AbdonMarinho - CARTA A FLÁVIO DINO
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sexta-​feira, 19 de Abril de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

CARTA A FLÁVIO DINO

CARTA A FLÁVIO DINO

São José de Riba­mar (MA), 05 de out­ubro de 2014.

Meu Caro Flávio,

Tomei a ini­cia­tiva de escrever-​te essa carta após assi­s­tir teu último pro­grama de tele­visão desta cam­panha que chega ao fim com a sua eleição.

Nele, chegava a sua casa cen­te­nas de car­tas dos maran­henses de todos os canto do estado e até de out­ras pla­gas. A leitura delas, entrecor­tadas com out­ras, falavam de son­hos e esper­anças. Não sei se aque­las car­tas exibidas no pro­grama eleitoral eram de ver­dade ou se era ape­nas um recurso de mar­ket­ing, no momento não importa. O que sei, e que não era nen­hum recurso da pro­pa­ganda, eram os olhos mare­ja­dos pelas lágri­mas de dezenas de cidadãos que apare­ce­ram no mesmo pro­grama. Aque­las pes­soas não eram atores, aque­las lágri­mas, aquela emoção era verdadeira.

Em nome daque­les cidadãos anôn­i­mos que deposi­taram toda a fé e esper­ança em você é que tam­bém escrevo essas sin­ge­las linhas.

Bem sei que terás grandes desafios para não decep­cionar aque­las pes­soas, sobre­tudo, as mais humildes, aque­las que enx­ergam na tua eleição a chance de mudarem de vida, se não para elas mes­mas, para os seus fil­hos e netos. Tor­nastes assim, o depositário de toda essa esper­ança, cre­dor de todos os son­hos. Essa que era para ser ape­nas uma eleição torno-​se o divi­sor de água de mil­hares de vidas.

Acred­ito que as pes­soas olharam para ti e sen­ti­ram que pode­riam con­fi­ram em tuas palavras, veja a imensa respon­s­abil­i­dade que tens. Se eras ape­nas mais um can­didato, deixou de ser para tor­naste o fanal de um povo.

O exer­cí­cio de um mandato não é fácil, são muitos inter­esses. A primeira coisa que te digo é que não tro­ques as tuas con­vicções por quais­quer con­veniên­cias. Não cedas, por um min­uto que seja, às palavras ado­ci­cadas dos adu­ladores e dos este­lion­atários que cer­cam o poder. Espero que saibas identificá-​los. Eles, ao fare­jarem uma pos­sível vitória, já começaram a se aprox­i­mar, com suas men­su­ras e inter­esses mesquin­hos, querendo abo­can­har um naco de poder para si. Ficas atento as gen­tilezas e aos favores que fitem prestar.

O seu slo­gan de cam­panha diz: “50 anos can­sou”. Essa é uma ver­dade. Mostre que não vais coon­es­tar com as vel­has práti­cas desde o começo. É aquilo que ensina o cabo­clo lá do meu sertão, por onde pas­sastes, “que se deve matar o galo no primeiro dia”, senão, ainda segundo ele, não funciona.

No seu caso, acred­ito, deves matar o galo até antes do primeiro dia, na escolha dos aux­il­iares. Lembra-​te, por mais que muitos aleguem tê-​lo aju­dado, não são eles os cre­dores da vitória. Essa é a vitória do povo cansado de tan­tos anos de um gov­erno de poucos e para poucos. Não começas por for­mar o teu gov­erno com aque­las pes­soas que antes de terem com­pro­misso com a causa pública, têm inter­esses pes­soais a serem sat­is­feitos. Repito: Não são difí­ceis de serem iden­ti­fi­ca­dos. São os mes­mos de sem­pre. Procuras te cer­car de bons con­sel­heiros, que não ten­ham receio de perder uma “boquinha\» no gov­erno caso diga algo que te desagrades. Procuras pes­soas que ten­ham nas ambição pes­soal o inter­esse de bem servir a comu­nidade, que antes de tudo acred­i­tam no grande poten­cial do estado e son­ham com um futuro mel­hor para ele.

Ao longo das décadas o que assis­ti­mos foi um pequeno grupo ficar rico, muito rico, mas o con­junto da sociedade ficando pobre. A riqueza que serve para ali­men­tar a pro­pa­ganda ofi­cial do gov­erno não chega a todos. O que chega são as esmo­las para man­ter parte da pop­u­lação cal­ada e resignada.

