AbdonMarinho - MAIORIDADE PENAL: AS FALSAS POLÊMICAS.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sexta-​feira, 19 de Abril de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

MAIOR­I­DADE PENAL: AS FAL­SAS POLÊMICAS.

MAIOR­I­DADE PENAL: AS FAL­SAS POLÊMI­CAS.
O Con­gresso Nacional começou a dis­cu­tir a questão da maior­i­dade penal. O tema sequer mere­ce­ria maiores inda­gações se não fosse a «ide­ol­o­giza­ção» e a carga emo­cional que emprestam ao assunto.
As últi­mas pesquisas rev­e­lam que 87% (oitenta e sete por cento) da pop­u­lação brasileira acha que deve ser reduzida a maior­i­dade penal para 16 anos. Os 13% (treze por cento) da pop­u­lação acha que deve deixar as coisas como estão.
Já faz algum tempo que tenho dis­cu­tido pub­li­ca­mente esse assunto, colocando-​me a favor da larga maio­ria que defende a redução. Meu posi­ciona­mento vai até além da redução para os 16 anos. Meu entendi­mento é que dev­e­ria ser apli­cada a redução da maior­i­dade pela natureza do crime, alcançando a todos com mais de 12 anos com capaci­dade para dis­cernir.
Tenho maior respeito pelas pes­soas que pen­sam difer­ente e que acham que todos menores de 18 anos devem ser trata­dos como inca­pazes de dis­cernir e de respon­der pelos seus anos, tanto que alin­harei abaixo alguns dos seus argu­men­tos. Deixarei de dis­cu­tir a questão da con­sti­tu­cional­i­dade uma vez que nunca mais ou ouvir sus­ten­tar que o tema estaria proibido de dis­cussão por se tratar de cláusula pétrea, e, por­tanto, imutável. Parece-​me que desi­s­ti­ram deste argu­mento tão fala­cioso quanto falso.
Na defesa, con­tra a redução, dizem que menos de 1% (um por cento) dos crimes tidos por hedion­dos são cometi­dos por menores entre 18 e 16 anos.
Pegue­mos o exem­plo do homicí­dio. Ano pas­sado tive­mos cerca de 56 mil homicí­dios. Um por cento cor­re­spon­de­ria 56 homicí­dios. Pelo argu­mento dos que são con­tra a redução, essas 56 pes­soas que perderam vida são meras estatís­ti­cas, não dev­e­riam con­tar. Aquela moça que foi assas­si­nada pelo namorado pou­cas horas antes dele com­ple­tar os 18 anos, o aquele rapaz que chegava do trabalho/​escola e foi assas­si­nado na porta de casa e tan­tos out­ros, são um «nada estatís­tico», suas vidas nada valiam, os son­hos, o futuro, nada rep­re­sen­taram. Acred­ito que isso não é certo. Cada vida vale, para os seus pais, irmãos, ami­gos. Quer dizer que a vida do mata­dor vale mais que a vida da vítima? Defende-​se sua inim­putabil­i­dade, o cumpri­mento de medida socioe­d­uca­tiva de pouco tempo e logo pode sair e con­tin­uar matando. Muitas das vezes, fazendo out­ras víti­mas fatais, antes de com­ple­tar maior­i­dade legal. Quan­tos não chegam a dita maior­i­dade, com mais de uma dezena de crimes?
Faço uma argu­men­tação oposta: se são tão poucos, por que não punir para que sir­vam de exem­plo e deses­tim­ule out­ros?
Tomemos outro exem­plo de crime hediondo: o estupro. São mil­hares todos anos, com con­se­quên­cias per­ma­nentes para víti­mas. Ainda que um por cento rep­re­sen­tasse, um, dois, uma dezena, deve a vítima sim­ples­mente se con­for­mar com a vio­lên­cia? Aceitar que é ape­nas uma que mere­ceu ser vio­lada, humil­hada, mal­tratada? Um dos casos de maior reper­cussão no Brasil, foi o do menor apel­i­dado de Champ­inha, ele, com 16 anos, coman­dou um bando de facíno­ras que matou um casal de namora­dos, primeiro o rapaz, depois a moça, depois de estuprá-​la seguidas vezes, por dois ou três dias. Só con­tinua inter­nado até hoje dev­ido a mobi­liza­ção da sociedade e dos famil­iares das víti­mas, senão estaria solto, matando, estuprando.
Uma vez ouvi de uma mãe de vitima o seguinte sobre a mãe do mata­dor do seu filho: – Ela poderá visitá-​lo na cadeia; poderá falar com ele, abraçá-​lo, sen­tir seu cheiro. Eu nunca mais falarei com o meu; nunca mais poderei abraçá-​lo, tê-​lo em meus braços. Nunca mais sen­tirei o cheiro de meu filho.
Uma dor dessa não pode ser con­sid­er­ada ape­nas uma estatís­tica desprezível. Pior é quando sabem que nada acon­te­cerá ao autor do fato por ser menor.
