AbdonMarinho - O FIM DE UMA FARSA
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Quinta-​feira, 18 de Abril de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

O FIM DE UMA FARSA

O FIM DE UMA FARSA.
QUANDO me inda­gavam quais momen­tos da história política recente brasileira mais me emo­cionaram respon­dia respei­tando a ordem cronológ­ica:
A eleição de Tan­credo Neves no Colé­gio Eleitoral. Ainda cri­ança acom­pan­hei a cam­panha pelas dire­tas, teste­munhei o sen­ti­mento de frus­tração pela rejeição da emenda Dante de Oliveira, pelo Con­gresso Nacional. A eleição de Tan­credo Neves, logo naquele iní­cio de 1985, foi uma espé­cie de com­pen­sação pela frus­tração exper­i­men­tada no ano ante­rior. O primeiro pres­i­dente civil depois do Régime Mil­i­tar ini­ci­ado em 1964. Era/​foi algo mágico. Acom­pan­hando voto a voto, não foi pos­sível con­ter a emoção durante a procla­mação do resul­tado e, logo depois, durante seu primeiro dis­curso.
Um segundo momento emblemático foi aquele com­preen­dido entre a madru­gada de 15 de março e o 21 de abril de 1985, a doença, a ago­nia e morte de Tan­credo Neves. As esper­anças se arrefe­ce­ram, iríamos para um gov­erno de José Sar­ney, líder civil do régime dos generais-​presidentes.
Um ter­ceiro momento de rara emoção foi a pro­mul­gação da Con­sti­tu­ição de 1988. Já naquela tarde de 5 de out­ubro sabíamos que não tín­hamos a Con­sti­tu­ição per­feita e, sim, a que era pos­sível diante da con­jun­tura que vivia o país. O próprio Ulysses Guimarães, pres­i­dente da Assem­bleia Nacional Con­sti­tu­inte, disse isso no seu dis­curso. Ainda assim, para nós, cidadãos, aquele momento tinha um sig­nifi­cado espe­cial. Era o fim de um ciclo. Imag­iná­va­mos que um novo país iria sur­gir a par­tir daquele dia.
Outro momento sin­gu­lar e, tam­bém, emo­cio­nante desta breve lista, foi o impeach­ment do pres­i­dente Col­lor de Melo, a votação pelo rece­bi­mento da denún­cia foi o primeiro e mais grave teste da nossa jovem democ­ra­cia, e pas­samos com lou­vor.
O quinto momento é jus­ta­mente aquele que é a razão deste texto: a posse de Lula em 1º de janeiro de 2003.
Os cidadãos brasileiros que acom­pan­hamos a breve história do país – da eleição de Tan­credo à posse de Lula, tendo ou não votado nele –, não pode ficar indifer­ente ao momento histórico que vivíamos. Era, na história do país, a primeira vez que um tra­bal­hador, pobre, sem for­mação acadêmica, um autên­tico «do povo», chegava ao cargo mais alto do país.
A posse de Lula era a mate­ri­al­iza­ção de que o Brasil tornara-​se uma democ­ra­cia plena, onde qual­quer do povo, pode­ria chegar, depen­dendo do seu esforço próprio, onde quisesse. O próprio Lula realçava tal feito ao dizer que o diploma de pres­i­dente era o segundo diploma, o primeiro fora o de torneiro mecânico, obtido junto ao SENAI.
Os eleitores de Lula, der­ro­ta­dos nos três últi­mos pleitos pres­i­den­ci­ais (89, 94, 98), sen­tíamos a agradável sen­sação do dever cumprido. Lá estava o primeiro operário fazendo o seu dis­curso de posse e ace­nando com um novo Brasil muito difer­ente de tudo que havíamos vivido, sem cor­rupção, sem pat­ri­mo­ni­al­ismo, onde a lei valesse igual­mente para todos, onde o cidadão tivesse a certeza que não estava havendo nen­hum tipo de desvios.
