AbdonMarinho - SAÚDE – UMA EXORTAÇÃO AOS NOVOS GESTORES.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

SAÚDEUMA EXOR­TAÇÃO AOS NOVOS GESTORES.

SAÚDEUMA EXOR­TAÇÃO AOS NOVOS GESTORES.

MINHA afinidade com as causas lig­adas a saúde pública vem desde a cri­ação do Sis­tema Único de Saúde – SUS, no começo dos anos 1990. Aumen­tou quando, no final daquela década prestei serviço ao Municí­pio de Coroatá e, naquela época trava­mos uma briga com o gov­erno estad­ual que se recusava a recon­hecer gestão plena do municí­pio e ser um presta­dor de serviços através do seu hos­pi­tal Mamede Trovão.

Naquela época junto com o econ­o­mista Pedro Jansen Rodrigues Filho – ainda hoje uma das maiores autori­dades no assunto – estu­damos e inter­pre­ta­mos a Lei Orgânica da Saúde (Lei 808090), as NOB’s, as por­tarias; trava­mos con­hec­i­mento com os con­ceitos de gestão plena, comis­sões intergestoras bipar­tite e tri­par­tite e por aí vai.

De lá para cá, vez ou outra somos chama­dos a fazer alguma defesa, fazer algum estudo sobre a questão da saúde. Com base nisso é que, tam­bém, vez ou outra, nos vemos ten­ta­dos a escr­ever sobre o assunto.

O Sis­tema Único de Saúde – SUS do Brasil é um dos mais com­ple­tos e human­iza­dos que existe. Garante, con­forme man­da­mento con­sti­tu­cional, que todo cidadão brasileiro tenha dire­ito a saúde, que seja aten­dido com dig­nidade e respeito, desde um sin­gelo cura­tivo até uma cirur­gia de alta com­plex­i­dade como as são as do cére­bro, do coração, etc.

Se o SUS fosse colo­cado em prática con­forme esta­b­elece a lei e suas nor­mas, cer­ta­mente, o Brasil, tão acos­tu­mado a ficar na rabeira de tudo quanto é fila, estaria bem na frente como exem­plo para tan­tos out­ros países. Infe­liz­mente e para infe­li­ci­dade geral dos brasileiros, ao longo dos anos, os próprios gestores não têm con­tribuído para o apri­mora­mento do sis­tema. Pelo con­trário, parece-​nos, infe­liz­mente, que pouco dis­põem a conhecê-​lo ou não têm inter­esse que o mesmo fun­cione como foi pen­sado pelo legislador.

Vejamos o caso do Maran­hão. E é para isso que faço a exor­tação aos novos gestores.

Desde muito tempo somos sabedores das per­das de recur­sos que o Estado do Maran­hão vem sofrendo. Sem­pre nos debate­mos quanto a isso.

No ano de 2015, par­ticipei de um pro­fundo estudo com um pequeno grupo quando fize­mos um lev­an­ta­mento sobre estas perdas.

Ape­nas para se ter uma ideia, o estado perdeu mais de 500 mil­hões em 2015 e mais de 600 mil­hões em 2016, pro­je­tando uma perda de igual ou supe­rior tamanho para o ano de 2017 e para os anos seguintes. Nem fale­mos nas per­das pretéritas.

Isso ocorre porque o Min­istério da Saúde, em des­obe­diên­cia ao artigo 35 da Lei 8080/​90, faz a alo­cação dos recur­sos com base na série histórica de pro­dução ambu­la­to­r­ial e hos­pi­ta­lar que era uti­lizada antes da cri­ação do SUS e suas nor­mas legais, quando a opera­cional­iza­ção do sis­tema de saúde era de exclu­siva respon­s­abil­i­dade dos INAMPS.

Ora, a lei des­obe­de­cida é clara quanto ao rateio de recursos:

«Art. 35. Para o esta­b­elec­i­mento de val­ores a serem trans­feri­dos a Esta­dos, Dis­trito Fed­eral e Municí­pios, será uti­lizada a com­bi­nação dos seguintes critérios, segundo análise téc­nica de pro­gra­mas e projetos:

I — per­fil demográ­fico da região;

II — per­fil epi­demi­ológico da pop­u­lação a ser coberta;

III — car­ac­terís­ti­cas quan­ti­ta­ti­vas e qual­i­ta­ti­vas da rede de saúde na área;

IV — desem­penho téc­nico, econômico e finan­ceiro no período anterior;

V — níveis de par­tic­i­pação do setor saúde nos orça­men­tos estad­u­ais e municipais;

VI — pre­visão do plano qüin­qüe­nal de inves­ti­men­tos da rede;

VII — ressarci­mento do atendi­mento a serviços presta­dos para out­ras esferas de governo.

