AbdonMarinho - UM SILÊNCIO CONSTRANGEDOR.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Terça-​feira, 16 de Abril de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

UM SILÊN­CIO CONSTRANGEDOR.

UM SILÊN­CIO CONSTRANGEDOR.

Logo no ini­cio do ano, se não me falha a memória, em março, o dep­utado fed­eral Hildo Rocha (PMDB/​MA), em pro­nun­ci­a­mento na tri­buna da Câmara dos Dep­uta­dos acu­sou o Tri­bunal Regional Eleitoral do Maran­hão de nego­ciar decisões em proces­sos de cas­sação de políti­cos, tirando o dire­ito de quem tinha para dar a quem não tinha. Assev­er­ava que aquela corte agia como autên­tico bal­cão de negócios.

Naquela opor­tu­nidade, escrevi um texto inti­t­u­lado “O silên­cio é a pior resposta”, onde cobrava uma posição do tri­bunal no sen­tido de apu­rar a denun­cia do dep­utado, afi­nal tratava-​se de um rep­re­sen­tante do povo acu­sando uma corte de corrupção.

O tempo encarregou-​se de colo­car o assunto no esquec­i­mento. O tri­bunal, ao que soube, ainda encam­in­hou uma solic­i­tação de apu­ração da denún­cia à Polí­cia Federal.

Se apu­raram ou apu­ram, o resul­tado ficou e per­manece mais guardado que cabelo de freira, ninguém viu.

O dito pelo não dito trata-​se de uma prática infame que ao invés de deixar livre de quais­quer sus­peitas os inocentes, joga todos na vala comum da sus­peição. É a pior das soluções tanto por não punir os que, por ven­tura, ten­ham se desvi­ado, como por estim­u­lar que out­ros façam o mesmo. E tam­bém por igualar cor­rup­tos aos homens de bem.

Como – ao menos pub­li­ca­mente – não houve um protesto vee­mente, um pedido de expli­cações, rep­re­sen­tações à cor­rege­do­ria da Câmara dos Dep­uta­dos solic­i­tando apu­ração do fato, estimulou-​se que out­ras acusações, no mesmo sen­tido, descabidas ou não, fos­sem feitas.

Foi o que acon­te­ceu com o dep­utado estad­ual Fer­nando Fur­tado do PC do B.

No dis­curso já céle­bre pro­ferido no Municí­pio de São João do Caru, onde ata­cou a FUNAI, INCRA, Igreja Católica, Justiça Fed­eral, Par­tido dos Tra­bal­hadores — PT e no qual chamou chamou os indí­ge­nas de “vead­in­hos» – ainda hoje tento enten­der o que o nobre par­la­men­tar tem a ver com o quê, indí­ge­nas, bran­cos, negros ou amare­los, fazem na sua intim­i­dade –, aproveitou para acusar cole­gas do par­la­mento estad­ual e os mag­istra­dos do Tri­bunal de Justiça do Maran­hão de práti­cas pouco recomendáveis às suas atribuições.

Segundo li o par­la­men­tar comu­nista teria afir­mado: “Eu fiz o meu pro­nun­ci­a­mento inco­modando alguns dep­uta­dos que têm trân­sito no Tri­bunal e fazem nego­ci­atas, para poder voltar prefeitos com R$ 100 mil e R$ 200 mil, em posto de gasolina. Porque eu fui pas­sar uma noite de domingo em um posto de gasolina em São Luís para fla­grar uma nego­ci­ata dessas com um genro de um desem­bar­gador. Eu estava lá de madru­gada, vendo tudo. Porque podem fazer comigo duas coisas: ou eu perder o mandato ou eles me matarem. Agora, eu não vou me calar”.

Sob qual­quer ângulo que se exam­ine, as palavras do dep­utado são revesti­das de gravi­dade ímpar: primeiro por acusar seus cole­gas dep­uta­dos de faz­erem nego­ci­atas den­tro do TJMA (quais dep­uta­dos? com quem são feitas as nego­ci­atas? desem­bar­gadores? asses­sores? lobis­tas?); segundo, que as tais “nego­ci­atas» foram feitas para voltar prefeitos afas­ta­dos pela Justiça (quais prefeitos pagaram entre R$ 100 e R$ 200 mil para voltarem? O din­heiro veio de onde? Dos cofres públi­cos?); ter­ceiro, o próprio par­la­men­tar afirma ser teste­munha ocu­lar de tal fato, tendo ficado uma noite inteira de cam­pana ocasião em que viu um genro de desem­bar­gador neste tipo de nego­ci­ata (por que não chamou a polí­cia para pren­der os envolvi­dos em fla­grante? Por que não fez uma rep­re­sen­tação à cor­rege­do­ria? Por que não rep­re­sen­tou à cor­rege­do­ria da ALEMA?).

