AbdonMarinho - O MARANHÃO NA ENCRUZILHADA DO ATRASO.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Domingo, 24 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

O MARAN­HÃO NA ENCRUZIL­HADA DO ATRASO.

O MARAN­HÃO NA ENCRUZIL­HADA DO ATRASO.
DIZIA o saudoso Rui Bar­bosa que “a palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade”. Uso-​a no fron­tispí­cio do meu site.
Há alguns anos resolvi que era hora de expor o que penso pub­li­ca­mente, usar a palavra para dar o meu teste­munho sobre os dias que vive­mos. Minha opção foi pela palavra escrita.
Em todos estes anos, por onde passo, escuto uma per­gunta recor­rente: – você não tem medo de escr­ever estes tex­tos?
Ouço tal inquisição de médi­cos, advo­ga­dos, servi­dores públi­cos, estu­dantes, cidadãos comuns.
Já ouvia muito isso no gov­erno da sen­hora Roseana Sar­ney e, agora, até com mais fre­quên­cia, no gov­erno do sen­hor Flávio Dino.
Somente o fato de alguém, a essa altura do século 21, fazer tal per­gunta é motivo de pre­ocu­pação para cidadãos de bem – e que coloca em xeque o dis­curso de que vive­mos uma democ­ra­cia plena.
Democ­ra­cia onde as pes­soas temem a liber­dade de expressão?!
Se as pes­soas não se sen­tem con­fortáveis para diz­erem o que pen­sam por temerem represálias por parte dos donos do poder é de se per­gun­tar que espé­cie de democ­ra­cia é essa que tanto se propala.
Exis­tem razões palpáveis para que a “cul­tura do medo” esteja tão pre­sente na vida dos cidadãos, a ponto de alcançar as pes­soas indis­tin­ta­mente, de diver­sas profis­sões ou ativi­dades?
A leitura que faço a par­tir dos ques­tion­a­men­tos que recebo é que, os cidadãos, efe­ti­va­mente, não se sen­tem livres, e, pelo menos no aspecto da liber­dade de expressão, enx­ergam os dias atu­ais com mais temor ou pes­simismo que os anos do que ficou con­hecido como sar­neysmo.
E, nem fale­mos da Era ante­rior, o vitorin­ismo, já que a grande maio­ria dos vivos só a con­hece através dos livros de história.
Acred­ito que o temor ainda sen­tido pelos cidadãos, decorra do fato dos inte­grantes do atual gov­erno – e toda sua mídia –, dis­sem­inarem a ideia que vive­mos sobre a égide de outra Era, o din­ismo. Isso, ape­nas uma nova Era, uma con­tinuidade das ante­ri­ores.
Para os cidadãos que me param nos corre­dores é como se Maran­hão ape­nas tivesse mudado de donatário. Tive­mos o vitorin­ismo, o sar­neysmo, e agora, pas­mem, o din­ismo. A per­cepção é, na essên­cia, que o chicote ape­nas tenha mudado de dono.
Faz sen­tido essa per­cepção dos cidadãos? Talvez. Lem­bro que nos primeiros meses do atual gov­erno até escr­ever artigo na capa de jor­nal (no caso o Pequeno), o gov­er­nador fez, copiando a prática do senador Sar­ney n’O Estado do Maran­hão.
Depois de falar diver­sas vezes, levaram a col­una sem­anal para a página 4. Seria um indí­cio?
As “eras” ante­ri­ores ficaram recon­heci­das pelo pat­ri­mo­ni­al­ismo, pela uti­liza­ção dos poderes do estado em bene­fí­cios de uma mino­ria. Mas, será que isso é muito difer­ente do que vemos hoje, onde pes­soas que, se deix­adas por sua conta não se elege­riam a inspetores de quar­teirão e, pelo poder ou car­gos que acu­mu­lam, são cota­dos para serem os mais bem vota­dos?
Outro dia li (e até agora ninguém des­men­tiu), que se nego­cia a colo­cação da esposa de deter­mi­nado secretário como suplente de senador de um dos can­didatos majoritários apoia­dos pelo gov­erno. Li, ainda, sobre as inúmeras nomeações de par­entes, ader­entes, etc.
Isso é muito difer­ente do filho do senador ser seu suplente? Da esposa ser dep­utada? Do genro ser dep­utado? Do filho do dep­utado fed­eral ser dep­utado estad­ual? Dos amantes – de quais­quer dos sexos, abaixo o pre­con­ceito! – serem nomea­dos para este ou aquele cargo comis­sion­ado, muitas vezes, para, sequer tra­bal­har? Ou eleitos para mandatos pelo poder dos amá­sios?
