AbdonMarinho - SERIAM OS DEUSES JUÍZES?
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

SERIAM OS DEUSES JUÍZES?

SERIAM OS DEUSES JUÍZES? Há mais de trinta anos li um livro que pos­sui um título inqui­etante – ao menos para minha cabeça ado­les­cente, reli­giosa, cristã –, chamava-​se: “Seriam os deuses astro­nau­tas?”. Ainda hoje diver­sos cien­tis­tas, ufól­o­gos ou ovniol­o­gis­tas sus­ten­tam tal tese. Apon­tam como o grande desen­volvi­mento, quase simultâ­neo de diver­sas civ­i­liza­ções à inter­venção de seres de outro plan­e­tas que por aqui apor­taram. Tal assunto, talvez seja motivo de um texto especí­fico. A refer­ên­cia que faço ao livro é ape­nas para pegar emprestado o título, colo­cando no lugar de astro­nauta a figura de juiz. É rel­e­vante que façamos essa per­gunta. Desde a noite de sábado, 6 de dezem­bro, estampa as manchetes dos meios de comu­ni­cação a infor­mação dando conta que deter­mi­nado juiz, tendo chegado atrasado para o embar­que no aero­porto local­izado na comarca viz­inha à aquela em que atua, deter­mi­nou a prisão dos fun­cionários da com­pan­hia aérea, decerto porque que­ria que estes “segurassem” o avião para sua excelên­cia ou por imag­i­nar – tem doido para tudo – que com a prisão dos servi­dores o avião retornaria. A matéria não deixa claro a razão do decreto de prisão, suas moti­vações ou o que fiz­eram ao juiz a ponto de moti­var a seg­re­gação dos mes­mos, se é que fiz­eram algo. Out­ros pon­tos obscuros care­cem de esclarec­i­men­tos: os servi­dores estavam em situ­ação de fra­grân­cia a ponto de per­mi­tir que qual­quer do povo dar-​lhes a ordem de prisão? Foi nesta condição que o juiz deu-​lhes o “teje preso”? Pode­ria a PMMA acatar uma ordem ile­gal e pro­mover a con­dução dos fun­cionários da com­pan­hia aérea? Pode­ria o juiz, exceto na condição de qual­quer do povo, dec­re­tar prisões fora da área de sua juris­dição? Não estaria violando a figura do juiz nat­ural? A falta de respostas a essas per­gun­tas, talvez tenha lev­ado o mag­istrado a não com­pare­cer per­ante a autori­dade poli­cial para a lavratura da ocor­rên­cia, contentara-​se com o momento de abuso e a sub­me­ter a Justiça brasileira e do Maran­hão a mais esse vex­ame. Não faz muito tempo, gan­hou manchetes o caso de outro juiz. O car­i­oca que proces­sou e gan­hou uma ação con­tra uma agente de trân­sito por conta de uma abor­dagem em cumpri­mento a “Lei Seca”. O mag­istrado, segundo infor­mações difun­di­das, estava com o carro sem placa, não por­tava habil­i­tação e apre­sen­tava sinais que havia bebido. A agente de trân­sito teria dito, após a iden­ti­fi­cação do mesmo que ele seria juiz, não Deus. Por conta disso foi proces­sada e con­de­nada em primeiro e segundo graus da justiça daquele estado a ind­enizar o “ofen­dido”. A Justiça enten­deu que houve desmerec­i­mento a toda a cat­e­go­ria de mag­istra­dos. O caso, ainda em grau de recurso, motivou a pop­u­lação a fazer uma “vaquinha\» para a ind­eniza­ção. Ati­tude que pode e deve se enten­dida como a insat­is­fação social com esse tipo de coisa. Diante da reper­cussão do fato na sociedade o pres­i­dente do Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF e do Con­selho Nacional de Justiça – CNJ, comen­tando o caso, disse que juiz, longe de ser Deus, é um cidadão como outro qual­quer. A sociedade pode até com­preen­der essa ver­dade, difí­cil é fazer alguns deles enten­derem isso. Essa mino­ria, não tenho dúvida que é uma mino­ria, causa danos incal­culáveis a imagem da justiça per­ante a sociedade. Ao tomar con­hec­i­mento do fato ocor­rido na cidade Imper­a­triz, ironizava: dizia que a pressa de sua excelên­cia em pegar o voo era para comem­o­rar, com seus pares, o dia da Justiça, fes­te­jado em 8 de dezem­bro. Estava tão ansioso para comem­o­rar esse dia que aproveitou para come­ter alguns abu­sos e injustiças. Só pode ser. O certo, é que a Justiça brasileira, em que pese ter mel­ho­rado em alguns aspec­tos, ainda deve muito à sociedade. Por onde pas­samos é pos­sível reg­is­trar uma história de abuso, de injustiça, de cor­rupção. Não são raras as vezes em a dis­tân­cia entre o que almeja o cidadão e o remé­dio obtido se mostram tão dís­pares que o certo tem feição de errado e o errado de certo. Em tem­pos de vio­lên­cia e de guerra sem quar­tel, há quase um mantra, repetido, inces­san­te­mente, em todos os quad­rantes do Brasil, tor­nando o Poder Judi­ciário, uma espé­cie de sócio oculto da vio­lên­cia e do crime, que é: a Polí­cia prende e a Justiça solta”. Essa dívida só aumenta quando nos deparamos com fatos como esses, com juízes man­dando pren­der, de forma abu­siva, até onde se sabe, tra­bal­hadores que estavam cumprindo seu dever. Ainda assim, há o que se comem­o­rar no dia da Justiça, senão os feitos pretéri­tos, a esper­ança num futuro mel­hor e mais vir­tu­oso. E, emb­ora, com algo a fes­te­jar, ainda que a esper­ança, a grande parte maio­ria dos mag­istra­dos brasileiros deve ter pas­sado o dia da Justiça, inclu­sive nas solenidades, comen­tando à boca pequena, a prisão abu­siva, dec­re­tada pelo juiz, fora de sua juris­dição, por conta do voo per­dido. A demora dos tri­bunais em punir abu­sos e arbi­trariedades é uma das razões de sofr­erem o con­strang­i­mento que pas­sam vez por outra, como neste caso, que é destaque em quase toda a imprensa nacional. Con­strang­i­mento maior porque sabem que essa não é a primeira vez e não será a última vez que isso acon­tece e porque sabem que casos semel­hantes, e até mais graves, que este, exis­tem com uma fre­quên­cia maior que se imag­ina. Nos meios forenses, vez ou outra, ouve-​se dizer de deter­mi­nado mag­istrado: fulano não pensa que é Deus, ele tem certeza. Mais do que nunca é necessário respon­der a per­gunta: Seriam os deuses juízes? Abdon Mar­inho é advogado.