SERÁ QUE O BRASIL TEM JEITO?
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- Criado: Quinta, 01 Dezembro 2016 21:48
- Escrito por Abdon Marinho
SERÁ QUE O BRASIL TEM JEITO?
ASSISTIA a uma reportagem sobre violência no Japão. Pelas tantas recebi a informação de que durante todo o ano de 2015, em todo o país, cinco pessoas foram assassinadas a tiros. No Brasil, ano passado, assassinatos, por armas de fogo ou por armas brancas foram quase 60 mil. Em São Luís, cidade com pouco mais de um milhão de habitantes, em um único dia – e isso se repete quase todos os dias, com mais ênfase nos fins de semana – foram dez assassinatos.
No nosso país, infelizmente, a vida humana não tem qualquer valor, embora seja o bem mais valioso que se tem, vale menos que um tostão furado.
A corrupção é mal que assola o mundo inteiro, em maior ou menor grau, por aqui, tem-se a impressão que ela é endêmica. Vai desde o eleitor que cobra 20 ou 50 reais para votar em determinado candidato aos governantes, que montam máquinas de corrupção de dentro dos palácios e se tornam sócios dos esquemas criminosos que drenam os cofres da nação e com isso matam milhares de brasileiros todos anos. Seja o atendimento médico que não chega, seja as rodovias mal feitas que matam mais que guerras (só no ano passado foram mais de 50 mil mortes em acidentes de trânsito, mais de mil mortos por semana, não são todos, mas grande parte deles, causados pelas péssimas condições das rodovias), seja os entraves econômicos que levam milhares de pais de famílias à falta de expectativa, ao desemprego e ao desespero, seja através de uma educação que mata os sonhos de crianças e jovens um pouco por dia.
Os males do Brasil são inúmeros, mas grande parte deles tem origem no estado altamente corrupto, onde aqueles que não tentam tirar vantagem em tudo são tidos por «otários», onde os políticos fazem fortunas da noite para o dia, no exercício dos mandatos, fazendo advocacia para particulares ou conglomerados econômicos ou simplesmente expropriando o estado com a «venda» de emendas a quem oferecer a maior vantagem (propina); executando eles próprios as obras públicas, diretamente ou através de prepostos.
Os assaltos aos cofres públicos ocorrem em todas as esferas, em todos os níveis. Esta é uma realidade de todos conhecida.
Poucos podem alegar desconhecer isso, ainda que quase ninguém se ocupe de investigar ou punir.
Os dois poderes, legislativo e executivo, em todas as esferas, estão conflagrados pelo lamaçal da corrupção, basta ver os noticiários, poucos, quase ninguém escapa das delações já feitas e das que virão.
A corrupção sempre foi (e ainda é) a força motriz da política brasileira. Agora mesmo, nestas eleições de 2016, com toda vigilância e limitação financeira imposta aos candidatos a prefeitos e vereadores, se tem noticia de campanhas que teriam custado milhões, dois, três, até 10 milhões de reais. Valores que superam, em muito, o valor que o eleito receberá a título de vencimentos. Será que alguém tem alguma dúvida de como essa conta será fechada? Estes valores acima de milhões não se refere apenas aos cargos majoritários, vereadores aqui da capital, segundo dizem, fizeram gastos vultuosos, incompatíveis com o que vão receber ao longo do quadriênio.
Infelizmente, o Brasil possui uma classe política horrorosa, elitista, perdulária e insensível aos problemas da nação, com as honradas exceções de sempre. Mas, para o nosso desgosto maior, foi eleita de forma livre e soberana pelo conjunto do eleitorado.
A sociedade brasileira não deveriam ficar abalada com o comportamento da sua classe política. Nada que vem do parlamento brasileiro deve nos causar estranheza.
O brasileiro enlutado em face da última tragédia, acordou sobressaltado ao saber que o parlamento, mas precisamente a Câmara dos Deputados, apresentou emendas tendentes a modificar de forma substancial um projeto de iniciativa popular, capitaneado pelo Ministério Público, com medidas de combate a corrupção.
A primeira observação que tenho é que os autores das modificações talvez não reunissem as condições morais – legais têm de sobra, posto que eleitos de forma regular e possuem competência legislativa para tal –, para apresentar medidas que, supostamente, os beneficiam.
