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Bem Vindo a Pagina de Abdon Marinho, Ideias e Opiniões, Domingo, 24 de Novembro de 2024



A palavra é o instrumento irresistível da conquista da liberdade.

Escrito por Abdon Marinho

(Mapa da América do Sul de 1805).

A Mera Coincidência de Maduro.

Por Abdon C. Marinho*.

FALTAVA POUCOS dias para as  eleições americanas quando um escândalo eclodiu em pleno Salão Oval da Casa Branca: o presidente teria “bulido” em uma menina que visitava aquela sede de governo.

Com um escândalo sexual de tamanha monta, presidente e assessores não vêem muita chance de reeleição. Diante disso, um dos seus assessores entra em contato com um produtor de Hollywood para que este invente uma guerra na Albânia que serviria para desviar as atenções do escândalo e capitalizar politicamente o candidato à reeleição.

Esse é o fio condutor da comédia Wag the Dog, de Barry Levinson, de 1997. No elenco, monstros sagrados do cinema mundial, como Robert De Niro, Dustin Hoffman, Kirsten Dunst, Woody Harrelson. Para abrilhantar ainda mais a película, tem uma participação do cantor Willie Nelson.

No Brasil, o filme lançado em 1998, recebeu o nome “Mera Coincidência” e o foi o dileto amigo Aderson Lago, quando nos preparávamos para o embate eleitoral daquele ano que me alertou para o mesmo: — ah, Abdon, assisti um filme muito bom, ótimo. Tu não podes perder. Antes que tivesse tempo ou disposição para assistir, me recomendou o filme umas três vezes, quase sempre acrescentando alguns detalhes. 

Assisti, gostei, recomendo esse clássico de 1997, principalmente para aqueles gostam de “casar” uma comédia leve com a política. 

Como, nas palavras de Oscar Wilde “a vida imita a arte muito mais do que a arte imita a vida...”, o ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, que no próximo ano (2024) passará por um processo eleitoral que tínhamos esperança que fosse limpo, resolveu “inventar” sua própria guerra. Essa guerra, entretanto, com ares de comédia pastelão não conta com o talento de grandes atores, como no filme original – muito pelo contrário –, e caminha a passos largos para se tornar uma tragédia para a América Latina. 

Desde que o atual grupo político, primeiro com Hugo Chavez e depois com Nicolás Maduro assumiu o poder na Venezuela, em 1999, aquele país que já foi um dos mais ricos do mundo, graças, sobretudo, ao petróleo começou um processo acelerado de deterioração contando hoje com quase 95% (noventa e cinco por cento) de sua população vivendo em situação de pobreza. Isso mesmo, quase cem por cento da população vive em situação de pobreza, grande parte deles sem conseguir encontrar mais nem luxo para comer, uma inflação anual que beira os quatro dígitos e uma grande parcela de sua população (cerca de dez por cento ou mais) tendo sido obrigada a buscar abrigo noutras nações, sofrendo todos os tipos de privações e humilhações que essa situação impõe. 

Nesse cenário desolador para qualquer um que vá disputar uma eleição mas sofrendo pressões de todos os países do mundo mundo civilizado para que faça eleições e que as mesmas tenham acompanhamento internacional, ao ditador restou “inventar” uma reivindicação territorial arbitrada em favor da Guiana desde 1899, para “acender” um sentimento patriótico, desviar a atenção dos problemas reais da Venezuela, “quebrar” a oposição acusando-a de impatriota e até imputando-lhe crimes, como já temos visto, e de quebra, tentar algum tipo de “barganha” com o país vizinho, menor, desmilitarizado, etc. 

Qualquer um com o ensino fundamental sabe que uma das razões da estabilidade do continente americano reside no fato de termos fronteiras sólidas e definidas há mais de um século e tais definições foram frutos de negociações pacíficas das diplomacias desses países. 