Não seriam estes infind­áveis aluguéis — con­heci­dos por cama­radas -, tam­bém, uma expressão do pat­ri­mo­ni­al­ismo que se jurou com­bater?
Claro que podemos falar em avanços soci­ais e admin­is­tra­tivos. Como os são o pro­jeto escola digna, a dis­tribuição de patrul­has agrí­co­las, novas unidades de saúde e mesmo a ajuda em alguns pro­je­tos de infraestru­tura urbana.
No caso do Escola Digna, acho-​o formidável. Já disse – e até escrevi sobre –, que reti­rar estu­dantes de esco­las de taipa e chão batido ou “latadas», sig­nifica um extra­ordinário avanço. Emb­ora, ressalve-​se, ainda muito longe do ideal: esco­las de qual­i­dade, com ensino de qual­i­dade, onde todas as cri­anças e jovens, do campo ou das cidades, tivessem iguais chances de apren­diza­gem que têm as cri­anças e jovens das mais caras esco­las pri­vadas. Um sonho!? Talvez.
Ainda estes “avanços”, são ofus­cado por inúmeros erros de gestão cometi­dos, mais, prin­ci­pal­mente, pelo estilo “ilu­mi­nado», infalível de gov­ernar. Mesmo os ali­a­dos mais fieis, à “boca pequena”, recla­mam do gov­erno do «eu soz­inho», do estilo seita com que gov­er­nam.
Se atu­ram, é mais por con­veniên­cia que por con­vicção.
Vou além, o gov­erno atual tem se mostrado abso­lu­ta­mente refratário a quais­quer crit­i­cas e ques­tion­a­men­tos. Ainda aque­las críti­cas feitas no sen­tido de ajudá-​los, de fazê-​los ver além das pare­des do palá­cio, são malvis­tas, tidas como “de adver­sários”. Uma espé­cie de obsessão que chega próx­imo de patológ­ica.
Li, com pesar, pre­ocu­pação e incredul­i­dade, que este é o gov­erno onde as autori­dades públi­cas mais deman­dam con­tra jor­nal­is­tas, blogueiros e qual­quer um que ouse dis­cor­dar ou criticar seus méto­dos de gov­ernar ou mesmo supos­tos erros em mais de trinta anos.
E, como se proces­sar todos que dis­cor­dam do seu estilo de gov­ernar fosse um grande feito, fazem questão de divul­gar pelas redes soci­ais e out­ros meios, que proces­saram e vão con­tin­uar a fazer isso con­tra este ou aquele e que ninguém baterá o “estado» impune­mente.
Vejam, que a exem­plo dos gov­er­nantes abso­lutis­tas de sécu­los pretéri­tos, con­fun­dem a pes­soa do gov­er­nante com o estado. Por isso mesmo, acham nor­mal que o procu­rador do ente público peça aos veícu­los de comu­ni­cação dire­ito de resposta em nome do gov­er­nante.
Não sei é de forma delib­er­ada, mas a impressão que tenho é que essa “cul­tura do medo” é uma estraté­gia (equiv­o­cada) de gov­ernar. Daí a per­gunta recor­rente: – você não tem medo?
Querem que os cidadãos, temam o gov­erno e seus gov­er­nantes, senão sofr­erão as con­se­quên­cias.
E estas con­se­quên­cias vão desde os proces­sos judi­ci­ais, como fazem questão de anun­ciar, às cam­pan­has de difamação na mídia ofi­ciosa. E já há quem diga que o braço poli­cial do Estado tam­bém está sendo colo­cado nesta estraté­gia de poder, o que é algo gravís­simo.
Será que as pes­soas indagam se não tenho medo, temem esse tipo de coisa?
Já nas eleições de 2016 o que mais se ouviu foram denún­cias de que o apar­elho estatal, a chamada máquina pública, estava sendo usada, com desas­som­bro, em ben­efi­cio dos ali­a­dos do gov­er­nador no inte­rior do estado.
Há quem achem mérito nisso. Há quem diga admi­rar os que sabem usar o poder. Ainda, ou prin­ci­pal­mente, para o mal.
Não enx­ergo mérito algum. Que mérito pode haver quando se “briga” para baixo? Quando se usa do poder que tem con­tra os mais fra­cos?
Gov­er­nante que se preza não tenta infundir temor. Pelo con­trário, con­quista o respeito pela humil­dade e benevolên­cia, pois está sem­pre pronto a con­cil­iar e aberto ao diál­ogo, aceita as crit­i­cas como um instru­mento de cresci­mento pes­soal e político.
