro­fes­sasse todas essas religiões, ainda mais quando se é comu­nista o que, em si, já trás o antag­o­nismo ao cris­tian­ismo, só para ficar neste exem­plo.

Longe de mim a pre­ten­são de “vigiar” com­por­ta­men­tos, mas está claro que há uma clara explo­ração política da boa-​fé dos cidadãos.

Vou além, entendo que há uma burla a livre escolha do eleitor quando par­tidos antagôni­cos se jun­tam.

Ao colo­carem lib­erais e comu­nistas no mesmo pacote o que esta­mos dizendo aos cidadãos? Quais pro­je­tos par­tidários serão imple­men­ta­dos no gov­erno, na even­tu­al­i­dade da vitória?

Decerto que o processo de “con­venci­mento” envolveu muito “prag­ma­tismo” – e adi­antado.

Ainda mais nos dias hoje quando todos sabem o risco de se deixar para amanhã, de se guardar o almoço para a janta. Ou será que, do dia para noite, o DEM, o PR ou o PP, pas­saram a ado­tar o ideário “comu­nista” como razão de vida dos seus diri­gentes? Ou que ficaram encan­ta­dos com a cor dos olhos do gov­er­nador ou sua bela sil­hueta? Por mais boa von­tade que tenha, não creio.

Mas essa tem sido a tônica do pro­jeto político do atual gov­erno.

São inúmeros os exem­p­los que ilus­tram isso e que cul­mi­nou no que “ven­dem” como a maior con­venção já ocor­rida no estado, segundo os próprios, com cerca de dez mil almas.

Isso é o fruto do velho prag­ma­tismo e da capaci­dade de tro­car uns por out­ros à medida que pode “ter” os primeiros por menos ou que estes não mais inter­es­sam.

Em 2014, deter­mi­nado par­tido “fechou” com a can­di­datura do grupo Sar­ney, mas um grupo deste par­tido tra­bal­hou muito pelo pro­jeto dos comu­nistas. Um can­didato, inclu­sive, ado­tou como número de cam­panha o da sua leg­enda seguido do número do can­didato a gov­er­nador “do coração”, e pedia votos nos meios de comu­ni­cação voto para si, com ênfase no número do can­didato a gov­er­nador.

Ven­cida a eleição esse can­didato, pelo que fez na cam­panha e tam­bém por ter um vida inteira ded­i­cada a esse pro­jeto, foi feito secretário. E ia muito bem na função, sendo recon­hecido pelos vários atores do processo.

Isso até o dia que o gov­er­nador pre­cisou do cargo para aco­modar outro par­tido que, registre-​se, era opos­i­tor fer­renho do par­tido do inte­grante do gov­erno e ali­ado fiel desde sem­pre, não pen­sou duas vezes, pediu o cargo de volta.

Uns dizem que a demis­são ocor­reu pelo Twit­ter, já out­ros infor­mam que houve um tele­fonema antes.

Esse foi o mesmo prag­ma­tismo que obrigou essa mesma leg­enda a “col­i­gar pelo beiço” – ou seja, a despeito de pos­suir um forte “ativo” eleitoral: tempo de tele­visão e mil­itân­cia –, col­igou sem inte­grar a chapa majoritária e sem ocu­par qual­quer função rel­e­vante na cam­panha e “engolindo” todos os par­tidos “golpis­tas” que os cat­a­pul­taram do poder cen­tral.

Mas isso já não foi sur­presa para ninguém. É ape­nas o exer­cí­cio puro poder, pelo poder.

Se posso, faço como quero e da forma que me aprou­ver. Se o ali­ado de ontem já não me serve ou se já não me serve tanto, que fique pelo meio do cam­inho ou que ocupe um espaço com­patível com a importân­cia do momento.

Quem bem con­hece tal estraté­gia é o dep­utado Waldir Maran­hão. Quando ocupou interi­na­mente a presidên­cia da Câmara dos Dep­uta­dos e acor­dou em fazer o papelão de anu­lar o impeach­ment da ex-​presidente Dilma Rouss­eff, era o “bam­bambã”, o guer­reiro do povo brasileiro, sendo inclu­sive con­dec­o­rado e, pelo “serviço prestado”, seria o can­didato ao Senado da República, na chapa gov­ernista.