Era uma farsa. Nós, cidadãos, gas­ta­mos lágri­mas e emoção à toa. O líder tra­bal­hista, talvez, nunca tenha ido além de um pelego a serviço da elite dom­i­nante, um boy de luxo dos grandes empresários, um bon vivant, como o teria descrito o gen­eral Gol­bery do Couto e Silva, con­forme palavras do amigo de «infân­cia» de Lula, Emilio Ode­brecht.
Numa entre­vista con­ce­dida nos últi­mos dias, na esteira da divul­gação do con­teúdo da colab­o­ração da empresa Ode­brecht – lem­brando que esta é ape­nas uma den­tre tan­tas empre­it­eiras, gru­pos econômi­cos que ainda podem colab­o­rar –, o ex-​presidente Lula se disse
«feliz» com o fato da colab­o­ração ter rev­e­lado o envolvi­mento de diver­sos out­ros par­tidos e políti­cos como ben­efi­ciários, men­sal­is­tas da empresa.
A ale­gria do sen­hor Lula – é o que tenta trans­mi­tir –, é pelo fato dele e do seu par­tido não estarem solitários no lamaçal que foi rev­e­lada e inun­dou os meios de comu­ni­cação.
Vejam, meus caros leitores, que se pas­saram pouco mais de 14 anos entre o dis­curso de posse onde o sen­hor Lula disse: «O com­bate à cor­rupção e a defesa da ética no trato da coisa pública serão obje­tivos cen­trais e per­ma­nentes do meu Gov­erno. É pre­ciso enfrentar com deter­mi­nação e der­ro­tar a ver­dadeira cul­tura da impunidade que prevalece em cer­tos setores da vida pública.
Não per­mi­tire­mos que a cor­rupção, a sone­gação e o des­perdí­cio con­tin­uem pri­vando a pop­u­lação de recur­sos que são seus e que tanto pode­riam aju­dar na sua dura luta pela sobre­vivên­cia.
Ser hon­esto é mais do que ape­nas não roubar e não deixar roubar. É tam­bém aplicar com efi­ciên­cia e transparên­cia, sem des­perdí­cios, os recur­sos públi­cos foca­dos em resul­ta­dos soci­ais con­cre­tos. Estou con­ven­cido de que temos, dessa forma, uma chance única de superar os prin­ci­pais entraves ao desen­volvi­mento sus­ten­tado do país. E acred­item, acred­item mesmo, não pre­tendo des­perdiçar essa opor­tu­nidade con­quis­tada com a luta de muitos mil­hões de brasileiros e brasileiras” e agora, quando mendiga a igual­dade entre os cor­rup­tos nacionais que jurou com­bater.
Infe­liz­mente, ao sen­hor Lula, nem a igual­dade entre os cor­rup­tos o socorre. O que resta claro e cristal­ino é que ele, antes, durante e depois da presidên­cia esteve a serviço – e como tal foi remu­ner­ado –, dos gru­pos econômi­cos. E isso já vinha de longe. O próprio sen­hor Emilio Ode­brecht sentiu-​se estim­u­lado a bus­car a aprox­i­mação com ele após o diál­ogo a que nos refe­r­i­mos lá atrás com o min­istro do régime mil­i­tar. Mesmo durante os anos de chumbo, con­forme nar­rado o livro de Romeu Tuma Júnior, Assas­si­nato de Rep­utações, já era dado a um acordo sub­al­terno.
Na sua colab­o­ração Emilio Ode­brecht rev­ela que na eleição de 2002, foi ele que levou o sen­hor Lula ao empre­sari­ado e seria um dos autores da famosa «Carta ao Povo Brasileiro». Não duvido que seja, tam­bém, o autor ou mesmo colab­o­rador do dis­curso de posse, onde se com­pro­m­ete a com­bater a cor­rupção.