Todas as con­du­tas nar­radas – inclu­sive a do próprio nar­rador, ao se omi­tir das providên­cias que lhe cabia enquanto servi­dor público para todos os efeitos –, con­stituem crimes, con­stam do Código Penal Brasileiro.

Ainda que não fos­sem con­du­tas crim­i­nosas, não restam dúvi­das que ultra­pas­sam quais­quer lim­ites de decoro.

Os par­la­men­tos cos­tu­mam fazer «vis­tas grossas» às con­du­tas de seus mem­bros. Enten­dem que nunca ultra­pas­sam as pre­rrog­a­ti­vas do cargo. Rara­mente alguma inves­ti­gação sobre que­bra de decoro resulta em cen­sura ou outra punição ao infrator. Isso acon­tece em todo canto.

Desde que os primeiros tre­chos do pro­nun­ci­a­mento do par­la­men­tar veio a público que era de se esperar algum pro­nun­ci­a­mento da Assem­bleia Leg­isla­tiva sobre o fato. Até onde sei, ninguém disse nada.

Acham nor­mal um par­la­men­tar afir­mar que cole­gas fazem inter­me­di­ação de decisões judi­ci­ais? Acham nor­mal que par­la­men­tar faça cam­pana e com­prove tal e sobre ela silen­cie? Acham nor­mal que fazer silên­cio sobre isso? Querem que a sociedade ten­ham como nor­mal que dep­uta­dos se ocu­pem de nego­ciar decisões judi­ci­ais? Que decisões judi­ci­ais sejam nego­ci­adas por R$ 100 ou R$ 200 mil ou por qual­quer valor?

Se da ALEMA não se pode esperar muita coisa com relação apu­ração de fatos de tamanha gravi­dade o mesmo não dev­eríamos esperar do TJMA – mais ata­cado pelas palavras do par­la­men­tar que o próprio parlamento.

Diante das palavras do dep­utado, o TJMA con­seguiu ser menos efi­caz que par­la­mento. Segundo uma emis­sora de TV, o tri­bunal se man­i­festou para dizer que não iria se «man­i­fes­tar» uma vez que o dep­utado não dec­li­nara os nomes dos vendil­hões de decisões. Agiu como o cidadão que com­parece ao local para dizer que não vai com­pare­cer. Mel­hor teria feito se tivesse feito ouvi­dos moucos.

Ora, ao tri­bunal, caberia (e ainda cabe), ao menos inter­pelar o par­la­men­tar para que ele decline o nome dos envolvi­dos nas nego­ci­atas que ele afirma ter teste­munhado na madru­gada, enquanto fazia cam­pana. Ou, ainda, que solic­i­tasse a autori­dade poli­cial a aber­tura de inquérito para apu­rar o que foi dito. Ou, desafiá-​lo para provar as acusações lançadas.

O silên­cio do tri­bunal não serve a ninguém, muito menos ao seus mem­bros, que ficam, todos, sob o manto da sus­peição. Cul­pa­dos (se hou­ver) e inocentes estão todos enlamea­dos pelas palavras do dep­utado, em face do silên­cio do tri­bunal. Tal com­por­ta­mento é injusto com as pes­soas sérias, de boa índole e cumpri­do­ras de suas obri­gações funcionais.

As graves acusações estão estam­padas em todos os veícu­los de comu­ni­cação, as autori­dades e enti­dades envolvi­das – a Assem­bleia Leg­isla­tiva, o Tri­bunal de Justiça, o Min­istério Público Estad­ual, a Asso­ci­ação de Mag­istra­dos e até a Ordem dos Advo­ga­dos do Brasil –, não podem fin­gir que não viram, que nada foi dito, que não foi com eles, e quedarem-​se inertes.

Estas insti­tu­ições, ao se furtarem de respon­der ou de esclare­cer o real sen­tido das palavras do dep­utado Fur­tado, estão dizendo que ele está certo e que suas afir­mações são expressões da verdade.

As palavras ditas, são claras, em dema­sia, para admi­tir quais­quer tipos meios – ter­mos ou de com­por­tar o silên­cio como resposta.

A sociedade, a pat­uleia pagadora de impos­tos, tem, sim, o dire­ito de saber se estão todos de acordo com elas.

Ape­nas isso.

Abdon Mar­inho é advogado.