Todos sabem também, uns mais que os outros, que o regime de Caracas não é confiável e a prova mais eloquente disso é como tem se portado desde que se instalou e, principalmente, nos últimos dias. Não bastava reacender uma discussão já arbitrada há mais de um século – e foi semelhante a definição de fronteiras de diversos outros países, principalmente o Brasil que é o maior da América do Sul –, e para a qual não tem razão, como também, que levar o continente todo para se envolver num front de guerra mundial anunciando que vai a Rússia em breve tentar o apoio para o seu pleito expansionista junto ao autocrata Putin, que em pleno século XXI, achou de empreender uma expansão de seu território contra a Ucrânia desencadeando uma guerra que já dura dois anos, com milhões de pessoas sofrendo suas consequências. 

Não acredito que a Rússia venha se envolver numa guerra na América, mas isso não a impede de dar força a Maduro, seja no Conselho de Segurança da ONU, caso este resolva aprovar alguma resolução contra a campanha expansionista de Maduro, seja com o fornecimento de armas, homens, equipamentos … será que precisamos disso?

Doido é doido, já dizia meu pai. E caso esse conflito escale, como ficam os interesses do Brasil? Sofreremos bombardeios? A base de Alcântara será atacada por alguma potência? E, já estão discutindo fronteiras, nossas nações indígenas, sobretudo na região não poderão reivindicarem suas independências em minúsculos territórios autônomos? Nossos outros vizinhos são poderão, se governados por algum maluco, querer rediscutir as suas fronteiras com o Brasil?

O mapa que ilustra esse textão é de 1805 (?) nele já consta a região do Essequibo como pertencente à Guiana  e não à Venezuela. Depois, na arbitragem de Paris, de 1895, ficou confirmado que o território ficaria com o primeiro  país. 

Não vejo sentido em se discutir novamente essa questão pois isso implicaria em “abrir” espaço para todas as demais discussões relativas as fronteiras dos países sulamericanos, incluindo a soberania nacional sobre a Amazônia. 

O Brasil – e principalmente o atual governo –, tem uma grande responsabilidade (e interesses) com o atual conflito envolvendo os dois vizinhos pois apoiou de forma “inédita” o regime de Caracas tendo o senhor Lula, muito embora na condição de ex-presidente, gravado vídeos e até participado de comícios em favor do ditador Nicolás Maduro. Já no atual governo, quando o regime de Maduro enfrentava isolamento internacional, o governo brasileiro o recebeu e o apoiou com todas as honras deferidas não apenas um chefe de estado, mas, deferidas a governo amigo. 

O Brasil não pode se “ofertar” como mediador de conflito, não existe isso, o que existe é um ditador com um projeto expansionista que ambiciona as riquezas do país vizinho – que só em petróleo de qualidade possui reservas de 11 bilhões de barris, o que equivale a setenta por cento das reservas do nosso país. 

Não há o que mediar diante de uma situação em que um país convoca o plebiscito para incorporar dois terços do país vizinho, ignorando tratados internacionais seculares, que manda fazer um mapa com a região incorporada a seu território, que nomeia governador para a província “incorporada”. 

O Brasil precisa dizer claramente que discorda desse tipo de decisão do governo Maduro, criada unicamente para satisfazer o próprio ego ditatorial e se agarrar ao poder perseguindo os adversários. 

O que existe para mediar? A Guiana vai pagar “resgate” para ter seu território de volta? Essa “paz” durará até o próximo ditador reacender o interesse?

O Brasil precisa ter um lado, uma posição clara – que não é de mediar, pois não há o que mediar –, contrária aos interesses de Maduro, entregando a decisão para Corte Internacional, sob pena de trazer problemas à própria consolidação territorial brasileira, reacendendo discussões sobre a Amazônia, sobre autonomia de territórios indígenas e até mesmo nos interesses de vizinhos sobre o nosso território por acordos celebrados no passado. 

Ao “normalizarmos” o interesse de Maduro pela grande Venezuela dos tempos coloniais podemos dar lugar até para a Espanha pleitear o respeito ao Tratado de Tordesilhas. 

Ao tentar imitar uma comédia o péssimo ator Maduro nos apresenta uma tragédia. 

Abdon C. Marinho é advogado. 


(Novo mapa da Venezuela de 2023).