As opor­tu­nidades de tra­balho, em quase todas as áreas do estado, exis­tem para bem poucos, para os ami­gos e apanigua­dos. A eles tudo é dev­ido. Não importa a área do con­hec­i­mento ou tra­balho a ser desen­volvido, se rende alguma coisa, fica com a casta dos eleitos. Não tem que ser assim, não pode mais con­tin­uar assim. O ali­mento desde mod­elo é a cor­rupção enraizada em todo os poderes do Estado, que de tão pre­sente é recon­hecida por todos como algo nor­mal. Não é.

O gasto com a folha de pes­soal que com­pro­m­ete grande parcela do orça­mento do Maran­hão é con­sti­tuído por mil­hares de sinecuras per­pet­u­adas entre algu­mas famílias. Acred­ito que só aca­bando com elas, dando tra­balho a quem de fato, quer fazer algo rel­e­vante, e elim­i­nando os exces­sos, já se tem uma boa econo­mia. Muitos dos que estão nes­tas sinecuras, segundo dizem, sequer sabem onde é a sua lotação. Acred­ito que uma das primeiras medi­das a serem ado­tadas é recadas­tra­mento e uma reforma admin­is­tra­tiva que torne a máquina pública mais leve e funcional.

Deves ter espe­cial atenção com as obras públi­cas. Este é um setor onde faz muito tempo que deixa a dese­jar. Nos­sas obras são caras e mal feitas, basta ver as condições das estradas por onde pas­sastes. A fis­cal­iza­ção estatal não acom­panha a exe­cução das obras, como resul­tado, muitas vezes a obra se torna uma fonte ines­gotável da san­gria de recur­sos. Muitas, antes da inau­gu­ração, já care­cem de con­ser­tos e reparos. É necessário que estru­ture o setor de fis­cal­iza­ção e acom­pan­hamento, que se exija nos con­tratos clausu­las de dura­bil­i­dade e que se cobre isso com veemência.

O Maran­hão, informa a pro­pa­ganda ofi­cial, fes­teja mais um recorde na pro­dução de grãos. Comemora-​se que a nossa pro­dução chegou a dois por cento da pro­dução de grãos do Brasil. É um dado que não nos serve, nem como piada. Não aceitável que um estado com tan­tos recur­sos hídri­cos, tão extenso, com tan­tas áreas agricultáveis pro­duza tão pouco. Não sei sabes, ao longo dos anos foi destruída a assistên­cia téc­nica ao homem do campo. Isso, ali­ado a uma política pre­datória de assis­ten­cial­ismo tem pro­duzido, não pro­du­tos agrí­co­las, mas homens preguiçosos, cidadãos que entra dia sai dia, vivendo de esmo­las. O Maran­hão não pode con­tin­uar a ser uma terra onde a maio­ria da pop­u­lação viva de esmo­las. Meu pai, com sua sabedo­ria de anal­fa­beto, cos­tu­mava dizer que esmo­las só eram dev­i­das a quem não tinha condições de tra­bal­har, aos que eram cegos ou alei­ja­dos. Hoje, a esmola é dev­ida a todos, é a primeira opção do cidadão. Pre­cisamos devolver ao homem o amor pelo tra­balho, à sat­is­fação de gan­har o próprio sus­tento, a não depen­der ninguém, a ser livre. Essa é a palavra, pre­cisamos devolver ao homem a sua liber­dade cidadã.

A segu­rança tornou-​se um dos maiores desafios. O Maran­hão tornou-​se motivo de piada para os seus con­ci­dadãos e além-​fronteiras, todos dizendo que o poder estatal mudou do Palá­cio dos Leões para a pen­i­ten­ciária de Pedrin­has. Ë necessário que se resta­beleça ordem nesse caos, que se mostre que o estado não capit­ula diante do crime e que as famílias poderão ter segu­rança para sair às ruas. É pos­sível com­bater o crime, out­ros países com­bat­eram e vence­ram essa guerra. A falta de políti­cas soci­ais não é des­culpa para que se passé a mão em cabeça de ban­dido, em detri­mento da sociedade.