A segunda observação diz respeito à forma, durante um luto, na «calada da noite», como se diz. Não ficou legal. Ainda que os interesses fossem legítimos, passou-se uma péssima impressão.
Feitas estas ressalvas, entendo que o momento que vivemos, cobra passarmos o país a limpo. E isso envolve todas as instituições republicanas, incluindo aí o Ministério Público e o Poder Judiciário.
Em 20(vinte anos) como advogado me orgulho de dizer que nunca conheci um magistrado ou membro do Ministério Público corrupto. Não conheço porque nunca nenhum me pediu qualquer vantagem ou teve de minha parte qualquer oferta. Vou além, tenho certeza que a larga maioria é formada por servidores sérios e dedicados ao seu ministério. Entretanto, segundo dizem, estas instituições, como todas as outras, não estão livres e têm dentre seus membros pessoas sem compromisso, corruptas, que agem por motivações subalternas.
Infelizmente, essa minoria – que, ainda, segundo o que se ouve aqui e ali – não é tão insignificante assim, precisa de balizas legais a impedir abusos contra o conjunto da sociedade.
Não se trata, aqui, de querer proteger o político bandido, ladrão do dinheiro público, mas o cidadão comum, que diferente dos políticos não tem qualquer proteção.
Nós, brasileiros, temos o péssimo hábito de enxergarmos o mundo em preto e branco. De compararmos.
Assim, se comparamos qualquer segmento com a classe política, temos a impressão que os primeiros são anjos e os segundos demônios. Mas não é bem assim. Se analisarmos individualmente acabamos por perceber que as mazelas contaminam todas as instituições brasileiras.
Se me perguntarem se a classe política (Congresso Nacional) agiu ou age motivado por interesses mesquinhos de retaliação, contra o Ministério Público e o Judiciário. Não tenho dúvidas que sim. Diante dos fatos revelados até o momento, literalmente, legislaram em causa própria. Prova maior disso foi o açodamento do presidente do Senado – e do Congresso –, em querer o aprovar as alterações feitas pela Câmara dos Deputados de afogadilho, sem qualquer discursão maior com os demais senadores ou com a sociedade.
Noutra quadra, como dito acima, entendo que precisamos de balizas claras de respeito ao direito dos cidadãos nas atuações do Ministério Público e do Judiciário.
E isso, em benefício das próprias instituições, que têm pessoas sérias confundidas com os muitos malfeitores que lá estão enfronhados. Justiça é coisa séria, não sendo aceitável que se tire o direito de um para dar a outro por qualquer motivo, muito menos em troca de vantagens pecuniárias; ou que manda soltar traficantes presos em flagrante ou criminosos de outros matizes pelo mesmo motivo.
Quando analisamos o fato de alguém investido de relevantes funções públicas com poderes sobre a vida é liberdade dos cidadãos cometer abusos por motivações financeiras, políticas ou de cunho ideológico, chega a ser acintoso que receba como penalidade máxima uma aposentadoria compulsória com vencimentos integrais.
A «punição», na verdade, nada mais é que um prêmio ao crime. Quando assisto esse tipo de coisa, penso: o crime compensa no Brasil. Basta ver quantos foram afastados nestas condições cujo os processos, noutras esferas, nunca deram em nada. Garantias, sim, abusos, privilégios, não.
As coisas estão de forma fora de ordem no país, que as pessoas passaram a confundir as coisas, não conseguem separar o que é garantia para que preste seu serviço com dignidade à sociedade e o que se reveste de abuso, privilégio e tratamento que os torna acima dos demais cidadãos.
Faz-se necessário, sim, corrigir esse tipo de coisa.
O Brasil precisa passar por uma profunda reforma que acabe com estes e com tantos outros privilégios, seguir estritamente o mandamento constitucional, insculpido no caput do artigo 5º: «Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade…».
Foge a minha compreensão a ideia que possamos ter «castas» que brigando para ficar acima da lei. Não meus senhores, a lei submete a todos. Se a lei não submeter a todos, certamente, o Brasil não terá jeito.
Abdon Marinho é advogado.