Quanta iro­nia. Um ligeiro cál­culo, só de 2006 a 2014, só a Ode­brecht, uma das preferi­das do petismo e do sen­hor Lula, dis­tribuiu dez bil­hões de reais aos políti­cos em propinas.
Não é que eles ten­ham inven­tado a cor­rupção. Não, longe disso, mas, con­forme rev­e­lam só a delação desta empresa, nunca se lam­buzaram tanto na sor­didez dos esque­mas quando nesta Era de gov­erno dos com­pan­heiros, a ponto de encomen­darem pro­gra­mas espe­ci­ais de com­puta­dores só para admin­is­trar as propinas.
Na con­versa mansa do sen­hor Emilio são bar­radas as trata­ti­vas feitas com o sen­hor Lula, desde apoio mútuo aos fil­hos de ambos, a socorro de bil­hões à empresa. Foi assim para o Porto de Mariel, em Cuba, que, segundo ele, nem a empresa ou o BNDES, tin­ham inter­esse e entraram para aten­der o inter­esse político; assim na con­strução da Arena Corinthi­ans, fruto de uma con­versa de ambos é que depois os cofres públi­cos foram chama­dos a socor­rer; até os «mimos» com foi a reforma do sítio de Ati­baia, que não é do Lula, mas mesmo assim, para agradar ao Lula, a empresa ban­cou um reforma de quase um mil­hão de reais.
O exame dos fatos, e isso se tornará muito mais claro, mostra que o sen­hor Lula, na presidên­cia, era um pre­posto da Ode­brecht. Papel que con­tin­uou a desem­pen­har depois que saiu do cargo de pres­i­dente. Por seus tra­bal­hos foram inven­tadas as palestras num valor acima do que cobrava o ex-​presidente amer­i­cano Bill Clin­ton. Uma remu­ner­ação pelo trá­fico de influên­cia den­tro do gov­erno do Brasil e de out­ros países onde man­tinha e man­tém prestí­gio graças a gen­erosi­dade dos cidadãos brasileiros.
Uma coisa que o sen­hor Lula não se cansa de repe­tir é que nunca pediu nada a nen­hum empresário. Emb­ora duvide, o que resta claro é os out­ros pediam por ele, e muito, a ponto do sen­hor Emilio Ode­brecht recla­mar para o próprio Lula da gulodice do «seu pes­soal». Se não pedia aos empresários pedia ao Palocci, que admin­is­trava a conta-​corrente da propina de 40 mil­hões de reais quando deixou o gov­erno, con­forme con­fes­sado pelo ex-​presidente da empresa, Marcelo Ode­brecht.
Ape­sar de ter votado no sen­hor Lula de 89 a 2002, quando se elegeu, já no ano seguinte, vi que era um engodo, para começar juntou-​se com o que havia de pior na política brasileira, não tinha como os «arran­jos» que fiz­eram darem certo. E não deu, os escân­da­los, os «malfeitos» se suced­eram, o «Men­salão», trazido à tona em 2005, rev­elou o que já sabíamos, o «Petrolão» mostrou que a cor­rupção era o método do gov­erno que tinha como meta combatê-​la. O que assis­ti­mos nos últi­mos dias com a delação da Ode­brecht é que o Estado brasileiro foi ter­ce­i­rizado aos cor­rup­tos e os agentes públi­cos meros pre­pos­tos dos esque­mas de cor­rupção. E pior, o prin­ci­pal servi­dor deste esquema era o depositário número um da con­fi­ança do povo brasileiro.
A luz dos fatos até aqui con­heci­dos – e temo ainda nem saibamos a terça parte – estive­mos, nos últi­mos anos, sob o comando de uma quadrilha impiedosa que não tinha qual­quer pre­ocu­pação ética ou moral com o Brasil. E, rep­re­sen­tando os inter­esses da quadrilha, o ex-​presidente Lula, o homem do povo, a alma mais hon­esta deste país, que ao fim revelou-​se ape­nas uma farsa.
Abdon Mar­inho é advogado.