AbdonMarinho - ÀS FAVAS COM AS LITURGIAS.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Terça-​feira, 16 de Abril de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

ÀS FAVAS COM AS LITURGIAS.

ÀS FAVAS COM AS LITURGIAS.

Acho que foi o ex-​presidente José Sar­ney que, acos­sado por diver­sas denún­cias naque­les anos oitenta, quem cun­hou a expressão «que se devia respeitar a litur­gia do cargo». Referia-​se, por óbvio, à Presidên­cia da República.

O tempo pas­sou, o mundo girou e as boas maneiras ficaram per­di­das nas bru­mas do tempo.

Até onde a vista alcança, não lem­bro de ter ouvido um pres­i­dente de poder chamar, pub­li­ca­mente, em cole­tiva de imprensa, um pres­i­dente da República de «men­tiroso». Isso, até agora, quando o pres­i­dente da Câmara dos Dep­uta­dos afir­mou, com todas letras, que a pres­i­dente da República seria uma «men­tirosa». Aí a república brasileira (grafada pro-​iradamente em minús­cula), virou um ringue de luta de rua, com o ministro-​chefe da Casa Civil, retru­cando que men­tiroso seria o deputado-​presidente. Só fal­tou que se pegassem a tapas, rolassem pelo chão e pux­as­sem o cabelo um do outro. Uma ver­gonha sem para­lelo e precedente.

Este foi o fato que chamou à atenção, mas tem mais.

O deputado-​presidente foi além de chamar a pres­i­dente da república de men­tirosa, afir­mou que a mesma ten­tara «bar­gan­har» com ele, pres­i­dente da Câmara dos Deputados.

Con­si­s­tiria a bar­ganha no seguinte: em troca do pres­i­dente na admi­tir o proces­sa­mento do pedido do impeach­ment da pres­i­dente, lhes seriam garan­ti­dos os votos necessários para que ele, o pres­i­dente da Câmara na fosse molestado nos seus próprios perrengues.

A impressão que temos é que no Brasil vive­mos a hora da xepa. Negocia-​se tudo e sem qual­quer pudor. Perdeu-​se total­mente os lim­ites, o decoro, a litur­gia dos car­gos, das posições ocu­padas. Onde já viu senadores tra­mando fuga de pre­sos? Ban­queiros finan­ciando este tipo de coisa? A pres­i­dente usando termo bar­ganha e sendo des­men­tida como useira e vezeira nesta pratica.

Por qual­quer ângulo que se exam­ine o caso, a situ­ação passa de qual­quer outra já exper­i­men­tada pelo país. Se a men­tira de uma pres­i­dente já é algo assim um tanto inusi­tada, quanto se trata da bar­ganha, temos como claro o cruza­mento da fron­teira da legal­i­dade. Havendo, sim, a vio­lação ao orde­na­mento jurídico.

Vejam há dis­tinção entre o jogo político nor­mal onde os políti­cos tangi­dos por seus inter­esses pes­soais, uma emenda aqui, uma obra ali, uma nomeação acolá e o que está se afir­mando que a pres­i­dente teria feito. O pres­i­dente da Câmara dos Dep­uta­dos afir­mou e um dep­utado con­fir­mou que o gov­erno usaria da sua influên­cia, do poder do cargo, para «facil­i­tar» a vida do seu Cunha se este pas­sasse a rezar pela car­tilha do gov­erno, aten­desse seus inter­esses, inclu­sive os de cunho pessoal.

Não vejo como não car­ac­teri­zar uma ten­ta­tiva de inter­fer­ên­cia no par­la­mento e em suas comissões.

E, este seria mais um motivo a fun­da­men­tar um pedido aber­tura de impeachment.

A Con­sti­tu­ição é clara:

«Art. 85. São crimes de respon­s­abil­i­dade os atos do Pres­i­dente da República que aten­tem con­tra a Con­sti­tu­ição Fed­eral e, espe­cial­mente, contra:

II — o livre exer­cí­cio do Poder Leg­isla­tivo, do Poder Judi­ciário, do Min­istério Público e dos Poderes con­sti­tu­cionais das unidades da Federação;»

Em sendo ver­dade, temos uma clara ingerên­cia no Poder Legislativo.

Repito, a pres­i­dente, seus ali­a­dos, seu par­tido, agem como se fos­sem um bando de alo­pra­dos, sem con­hecer os lim­ites e o respeito às insti­tu­ições, igno­ram que existe uma coisa chamada sep­a­ração dos poderes.

Ale­gar cercea­mento de defesa prévia à admis­são de um processo? A caso cobraram isso aos pedi­dos que foram rejeitados?

O que dizer da ati­tude do par­tido da pres­i­dente, PT, que ingres­sou no Supremo Tri­bunal Fed­eral – STF e desis­tiu quando a ação foi dis­tribuída a um min­istro que não foi do seu agrado? Não estaríamos diante de uma afronta à autori­dade do Supremo? Já imag­i­naram se fazem escola? Seria legí­timo que a oposição fizesse o mesmo quando seus ape­los caíssem nos min­istros com afinidade ide­ológ­ica com aque­les que os nomearam? Aque­les que inclu­sive pos­suíram relação empre­gatí­cia com o Par­tido dos Trabalhadores?

Quando se age dessa forma é porque se perdeu o respeito pelas insti­tu­ições. Perderam a senso da respon­s­abil­i­dade. Não é líc­ito que se escolha o juiz pelo inter­esse da parte. Isso, em lugar nen­hum, muito menos no Supremo Tri­bunal Fed­eral – STF.

O Supremo Tri­bunal Fed­eral, não pode ser tratado como se seus min­istros fos­sem de A, B ou C. Todos eles são servi­dores públi­cos, pagos pelos con­tribuintes e estão a serviço da nação.

Desi­s­tir da dis­tribuição foi uma afronta que o min­istro fez bem repelir em nome do tribunal.

Ao menos o STF pre­cisa ser preser­vado da xepa que assom­bra a política nacional.

As autori­dades pre­cisam se dar conta que mais impor­tante que eles próprios, o que está em jogo é a sanidade das insti­tu­ições brasileiras.

Estas autori­dades já que perderam o respeito e entre sim, pre­cisam e devem, ao menos, respeitar a litur­gia dos car­gos que ainda ocupam.

Abdon Mar­inho é advogado.