Um outro argu­mento e que mais acho dos mais curiosos é o famoso NÃO RESOLVE. Esse argu­mento, aliás, usado pela Sra. Dilma Roussef e por tan­tos out­ros, é de uma bison­hice atroz. Como reduzir a maior­i­dade «não resolve», por que não deixar «os meni­nos», con­tin­uarem matando? É isso?
Poder-​se-​ia dizer que a cor­rupção no Brasil existe desde que o mundo é mundo e eu não me chamo Raimundo. Como punir os cor­rup­tos não resolve, pois para cada um que é preso surgem dois ou mais deve­mos deixar imperar a roubal­heira? É assim? Claro que o sim­ples ato de reduzir a maior­i­dade penal não resolve, mesmo porque, como dizem (pre­cisamos apu­rar se é ver­dade ou não), ape­nas um por cento dos crimes hedion­dos são cometi­dos pelos que serão alcança­dos pela nova regra.
O que se quer com a medida é inibir o crime prat­i­cado por esses jovens, é fazer com que saibam que o crime terá um cas­tigo, uma con­se­quên­cia, é acabar com situ­ação de impunidade, é pôr fim a ver­gonha de se ter de dizer a um pai ou a uma mãe que o seu filho foi bru­tal­mente assas­si­nado não ficará impune.
Outro argu­mento: mais esco­las, menos cadeia. Trata-​se de uma tolice colo­car essas duas coisas como se fos­sem antagôni­cas, prin­ci­pal­mente se ditas por gov­er­nantes. O Brasil pre­cisa das duas coisas: mais esco­las e mais cadeias. Pre­cisamos de esco­las de qual­i­dade e cadeias com mais qual­i­dade para garan­tir ao encar­cer­ado o cumpri­mento inte­gral de sua pena com as garan­tias que lhe são asse­gu­rada em lei e nos trata­dos inter­na­cionais. Este argu­mento vem com outra velha des­culpa, o de que não podemos (nós sociedade) exi­gir que os pre­sos cumpram suas penas pois o sis­tema carcerário é pavoroso. O próprio min­istério da justiça já fez uso do argu­mento, quando na ver­dade, como dev­e­ria ser de suas respon­s­abil­i­dade, orga­ni­zar um sis­tema carcerário em ele não fosse obri­gado a dizer preferir a morte a cumprir pena no Brasil.
O país pre­cisa romper com o tabu que não se deve inve­stir em presí­dios. Deve se inve­stir e se não tiver din­heiro que se admita, como em out­ros países, a pri­va­ti­za­ção do sis­tema.
Inve­stir em presí­dios e em esco­las, não são coisas antagôni­cas como vem sendo tratado. Vejo muita gente boa advo­gando o argu­mento que toda a crim­i­nal­i­dade é fruto sis­tema injusto ou da pobreza. Isso não é ver­dade. Tanto não é que a maio­ria da pop­u­lação brasileira é com­posta de pes­soas de bem. A crim­i­nal­i­dade con­tin­uaria a exi­s­tir ainda que todas as esco­las brasileiras fos­sem padrão FIFA.
Outro argu­mento é que não se pode colo­car «cri­anças nas prisões de adul­tos». Basta aplicar a lei. Ao invés de fazer cam­panha con­tra deve se exi­gir que Estado garanta o cumpri­mento das penas, todas elas, com as indi­vid­u­al­iza­ções esta­b­ele­ci­das na Lei de Exe­cuções Penais.
Outro argu­mento na linha do deixa como está ou eu lavo min­has mãos: caso se reduza a maior­i­dade os crim­i­nosos vão ali­ciar out­ros jovens, com menos de 16 anos. É um argu­mento covarde pois milita no sen­tido de dizer: deixem enveredar pelo crime pela janela da impunidade ape­nas a faixa de 1618 anos. Acon­tece que os ban­di­dos já estão fazendo isso. Cada vez mais jovens enveredam pelo crime e cada vez mais jovens. A solução não é «lib­erar» esses jovens ao crime, como querem os ilu­mi­na­dos, e sim reprimir, apli­cando penas mais duras aos crim­i­nosos maiores que usam ado­les­centes nas ativi­dades crim­i­nosas e até mesmo punindo esses menores.
Mais um argu­mento: o jovem vira delin­quente porque o país não tem uma política para a juven­tude. É ver­dade que as políti­cas de pro­moção da juven­tude são defi­cientes. Mas esse é um argu­mento que milita em sen­tido con­trário. Primeiro que foram piores as políti­cas e número de jovens delin­quentes bem menor. Segundo porque se isso fosse deter­mi­nante o número de crim­i­nosos juve­nis seriam bem maior.
Mais argu­mento argu­mento? Voltare­mos ao tema.
O certo é que a política crim­i­nal brasileira, inclu­sive essa de tratar crim­i­nosos juve­nis ou não como víti­mas do «sis­tema», só tem con­tribuído para o aumento da vio­lên­cia e para tornar o país cada vez mais inse­guro.
Abdon Mar­inho é advogado.