AbdonMarinho - ATÉ TU, Ó SUPREMO?
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Terça-​feira, 16 de Abril de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

ATÉ TU, Ó SUPREMO?

A TU, Ó SUPREMO?
UM fato pro­saico talvez sirva para dimen­sionar o prestí­gio da Corte Suprema do Brasil per­ante a sociedade de juris­di­ciona­dos.
Por estes dias aquela digna Corte decidiu “trans­ferir» o feri­ado do servi­dor público, que caiu no sábado, 28 de out­ubro, para o dia 03 de novem­bro, sexta-​feira e garan­tir aos ilus­tres mem­bros do Poder Judi­ciário um feri­ado pro­lon­gado, que cer­ta­mente terá ini­cio já na terça-​feira, dia 1º novem­bro, por conta da Lei nº. 5.010÷66, art. 62, IV, que esta­b­elece os feri­ados na Justiça Fed­eral e Tri­bunais Supe­ri­ores.
Ora, como é comum que façam, pode­riam, sim­ples­mente ter dec­re­tado ponto fac­ul­ta­tivo na corte na sexta-​feira, 03, o que cau­sou estran­hamento à pat­uleia foi a “trans­fer­ên­cia» do feri­ado. Mesmo porque, salvo um ou outro servi­dor ou plan­ton­istas, a Justiça não fun­ciona aos sába­dos, não fazendo sen­tido, à quiça de se fes­te­jar o Dia do Servi­dor, o deslo­ca­mento da data, sobre­tudo, quando a sem­ana, para o Poder Judi­ciário, já estará prati­ca­mente “per­dida”.
Para a imagem da Corte, causaria menos estrago, se não tivessem arran­jado uma jus­ti­fica­tiva, pra lá de esfar­ra­pada, para jus­ti­ficar o não fun­ciona­mento dos órgãos da justiça – pois o efeito cas­cata, foi ime­di­ato –, em plena sexta-​feita.
Antes, fatos como este mobi­lizava ape­nas a comu­nidade jurídica, os advo­ga­dos, prin­ci­pal­mente, o excesso, em se deslo­car um feri­ado, pro­tag­on­i­zado pela maior instân­cia da justiça brasileira, cau­sou escân­dalo para toda a sociedade. Até mesmo os pro­gra­mas matuti­nos e ves­per­ti­nos de rádio, deram destaque ao “feri­ado fora de época” dos sen­hores min­istros. E olhem que nem sabiam que o feri­adão começa, efe­ti­va­mente, na quarta-​feira.
O que se passa com aquela Corte? Será que para ela o tempo só pas­sou para a degradação dos cos­tumes, mas não em relação à desconexão com a sociedade e a real­i­dade do país?
Outro dia um his­to­ri­ador se deu ao tra­balho de inves­ti­gar o des­tino do orça­mento da Corte. Com­pro­vou: São mil­hões e mil­hões de reais gas­tos com mor­do­mias, com pen­duri­cal­hos, mimos, umas coisas que tor­nam suas excelên­cias autên­ti­cos mara­jás, tais como aque­les da Índia de sécu­los pretéri­tos.
Situ­ações absur­da­mente dis­so­ci­adas da real­i­dade nacional, incom­patíveis com a Con­sti­tu­ição da República, a qual têm a mis­são de guardar, con­forme se extrai do artigo 102: «Com­pete ao Supremo Tri­bunal Fed­eral, pre­cipua­mente, a guarda da Con­sti­tu­ição…”.
Esta mesma Carta Magna, esta­b­elece que todos são iguais per­ante a mesma e as leis, não admitindo dis­tinção de qual­quer natureza, artigo 5º: “Todos são iguais per­ante a lei, sem dis­tinção de qual­quer natureza, garantindo-​se aos brasileiros e aos estrangeiros res­i­dentes no País a invi­o­la­bil­i­dade do dire­ito à vida, à liber­dade, à igual­dade, à segu­rança e à pro­priedade, nos ter­mos seguintes:..”.
Ora, por mais “exaus­tivo» que seja o tra­balho de suas excelên­cias, não tenho dúvi­das que gozam de van­ta­gens e defer­ên­cias incom­patíveis com a real­i­dade dos demais tra­bal­hadores, o que, ainda, indi­re­ta­mente, é uma «dis­tinção”, a começar, ape­nas para citar um exem­plo, com férias de 60 (sessenta) dias por ano.
E ainda acham pouco? Que outro tra­bal­hador brasileiro, mesmo aque­les que exe­cu­tam as tare­fas mais penosas, tem tal e tan­tas out­ras van­ta­gens?
Pois bem, se por um lado “habitam» o Olimpo das pom­pas que lhes con­ferem a dig­nidade da função de Estado, por outro descem aos infer­nos das brigas de rua e mis­tu­ram ao que há de pior na falta de boas maneiras.
Nunca um dito pop­u­lar foi tão apro­pri­ado a nossa Suprema Corte quanto aquele que diz: “Uma cor­rente será tão forte quanto o seu elo mais fraco”, cujo o autor não lem­bro.
Quem pode­ria imag­i­nar que um evento com min­istros de tão ele­vada Corte fosse recep­cionado com pop­u­lares jogando tomates?
Não duvido se amanhã os próprios min­istros sejam os alvos de tais tomates ou de out­ras coisas.