§ 1º Metade dos recur­sos des­ti­na­dos a Esta­dos e Municí­pios será dis­tribuída segundo o quo­ciente de sua divisão pelo número de habi­tantes, inde­pen­den­te­mente de qual­quer pro­ced­i­mento prévio”. (pará­grafo revo­gado pela Lei Com­ple­men­tar 1412012).

Veja-​se, que ao invés de reg­u­la­men­tar, revogou-​se o pará­grafo acima.

Em con­se­quên­cia desta dis­torção o Maran­hão recebe – 38,42% de recur­sos em relação a média da per­capta nacional. Isso quer dizer que enquanto esta­dos como Alagoas recebem R$ 224,95; Piauí R$ 227,88; Sergipe R$ 211,37; Per­nam­buco R$ 222,90 por ano para tratar seus pacientes, o Estado do Maran­hão recebe ape­nas R$ 156,00 para tratar os seus. Isso para ficar­mos ape­nas na região nordeste. Se pegar­mos esta­dos como Tocan­tins que recebe R$ 244,69; Acre que recebe R$ 243,35; ou o Rio Grande do Sul que recebe R$ 234,31 as per­das do Maran­hão ficam muito mais expressivas.

Esse estudo já foi apre­sen­tado ao secretário de saúde e foi objeto de um debate na Comis­são de Saúde da Assem­bleia Leg­isla­tiva, através de uma audiên­cia publica.

As autori­dades do Maran­hão pre­cisam se empen­har para bus­car estes recur­sos. Não faz sen­tido que esta­dos como Tocan­tins, Acre ou Rio Grande do Sul rece­bam quase R$ 100,00 a mais que o Maran­hão para tratarem seus pacientes. Não faz sen­tido que em dois anos ten­hamos per­dido mais de um bil­hão de reais que pode­riam ser investi­dos na saúde da nossa pop­u­lação e quando se con­stata a nossa situ­ação diante de outro com­par­a­tivo que é a per capta absurda hoje entre 217 municí­pios maran­henses chegando a se deparar com per cap­tas infe­ri­ores a R$10,00 em mais de 48 municí­pios, sendo opor­tuno destacar o de Araioses que recebe anual­mente R$ 1,90 para garan­tir a 45.000 habi­tantes o atendi­mento de todos os serviços mais com­plexos tais como Hemod­iálises, Car­di­olo­gia, Oncolo­gia, Orto­pe­dia, Trans­plantes etc. que soma­dos ao deslo­ca­mento, hospedagem, ali­men­tação mostra clara­mente que estão sendo con­de­na­dos a enfer­mi­dade crôni­cas até o des­fe­cho final de suas vidas (TFD).

Só achamos a situ­ação do Maran­hão ruim quando não a com­para­mos com a situ­ação dos 217 municí­pios maran­henses. Nos municí­pios, onde ocor­rem as deman­das por atendi­mento, onde o pro­mo­tor ou o juiz, dia sim e no outro tam­bém, noti­fi­cam os prefeitos ou secretários de saúde para que estes garan­tam o atendi­mento do paciente – que tem dire­ito e não pode esperar –, a situ­ação é ver­dadeira­mente calamitosa.

Ape­nas para se ter uma ideia dezenas de municí­pios maran­henses não recebem, sequer, R$ 10, 00 (dez reais)/ano per capita para o atendi­mento de suas pop­u­lações. Como vai aten­der um TFD (Trata­mento Fora do Domi­cilio)? Atende, porque obri­gado – pelo pro­mo­tor, pelo juiz ou por sua con­sciên­cia –, fazendo artifí­cios con­tábeis, tirando daqui ou dali.