Acred­ito que tudo começa com a edu­cação. Esse é um desafio sério. Não passa um ano em que os indi­cadores soci­ais não apre­sen­tem os dados da nossa edu­cação como des­fa­voráveis. As difi­cul­dades são de toda ordem, esco­las sem condições, pro­fes­sores desmo­ti­va­dos, fora de suas dis­ci­plinas, a vio­lên­cia den­tro de seus muros. Grande parte dos pro­fes­sores da rede estad­ual são remanes­centes do gov­erno Castelo. Não se aposen­taram ainda porque não tiveram garan­ti­das suas pro­gressões. Minha sug­estão é faças, no curso do recadas­tra­mento, um lev­an­ta­mento cri­te­rioso disso. Após, faça con­curso, garanta as pro­moções e aposente esses pro­fes­sores. Aos que ficarem e aos novos, cobre resul­ta­dos. Sugiro, ainda, que veja algu­mas medi­das exi­tosas em alguns municí­pios, alie-​se a elas e as amplie para o resto do estado. Somando-​se a isso, com as esco­las evoluindo junto com as avanços tec­nológi­cos, ire­mos sair das últi­mas posições.

Na saúde deves man­ter a rede que está feita ampliando-​a para os demais municí­pios que não foram con­tem­pla­dos, organizando-​a para fun­cione no Sis­tema Único de Saúde — SUS, junto a isso deves se voltar para a pre­venção de doenças, com sanea­mento básico. A maio­ria dos nos­sos municí­pios não tem um palmo de rede esgoto, tudo que pro­duzem vão para fos­sas, quando não para os rios. Até mesmo na cap­i­tal do estado é essa a prática mais comum. A Ilha de São Luís, out­rora tão rica em recur­sos hídri­cos, não pos­sui mais um rio que esteja con­t­a­m­i­nado por esgoto. É urgente que se enfrente esse prob­lema, que se con­siga aliar o cresci­mento urbano com a preser­vação do meio ambi­ente. Não é por que pre­cisamos de um con­domínio que deve­mos matar o rio.

Ainda na saúde, deves bus­car junto ao Min­istério da Saúde, a per capita/​paciente que é dev­ida aos pacientes maran­henses e que atual­mente está R$ 50,00 (cinquenta reais) abaixo da média. Os recur­sos dessa per capita/​paciente aju­dará em muito na manutenção dos hos­pi­tais da rede pública.

Muitos são os assun­tos a serem trata­dos. Tan­tos, que uma carta não seria sufi­ciente. Mas tem um que não posso deixar de tratar nessa mis­siva: A corrupção.

Ao longo dos anos, a hon­esti­dade tem sido tratada como qual­i­dade, como um difer­en­cial. Não é, a hon­esti­dade é dever de todos, sobre­tudo dos gov­er­nantes, daque­les que tem sob sua respon­s­abil­i­dade a guarda dos recur­sos públi­cos. Deves ficar atento a isso já na for­mação do gov­erno. Escol­her pes­soas que não pensem ser a hon­esti­dade uma qual­i­dade e sim dever, que tratem o recurso público com zelo, que enten­dam as neces­si­dades do estado e do povo e a importân­cia de econ­o­mizar cada cen­tavo. Ainda assim deves ter o cuidado de escol­her den­tre esses, os que sejam fortes de per­son­al­i­dade, que não se deixem deslum­brar pelos fal­sos encan­tos do poder e que não sejam covardes, traidores ou pusilân­imes. Façam com enten­dam que nada mais são que servi­dores públi­cos, e com uma desvan­tagem em relação aos de car­reira, pois já vêm com prazo de validade.

Encerro esta carta por aqui, dese­jando, de todo coração, que ten­has sucesso nesta nova empre­itada, que con­si­gas devolver a esper­ança que desde muito foi reti­rada do nosso povo, o seu amor próprio e a certeza que podemos ter um futuro difer­ente e melhor.

Esta colo­cação me remete nova­mente aos olhos mare­ja­dos e as lágri­mas que vi ver­tidas em seu último pro­grama. Lágri­mas que só entendi o sig­nifi­cado depois de uma vez que há muito tempo não as via, pois eram,ca aque­las, lágri­mas de esperança.

Aten­ciosa­mente,

Abdon Mar­inho.