AbdonMarinho - TOMA LÁ DÁ CÁ POR DECRETO.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

TOMA POR DECRETO.

TOMA POR DECRETO.

Imag­inemos que em um municí­pio dos cafundós do Brasil, o prefeito resolvesse condi­cionar a real­iza­ção de uma obra ou o paga­mento de uma emenda à votação, por parte dos vereadores, de matéria de inter­esse do prefeito. Imag­inemos que o prefeito faça isso para escapar de punição por não ter cumprindo obri­gação legal.

Essa prática está mais enraizada na política brasileira do que podemos aquilatar. A imanes maio­ria dos prefeitos adquirem maio­ria em suas Câmaras graças a “men­sal­in­hos” que pagam aos vereadores e out­ros favores, como empre­gos ou car­gos na estru­tura das prefeituras. Uma reportagem sobre esse assunto foi exibida não faz muito. Muitos que assi­s­ti­ram se escan­dalizaram. O Min­istério Público, segundo soube, abriu os pro­ced­i­men­tos cabíveis para coibir as práti­cas abusivas.

Pois bem, esse com­por­ta­mento, o toma lá dá cá, acaba de ser ofi­cial­izado no Brasil.

O Diário Ofi­cial da União pub­li­cou no último dia 28 de novem­bro o Decreto nº. 8.367. Diga-​se de pas­sagem que o gov­erno fez cir­cu­lar a patranha em uma edição espe­cial do DOU ape­nas para esse propósito: tornar legal o ile­gal, insti­tu­cionalizar a prática do toma lá dá cá, entre os agentes políticos.

Como todos esta­mos cansa­dos de saber, o gov­erno não con­seguirá cumprir, até 31 de dezem­bro de 2014, as metas econômi­cas esta­b­ele­ci­das pela Lei Orça­men­tária Anual — LOA, prin­ci­pal­mente, a parte que esta­b­elece um superávit mín­imo para a amor­ti­za­ção da dívida. Ora, qual­quer pes­soa que se preze tra­balha com plane­ja­mento, no poder público isso não é fac­ul­dade, é exigên­cia. A União, os Esta­dos e os Municí­pios que com­põem a República Fed­er­a­tiva do Brasil, tra­bal­ham com metas, são obri­ga­dos a cumprir e a pub­licar reg­u­la­mente. É o que manda a Lei de Respon­s­abil­i­dade Fis­cal, LC 1012000 e os demais orde­na­men­tos, Lei de Dire­trizes Orça­men­tarias – LDO e Lei Orça­men­taria Anual – LOA.

O gov­erno fed­eral, ao invés de cumprir as leis do país, con­forme jurou solen­e­mente a gov­er­nante máx­ima, por ocasião da posse, pref­ere fazer o cam­inho inverso, busca o atalho, a manobra. Para isso, se vale da maio­ria que pos­sui no Con­gresso Nacional para mudar a lei, reti­rar do seu corpo a obri­gação de equi­li­brar as finanças públi­cas, cumprir as metas fis­cais, a fazer a econo­mia necessária para garan­tir a esta­bil­i­dade do país.

Fazem o con­trário fazendo com que econo­mia brasileira, nos últi­mos anos, seja motivo de escárnio per­ante os mer­ca­dos inter­na­cionais, a prática do “jeit­inho brasileiro”, a con­tabil­i­dade cria­tiva, tem sido usado com tanta fre­quên­cia e despu­dor que tem lev­ado os investi­dores a fugirem do país. Esta­mos nos tor­nando, cada vez mais, o pais da piada pronta.

Para con­seguir fechar as con­tas de 2013 o gov­erno ado­tou a téc­nica de jogar as dívi­das que vence­riam naquele ano e os con­tratos para o ano seguinte. Agora, este ano, nem com isso con­seguiriam fechar as contas.

Diante disso, da real­i­dade, de que nem na marra, con­seguiriam atin­gir as metas, par­ti­ram para solução extrema: a mudança da lei.

A mudança da lei, em si, já rep­re­senta um enorme pre­juízo ao país. A Lei de Respon­s­abil­i­dade Fis­cal foi uma con­quista da sociedade brasileira já cansada de gov­er­nos gas­ta­dores que tor­ravam o fruto do esforço dos tra­bal­hadores ao seu talante, sem obe­de­cer a qual­quer con­t­role, como se o din­heiro público bro­tasse do solo e por isso não tivesse por que ser econ­o­mizado e gasto com parcimô­nia den­tro de um plane­ja­mento transparente.

