AbdonMarinho - IDEOLOGISMO ATRAVANCA O BRASIL.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Domingo, 24 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

IDE­OL­O­GISMO ATRA­VANCA O BRASIL.

IDE­OL­O­GISMO ATRA­VANCA O BRASIL.

SOU CON­TRA a PEC 241, a chamada PEC do teto. Não é que seja con­tra a existên­cia do teto dos gestos públi­cos – essa é uma causa que defendo há mais de vinte anos. Sou con­tra que o país tenha que colo­car no seu texto con­sti­tu­cional algo que até uma cri­ança de 08 anos é capaz de saber: ninguém pode gas­tar além do que tem.

Eu, você, sabe­mos que não podemos gas­tar mais do que gan­hamos. Quando des­obe­de­ce­mos esta regra básica o resul­tado é que­brar­mos, ficar­mos insol­ventes, não con­seguirmos pagar as con­tas e per­der­mos o crédito na praça.

Ainda há um agra­vante, enquanto nós, pes­soas físi­cas, podemos fazer um “bico», arran­jar um tra­balho extra num momento de aperto ou mesmo nos socor­rer com um emprés­timo, em último caso, os gov­er­nos não podem.

O Estado não pro­duz riquezas, não «faz» din­heiro. Os recur­sos que usam são fruto dos impos­tos que pag­amos. Os cidadãos brasileiros já pas­samos quase seis meses do ano tra­bal­hando uni­ca­mente para pagar impos­tos. Ape­sar disso, esses impos­tos não têm sido sufi­cientes para fazer face aos gas­tos do gov­erno, como resul­tado, a pre­visão é que fechare­mos o ano com um déficit de 170 bil­hões de reais.

Aos gov­er­nos, para fechar as con­tas, restam duas alter­na­ti­vas: reduzir os gas­tos ou aumen­tar os impos­tos que pag­amos e que já são altos, sobre­tudo, se com­para­mos ao retorno que temos.

A PEC da dis­cór­dia sequer prega a redução de gas­tos: propõe que, pelos próx­i­mos vinte anos, os gas­tos públi­cos ten­ham por base o gasto do ano ante­rior, mais a cor­reção. A pro­posta, a longo prazo, visa o equi­líbrio das con­tas públi­cas. Não é isso que se faz as nações com econo­mias sól­i­das? Não é o desejável?

Os que hoje se batem con­tra a medida são, em grande parte, os que estavam no poder até ontem e não apre­sen­taram qual­quer solução, exceto o aumento de impos­tos a uma classe pro­du­tiva já asfix­i­ada por tan­tos trib­u­tos. Na oposição bradam por out­ras alter­na­ti­vas que em treze anos de poder não tiveram condições ou com­petên­cia para imple­men­tar. Até porque, não existe mila­gre em econo­mia, din­heiro não brota em árvore (não em sen­tido lit­eral). Solução só nos moldes delin­ea­dos: redução de gas­tos ou aumento de tributos.

São muitos os que repetem o dis­curso con­tra os ban­cos, os ricos, não ques­tiono a neces­si­dade de pagarem mais impos­tos, entre­tanto nada disso terá qual­quer sen­tido se os gov­er­nos con­tin­uarem gas­tando como se tirassem din­heiro de um saco sem fundo. Neste con­texto, colo­car ricos con­tra pobres, como sem­pre fiz­eram, não passa de uma fuga pela tan­gente ou, como se diz na minha terra, con­versa mole para boi dormir.

Na ver­dade, o que se fez foi estim­u­lar o descon­t­role dos gas­tos públi­cos inclu­sive afrontando a Lei de Respon­s­abil­i­dade Fis­cal (LC 1012000). O des­perdí­cio dos recur­sos públi­cos, quer dizer, dos nos­sos recur­sos, alcança, indis­tin­ta­mente, todos os poderes. Qual­quer desav­isado fica per­plexo com a sun­tu­osi­dade dos pré­dios públi­cos, prin­ci­pal­mente daque­les des­ti­na­dos à Justiça e ao Min­istério Público – logo os dois que dev­e­riam ser mais parci­mo­niosos. E o des­perdí­cio não se mate­ri­al­iza ape­nas na sun­tu­osi­dade de suas insta­lações, passa tam­bém pelas infini­tas regalias, inclu­sive aquela imoral­i­dade do afas­ta­mento pelo come­ti­mento de «malfeitos», onde o afas­tado – pro­visório ou defin­i­ti­va­mente – per­manece recebendo proven­tos inte­grais. Tem muitos que faz é torcer por tal punição.

O des­perdí­cio é gen­er­al­izado no estado paquidér­mico. São serviços médi­cos e odon­tológi­cos exclu­sivos – que pas­sam a maior parte do tempo ociosos –, car­ros ofi­ci­ais, motoris­tas, segu­ranças, residên­cias ofi­ci­ais ou auxílios mora­dias, sem con­tar os diver­sos out­ros mimos pagos com recur­sos públi­cos e inacessíveis a quem os paga.