A história já con­hece­mos. Quando perdeu sua importân­cia, seu par­tido e tudo mais, perdeu a chance de ver cumpri­das todas as promes­sas que lhe foram feitas.

O “guer­reiro” que virou cha­cota nacional e inter­na­cional pela “estu­dan­tada” de anu­lar o impeach­ment, sequer foi aceito no par­tido da ex-​presidente. Os que lhe aplau­diam, viraram-​lhes as costas.

Sem leg­enda, sem promes­sas cumpri­das, foi bus­car abrigo num par­tido que faz oposição aos atu­ais donatários do poder.

O prag­ma­tismo empre­gado não respeita a história ou ausên­cias. Quem pode­ria supor que depois de aju­dado a vida política inteira pelo grupo do fale­cido dep­utado Hum­berto Coutinho, de ter pran­teado sobre o seu cadáver, o gov­er­nador iria aliar-​se aos seus adver­sários no Municí­pio de Cax­ias? Será que se Hum­berto Coutinho fosse vivo teria tal cor­agem? Ou será que aproveita da frag­ili­dade, até pelo estado da viu­vez recente para obri­gar o grupo a aceitar a dividir o palanque com os arquirrivais?

De todos, entre­tanto, ninguém con­heceu com mais ênfase o prag­ma­tismo comu­nista que o ex-​governador José Reinaldo Tavares. E digo isso porque estive uma ou duas vezes com ele, quando ainda gov­er­nador, e vi o car­inho pater­nal com que tratava o atual gov­er­nador, na ideia de fazê-​lo o ver­dadeiro “reden­tor” do Maranhão.

Quem não con­hece essa história, pode se con­tentar com exame dos números da eleição de 2006. Lá se tem clara certeza que votos que “fez” o dep­utado fed­eral Flávio Dino, eram votos de “gov­erno”.

O exame é bem sim­ples, basta ver os colé­gios eleitorais, para se ter a certeza do real “tamanho eleitoral” do atual gov­er­nador naquela época. Só para resumir: Era nenhum.

Ape­sar disso, e de tudo mais que fez depois, o ex-​governador José Reinaldo só foi ouvido e respeitado até o dia em que aquele que ele tanto son­hou como “lib­er­ta­dor” do Maran­hão chegou ao poder.

A par­tir daí só lhe sobraram os desaforos, se não do próprio gov­er­nador, dos seus pre­pos­tos, a ponto do ex-​governador não aguen­tar mais e sair do grupo político.

Pois é, prag­mati­ca­mente, excluíram o ex-​governador do pro­jeto político de vir a ser senador pelo Maran­hão apoiado pelas forças que estão com o gov­er­nador e con­tin­uar a con­tribuir com o pro­jeto que foi o pai.

Logo ele, que seria o can­didato nat­ural deste grupo. Alguém estran­haria ou ques­tionaria se desde o primeiro dia do gov­erno o gov­er­nador anun­ci­asse como seu primeiro can­didato ao Senado? Todos sabe­mos que não.

Todos esper­avam isso, entre­tanto, quem foi “ungido” como primeiro can­didato do grupo foi o pres­i­dente do PDT e, no final do ano pas­sado, o gov­er­nador anun­ciou que segunda vaga iria para o “murro”, o que se via­bi­lizasse seria o can­didato.

Aquela afir­mação, na entre­vista de final de ano, sabe­mos pelo resul­tado da con­venção, não era ver­dadeira e sim um despiste para excluir José Reinaldo.

A con­venção escol­heu os can­didatos que o gov­er­nador quis, inclu­sive os seus suplentes, com os par­tidos que com­põem a col­i­gação majoritária “engolindo” o prato como feito.

Aceitaram a segunda can­di­datura da dep­utada Eliziane Gama, exceto pelo jogo de cena de parte do Par­tido dos Tra­bal­hadores, sem maiores sobres­saltos.

A quadra política estad­ual, pelo menos do lado dos gov­ernistas, está desen­hada con­forme o prag­ma­tismo empreen­dido pelo gov­er­nador, que não enx­er­gou qual­quer obstáculo ético ou moral em usar todas as armas que dis­põe para a guerra eleitoral.

Resta saber se o cidadão/​eleitor estará de acordo com o que foi feito.

Abdon Mar­inho é advo­gado.