Nas min­has con­jec­turas mais ínti­mas e pes­soais me ponho a per­gun­tar: não foi isso que se pro­puseram a com­bater?
A pro­posta não era a “lib­er­tação do Maran­hão” das amar­ras do atraso, do autori­tarismo, do pat­ri­mo­ni­al­ismo e da pre­potên­cia?
Existe algo mais atrasado que ten­tar pro­mover, como estraté­gia de gov­erno, a cul­tura do medo?
Cer­ta­mente os mil­hares de sufrá­gios que o atual gov­er­nador teve em relação ao rep­re­sen­tante do “antigo régime”, foi no sen­tido de efe­ti­vas mudanças de pen­sar, de efe­tiva liber­dade em todos os sen­ti­dos.
O sonho son­hado era o da liber­dade.
Por onde ando escuto recla­mações diver­sas a respeito dos atu­ais inquili­nos dos Leões. Recla­mações de que se trata de um gov­erno fechado, de bem poucos, perseguidor, que não aceita ideias diver­gentes. Críti­cas aos aluguéis, apel­i­da­dos de cama­radas; críti­cas à fúria arreca­datória, que levou mil­hares de maran­henses a serem neg­a­ti­va­dos na SERASA; críti­cas à apreen­são de mil­hares de veícu­los, e por aí vai.
Aliás, sobre essas apreen­sões de veícu­los escutei uma história curiosa numa destas min­has andanças.
Per­gun­tava a um cidadão sobre as eleições do ano que vem:
– Doutor, não sei ainda em quem votarei, mas já sei em quem não vou votar, é no atual gov­erno.
Curioso, per­gun­tei:
– Mas, por quê?
– Olhe, doutor, eu só tinha uma moto finan­ciada em mais de 20 prestações. Quase acabo com ela na cam­panha do Flávio «na espera” de mel­ho­rar «pro» meu lado. Não con­segui nada. E depois, como aqui no inte­rior, não tinha cos­tume de andar com doc­u­mento em dia, “tomaram”, minha moto.
Encer­rei a con­versa. Cer­ta­mente, trata-​se de um caso iso­lado.
Por tudo isso, não estran­hei que pesquisas apon­tem dis­puta entre o “sar­neysmo» e o «din­ismo” em situ­ação de empate téc­nico.
Emb­ora o cidadão comum não con­siga iden­ti­ficar muito bem, os dois pos­tu­lantes, tanto a ex-​governadora, Roseana Sar­ney, quanto o atual gov­er­nador, Flávio Dino, têm esti­los pare­ci­dos de gov­ernar: voltado para as práti­cas do pas­sado e não apon­tam um rumo de desen­volvi­mento para o futuro, como fiz­eram os políti­cos do Ceará e mesmo do Piauí.
A ante­rior, não pode­ria, posto ser a con­tin­u­ação de uma oli­gar­quia famil­iar.
O atual, que esperá­va­mos fosse este fanal para o futuro, tornou-​se, na ver­dade, uma seita. Eles até pen­sam que é gov­erno, mas é uma seita, devotada as mais práti­cas atrasadas, autoritárias, inclu­sive, ante­ri­ores, ao próprio sar­neysmo que juraram com­bater.
Infe­liz­mente esta é outra dis­torção da nossa política.
Como dizem que no Maran­hão quem não é sar­ne­y­sista é anti-​Sarney, impe­dem o surg­i­mento de um pen­sa­mento crítico autônomo e alheio a esta dico­to­mia maniqueísta.
Esta é a encruzil­hada do atraso.
A política do estado, decor­ri­dos 50 anos, tendo que ser dis­putada entre o Sar­ney e o que se inti­t­ula anti-​Sarney, como se por aqui o tempo não tivesse pas­sado.
Esta é a des­graça do Maran­hão. Não temos out­ras opções políti­cas com poten­cial para dis­putar as eleições e apon­tar um rumo para o desen­volvi­mento.
O atraso político, econômico e histórico impos­si­bil­i­tou o surg­i­mento de out­ras lid­er­anças e as que ensa­iam, infe­liz­mente – emb­ora não todas –, trazem o ranço da velha dico­to­mia.
Não vis­lum­bro, até aqui, uma can­di­datura, com­pet­i­tiva, que rep­re­sente algo novo. E o que era para ser novo tornou-​se mais antigo que o pas­sado.
Esta é a sín­tese do atraso Maran­hense.
Abdon Mar­inho é advogado.