Certa vez li que teve/​tem órgão man­tendo, às expen­sas do con­tribuinte, até serviços de depilação íntima. É isso mesmo, pag­amos até a depilação dos fundil­hos de suas excelên­cias. Claro, que devo des­cul­pas pelo termo chulo, mas é necessário para que enten­der­mos o país sur­real em que vivemos.

São mor­do­mias incom­patíveis com a real­i­dade do país e da decên­cia. Isso, sem con­tar que car­gos públi­cos – nos três poderes e em todas as esferas –, estão entre os mais bem pagos em todo mundo.

Basta ver quanto custa um juiz brasileiro, um dep­utado, um vereador e com­parar com seus con­gêneres noutros países. Vejam os pen­duri­cal­hos dos car­gos; quanto custa o fun­ciona­mento da máquina.

Qual­quer um que não enx­er­gue a neces­si­dade de acabar­mos com esse tipo de coisa só pode está acometido por alguma cegueira ide­ológ­ica. Não faz sen­tido que um gov­erno, qual­quer gov­erno, não pos­sua lim­ites de gas­tos, não sofra com rig­orosas ver­i­fi­cações e controles.

Os críti­cos ao con­t­role ou estão sendo engana­dos ou não vivem no Brasil real. Temos uma edu­cação pública na rabeira do mundo, uma saúde onde as pes­soas mor­rem de molés­tia que já deviam ter sido errad­i­cadas desde o século pas­sado, onde mul­heres mor­rem de parto porque não lhes dis­pen­sam o atendi­mento ade­quado, onde os pacientes mor­rem enquanto aguardam o atendi­mento ou uma cirur­gia. E, noutra quadra vemos o din­heiro público sendo gasto com supér­fluos, com mor­do­mias ou sim­ples­mente sendo desvi­a­dos dev­ido à falta de controle.

A PEC do teto de gas­tos é tímida e só terá alguma eficá­cia se vier com diver­sas out­ras refor­mas. Emb­ora seja con­tra esse ates­tado de irra­cional­i­dade, já é um começo.

O que pre­cisamos enten­der é que o Brasil clama – para fun­cionar como se deve –, por uma reforma do Estado (já dis­se­mos isso noutras opor­tu­nidades), com redução da máquina pública, com redução da rep­re­sen­tação política, dos car­gos comis­sion­a­dos e funções grat­i­fi­cadas, com o fim das mor­do­mias, da sun­tu­osi­dade faraônica.

A análise sen­sata da situ­ação em que o país se encon­tra clama por estes enfrenta­men­tos. A menos que acred­ite­mos em mila­gres, que alguém com uma var­inha mág­ica fará os nos­sos prob­le­mas desa­pare­cerem, ter­e­mos, sim, que tomar medi­das drás­ti­cas de con­tenção de gas­tos, de zelo com o din­heiro público (nosso), de enfrenta­mento das cor­po­rações que não querem perder priv­ilé­gios vergonhosos.

O que está em jogo é o des­tino do Brasil. A pop­u­lação pre­cisa repu­diar de forma vee­mente esse ide­ol­o­gismo que só atra­palha o país e que chega ao absurdo de se rejeitar medi­das que foram apre­sen­tadas até pelo gov­erno que acabou de sair.

Um exem­plo foi o que acon­te­ceu, outro dia, com a votação do FIES. Mil­hares de estu­dantes depen­dem do finan­cia­mento estu­dan­til. O gov­erno ante­rior usou e explorou esta ban­deira a não mais poder, inclu­sive dizendo que o gov­erno que os sucedeu iria acabar com ele.

Pois bem, o gov­erno sem orça­mento, encam­in­hou pro­posta de 700 mil­hões para o finan­cia­mento estu­dan­til e os chama­dos defen­sores da con­quista não só obstruíram a votação como votaram contra.

O com­por­ta­mento desumano nos leva a pen­sar que o FIES, antes de ser um bem para os estu­dantes, na ver­dade, nunca foi além de uma ban­deira para ser explo­rada politi­ca­mente. Se não estão mais no poder, os estu­dantes poderão pas­sar sem o finan­cia­mento. É isso que provam com o com­por­ta­mento que tiveram.

Acred­ito que já passa da hora de pen­sarem no Brasil e nos brasileiros. Já passa da hora de acabarem com esse bolorento dis­curso de que só eles são bons e têm a solução. Já mostraram que não têm solução para nada.

O Brasil pre­cisa alcançar o século vinte um. Os debates são os mes­mos do século dezen­ove, com esse ide­ol­o­gismo tosco e tolo que ignora as reais neces­si­dades do povo.

Abdon Mar­inho é advogado.