Se tomásse­mos como parâmetro a maior per­capta do país, a do Tocan­tins com R$ 244,69, municí­pios como Açailân­dia que rece­beu durante todo o ano de 2016, R$ 3.924.286,29, uma per capita R$ 35,77, rece­be­ria o valor de R$ 26.838.822,62, o que daria uma parcela men­sal R$ 2.238.551,00 (quase o valor anual rece­bido); Afonso Cunha que rece­beu em 2016, R$ 95.656,63, uma per capita de R$ 15,06, teria dire­ito a rece­ber R$ 1.554.026,19, o que daria uma parcela men­sal de R$ 129.502,18 (valor supe­rior ao que rece­beu ao longo do ano); Alto par­naíba que rece­beu R$ 21.622,00 durante aquele ano, o que rep­re­senta um per capita de R$ 1,97 (um absurdo), teria dire­ito na ver­dade a rece­ber R$ 2.680.823.64, uma parcela men­sal de R$ 223.401,97 (quase dez vezes o que rece­beu durante todo o ano); Buritic­upu que rece­beu R$ 6.390.920,88, uma per capita de R$ 90,75, teria dire­ito a R$ 17.230.335,73, o que daria uma parcela men­sal de R$ 1.435.861,31; Caru­ta­pera que rece­beu R$ 5.681.457,11, uma per capita de R$ 25,08, teria dire­ito a rece­ber R$ 5.098.664,45, o que daria uma parcela men­sal de R$ 473.454,75; Gonçalves Dias que rece­beu durante o ano R$ 685.524,05, uma per capita R$ 39,99, teria dire­ito, na ver­dade, a R$ 4.301.405,5, o que daria uma parcela men­sal de R$ 358.450,45; Lagoa do Mato que rece­beu durante todo ano R$ 35.607,60, uma per capita R$ 1,61, teria dire­ito, na ver­dade a rece­ber R$ 2.910.098,17, o que rep­re­sen­taria uma parcela men­sal de R$ 242.508,18; Paço do Lumiar que rece­beu R$ 4.084.622,40, o que rep­re­senta uma per capita de R$ 34,65, teria dire­ito a rece­ber R$ 28.843.323,13, o que daria uma parcela men­sal de R$ 2.403.610,26; Pin­heiro que rece­beu R$ 3.139.341,05, para uma per capita de R$ 38,54, dev­e­ria rece­ber R$ 19.927.064,22, o que daria uma parcela de R$ 1.660.588,68 por mês; Santa Luzia do Paruá rece­beu durante o ano R$ 851.593,41, uma per capita de ape­nas R$ 1,19, dev­e­ria rece­ber R$ 6.034,789,47, o que daria R$ 502.899,12 por mês; Timon que rece­beu R$ 9.512.658,94, o que rep­re­senta uma per capita de R$ 57,69, dev­e­ria ter rece­bido R$ 40.341.795,61 o que daria R$ 3.361.816,30 por mês; Zé Doca que rece­beu R$ 1.744.093,68 uma per capita de R$ 34,53, dev­e­ria rece­ber R$ 12.358.557,83, o que daria R$ 1.029.879,81 por mês.

Esta é a real­i­dade que se repete de A a Z dos municí­pios maran­henses, ape­nas aque­les unidades que rece­beram por uma per capta infe­rior a 10 reais tiveram uma perda de R$ 118.799.907,30.

Faz-​se necessário que os gestores munic­i­pais que sofrem no dia a dia com as questões rela­cionadas à saúde se unam para bus­car a recom­posição de seus tetos, devendo o Estado fomen­tar o processo de habil­i­tação destes municí­pios para gerirem seus próprios recur­sos, inclu­sive estes que estão sob a gestão estadual.

Não é admis­sível que um paciente de Lagoa Grande, por exem­plo, receba uma per capita de R$ 1,61, tenha que se deslo­car até a Sec­re­taria Estad­ual de Saúde para garan­tir o seu atendi­mento, numa situ­ação de hemodiálise.

O que vem acon­te­cendo é que os municí­pios estão “ban­cando” isso com reti­rada de recur­sos de out­ros setores da admin­is­tração, quando na ver­dade dev­e­riam fazer uso do recurso da Média e Alta Com­plex­i­dade (MAC) se estes estivessem sob sua gestão.

Essa situ­ação agravou-​se sub­stan­cial­mente na gestão da sen­hora Roseana Sar­ney, quando houve uma pseudo recom­posição dos tetos. Promessa que não se con­cretizou, esta­b­ele­cendo a situ­ação de anor­mal­i­dade demon­strada acima.

A forma de dis­tribuição dos recur­sos entre os entes fed­er­a­dos, como demon­stramos, tem sido extrema­mente injusta. Emb­ora se almeje o maior valor per capita (Tocan­tins) a situ­ação dos municí­pios é infini­ta­mente pior que a do Maran­hão, uma vez que nen­hum municí­pio recebe a per capita esta­b­ele­cida para o Estado, que é R$ 156,00.

Esta é a situ­ação que pre­cisa ser cor­rigida. O primeiro passo, na nossa opinião, é bus­car junto Min­istério da Saúde a difer­ença para o maior teto pago, e depois recom­por os tetos munic­i­pais através de uma nova Pro­gra­mação Pactu­ada Integrada (PPI).

Enten­demos que esta seria a solução para acabar com o des­fi­nan­cia­mento do sis­tema de saúde do Maran­hão, que esta con­de­nando muitos dos nos­sos irmãos a morte.

Abdon Mar­inho é advogado.