Trata-​se de um fato gravís­simo, acred­ito que inédito. E é a con­se­quên­cia mais elo­quente do desprestí­gio da Corte per­ante os seus juris­di­ciona­dos.
Ainda que tenha sido orquestrado por alguém que teve algum inter­esse con­trari­ado, não há como ocul­tar que os acon­tec­i­men­tos dos últi­mos tem­pos, têm atraído estas e out­ras insat­is­fações da sociedade em relação ao STF.
Como chag­amos a tão estranha situ­ação? Impos­sível iden­ti­ficar uma causa única.
As razões são muitas.
Uma das lições her­dadas de meu pai – que era anal­fa­beto de pai, mãe e parteira – foi que se quisésse­mos respeito dos out­ros teríamos de nos respeitar antes.
Está aí o seg­redo, não podemos cobrar o respeito dos out­ros se nós mes­mos não nos respeita­mos.
O que acon­tece com Supremo Tri­bunal Fed­eral é que as ações de seus mem­bros, as sus­peitas de favorec­i­men­tos, as ilações de ben­e­fi­ci­a­men­tos inde­v­i­dos, favores pes­soais de agentes públi­cos e mes­mos ter­ceiros, favorece ao desre­speito.
Isso tudo, sem con­tar que já vem de lon­gas datas o fato do Pleno do Supremo Tri­bunal Fed­eral, ter deix­ado de ser um ambi­ente de respeito mútuo e de dis­cussões de teses jurídi­cas e a sua mel­hor apli­cação em ben­efi­cio da sociedade, para se tornar uma espé­cie de «ringue de vaidades” e de inter­esses mesquin­hos, onde as agressões pes­soais – gravís­si­mas –, são des­feri­das por uns con­tra os out­ros sem quais­quer con­strag­i­men­tos.
Cer­ta­mente os mole­ques que se “pegam” nas ruas para tirar suas difer­enças no “braço”, não ficam devendo, em nada, muitas vezes, ao com­por­ta­mento de suas excelên­cias. Estes, como o próprio nome faz crê, se “pegam” nas ruas, respei­tando o recesso de cer­tos ambi­entes.
Como é pos­sível que a sociedade acred­ite e con­fie numa corte cujo seus inte­grantes são imputa­dos mutu­a­mente a prática de crimes diver­sos, como vimos outro dia acon­te­cer no céle­bre e ver­gonhoso bate-​boca entre os min­istros Roberto Bar­roso e Gilmar Mendes?
Além da falta de respeito mútuo, pro­fa­naram o prin­ci­pal ambi­ente da Justiça brasileira, não lhes val­endo, sequer, os ape­los feitos, em um fiapo de voz, pela ministra-​presidente.
Ali foram imputadas con­du­tas crim­i­nosas. O que um min­istro disse do outro foi que eles teriam prat­i­ca­dos crimes. Crimes con­tra a sociedade, con­tra os que con­fiam na Justiça.
Algo impen­sável, mas que não terá qual­quer con­se­quên­cia que não seja esta que esta­mos assistindo: o despres­ti­gio da Corte per­ante a sociedade.
Em vários canais de comu­ni­cação, como se estivésse­mos em rinque de MMA, UFC – não sei como chamam –, vi a for­mação de tor­ci­das: min­istro fulano colo­cou o min­istro sicrano no seu lugar; min­istro bel­trano “descati­tou» com sicrano, e por aí vai, como se fos­sem tor­ci­das orga­ni­zadas destes ou daque­les.
Meus sen­hores, o STF não é ringue, não assistíamos a uma luta de boxe ou uma par­tida de fute­bol, infe­liz­mente. Está­va­mos, sim, diante de um jul­ga­mento da mais ele­vada Corte do país.
Mesmo oper­adores do dire­ito ou agentes políti­cos e soci­ais, com papel rel­e­vante per­ante a comu­nidade, pare­ce­ram não perce­ber a gravi­dade da situ­ação, se per­fi­lando como “torce­dores” de um e de outro, quando, na ver­dade, está­va­mos numa casa onde falta pão, na qual todos gri­tam e nen­hum tem razão.
Emb­ora já tivésse­mos tido a opor­tu­nidade de assi­s­tir a espetácu­los igual­mente depri­mentes e grotesco, tenho a impressão que este último ultra­pas­sou as fron­teiras do aceitável e, numa situ­ação extrema, per­mi­tiria que qual­quer do povo, con­forme manda a lei, desse ordem de prisão aos con­tendores em fla­grante delito.
Infe­liz­mente, mais que a eles próprios, que, não duvido, são acu­sa­dos jus­ta­mente, as agressões ofen­dem a dig­nidade Corte como um todo.
Por onde passo, nas sus­ten­tações que faço, cos­tumo dizer que os tri­bunais são as der­radeiras trincheiras da cidada­nia. O que assis­ti­mos, não sem nos estar­recer, é que esta trincheira está mais vul­nerável que nunca.
E sem ela, que Deus tenha piedade de nós.
Abdon Mar­inho é advogado.

Comen­tários

0 #1 Gutem­berg Silva Brag 30-​10-​2017 09:53
Parabéns Dr.Abdon Maran­inho pelo excelênte comentários.
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