O gov­erno não com­preende que o descon­t­role das finanças, causa descon­fi­ança e é uns dos ger­adores de inflação que cor­rói as econo­mias dos cidadãos.

Veja o exem­plo: este ano mesmo, pela quarta vez seguida, a inflação ficou acima da meta esta­b­ele­cida. Se por um lado temos impos­tos escor­chantes, por outro temos um gov­erno gas­tando sem freio. Provo­cando, com isso, outro efeito danoso ao cidadão: o aumento da inflação.

O pior de tudo isso é que sabe­mos que os gas­tos que o gov­erno faz, a draga dos recur­sos públi­cos, não são rever­tido em favor da pop­u­lação, servem, em grande parte, para ali­men­tar uma máquina de cor­rupção insaciável, o enriquec­i­mento de poucos.

O gov­erno ao mudar a forma de cál­culo de meta através da lei pro­posta e aprovada pelo Con­gresso Nacional, joga na lata de lixo essa con­quista, cujo danos serão ainda mais graves do con­seguimos perce­ber no momento.

Não bas­tasse a mudança da lei, em se tratando do atual gov­erno, as coisas sem­pre são feitas da pior forma pos­sível. não sat­is­feito ape­nas em prestar o desserviço, o fez insti­tu­cional­izando o toma lá dá cá com o parlamento.

O decreto pub­li­cado em edição extra do DOU, em plena sexta-​feira, trás, no seu artigo 1º, a ele­vação do mon­tante do empenho em mais de 10 bil­hões de reais:

\\\«Art. 1o Os lim­ites de movi­men­tação e empenho con­stantes do Anexo I do Decreto no 8.197, de 20 de fevereiro de 2014, ficam ampli­a­dos no mon­tante de R$ 10.032.697.201,00 (dez bil­hões, trinta e dois mil­hões, seis­cen­tos e noventa e sete mil, duzen­tos e um reais).”

Já o artigo 4º. coloca a condicionante:

\\\«Art. 4o A dis­tribuição e a uti­liza­ção do valor da ampli­ação a que se ref­erem os arts. 1o e 2o deste Decreto ficam condi­cionadas à pub­li­cação da lei resul­tante da aprovação do PLN no 36, de 2014CN, em trami­tação no Con­gresso Nacional.”

Em tempo algum da história do Brasil, o Poder Exec­u­tivo, ousou e usou de tanta des­façatez com o Con­gresso Nacional. Suas excelên­cias, dep­uta­dos e senadores ao votarem a pro­posta apre­sen­tada pelo gov­erno estavam votando o valor que cada um pos­sui e que rece­berão em emen­das par­la­mentares, leg­is­lando, lit­eral­mente, em causa própria, aos olhos da nação.

Existe tanta difer­ença entre essa prática e aquela do prefeito pagar aos vereadores para votarem matérias de seu inter­esse? Autor­izarem mudanças em Planos Dire­tores Munic­i­pais recebendo para isso “agra­dos” con­stru­toras? Autor­izarem lotea­men­tos em áreas de preser­vação ambi­en­tal, recendo “algum” para isso? A resposta – ao meu sen­tir – é não. Trata-​se da mesma coisa.

O mal exem­plo que vem do poder cen­tral não é nefasto ape­nas por mudar a lei para pos­si­bil­i­tar o descon­t­role dos gas­tos, é, sobre­tudo, por abrir o prece­dente de que e líc­ito se ofer­e­cer algo aos par­la­mentares para que votem dessa ou daquela maneira. Qual­quer pes­soa com um mín­imo de bom senso sabe o que isso sig­nifica. Quanto tempo demor­ará para que gov­er­nadores e prefeitos passem a fazer o mesmo? Come­cem a “com­prar” votos de par­la­mentares usando recur­sos públi­cos? Qual será o lim­ite da bandalha?

O gov­erno brasileiro insti­tuiu o bal­cão de negó­cios, não ter­e­mos mais rep­re­sen­tantes do povo, temos sim, par­la­mentares que pas­saram a votar con­forme recebam.

Abdon Mar­inho é advogado.