AbdonMarinho - O BRASIL, AS REFORMAS E AS CORPORAÇÕES.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Terça-​feira, 16 de Abril de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

O BRASIL, AS REFOR­MAS E AS CORPORAÇÕES.

O BRASIL, AS REFOR­MAS E AS CORPORAÇÕES.

MUITO TEMPO – mais de vinte anos – alerto para a neces­si­dade do Brasil pro­mover uma reforma do Estado. No meu sen­tir essa é a reforma que deve pre­ceder todas as outras.

A primeira vez que tratei do tema foi por ocasião da elab­o­ração da minha mono­grafia de con­clusão do curso de dire­ito na Uni­ver­si­dade Fed­eral do Maran­hão. Na opor­tu­nidade aler­tava para essa neces­si­dade, bem como, para a gravi­dade das casas do par­la­mento, em última análise, respon­sável pela imple­men­tação de tais refor­mas estarem rep­re­sen­tadas por inter­esses cor­po­ra­tivos, em detri­mento dos inter­esses do país.

Pas­sa­dos vinte anos o Brasil se encon­tra atra­van­cado pela falta da refor­mu­lação do Estado e todas demais refor­mas dela decor­rentes e o fato das cor­po­rações dom­inarem – pen­sando uni­ca­mente no inter­esse dos seus rep­re­sen­ta­dos em detri­mento do país – a cena política.

Um exem­plo deste atra­van­ca­mento que com­pro­m­ete o futuro do país é a resistên­cia a chamada reforma da previdência.

Não dis­cuto aqui se a pro­posta do gov­erno está certa ou errada, não é isso que vem ao caso.

O que dis­cuto é que país pre­cisa de uma reforma prev­i­den­ciária e que ela é urgente.

Qual­quer um sabe da sua neces­si­dade e qual­quer um que venha diri­gir o país terá que batal­har por ela.

A questão é de fácil com­preen­são. A pop­u­lação está – feliz­mente –, vivendo mais, e, com isso, aumen­tando o número de des­ti­natários dos recur­sos da pre­v­idên­cia. Na outra ponta temos assis­tido a diminuição da taxa de natal­i­dade. Ou seja, a pop­u­lação eco­nomi­ca­mente ativa que, com o fruto de seu tra­balho, garante a aposen­ta­do­ria daque­les que já se aposen­taram está dimin­uindo. Isso é perceptível.

Ora, em algum momento a conta deixará de fechar. Aliás já deixou de fechar, segundo dizem, há muito tempo. Anual­mente temos infor­mações do déficit prev­i­den­ciário sem­pre cres­cente, a recla­mar recur­sos de out­ros setores para aten­der a neces­si­dade de paga­mento de aposen­ta­do­rias e pensões.

A pre­v­idên­cia brasileira con­some mais de um quarto do PIB do país, outro quarto é con­sum­ido por todos os demais órgãos públi­cos, paga­mento de servi­dores, saúde, edu­cação, assistên­cia social, infraestru­tura, etc., e a outra metade é con­sum­ida pela dívida pública.

Há os que sus­ten­tam, como solução para o déficit prev­i­den­ciário, uma nego­ci­ação para dívida pública que aumen­tou sub­stan­cial­mente com a política de juros altos dos últi­mos anos. Não duvido que seria um alento e até seria bom saber­mos que tem de «gor­dura» nesta mon­u­men­tal dívida.

Acon­tece que o prob­lema, ainda, não é esse. As pes­soas con­tin­uarão vivendo mais (graças a Deus) e a força motriz que os susterão na vel­hice dimin­uindo. Ou seja, em algum momento haverá neces­si­dade de se repactuar a pre­v­idên­cia social. Mel­hor que seja antes.

Não me parece razoável que a pre­v­idên­cia con­suma mais que todo o resto dos inves­ti­men­tos públi­cos, só per­dendo para a mon­stru­osa dívida pública

Pois bem, todo mundo mundo sabe disso mas ninguém quer ceder nada.

E aqui entra o papel das corporações.

O que temos visto nes­tas dis­cussões sobre a pre­v­idên­cia? Que todos, sobre­tudo os mais aquin­hoa­dos e for­t­ale­ci­dos nas suas cor­po­rações, se acham «especiais».

São espe­ci­ais os pro­fes­sores, os mag­istra­dos, os poli­ci­ais, os servi­dores públi­cos, os políti­cos, em suma todos a exceção da pat­uleia ignara.

Na minha opinião, todos tra­bal­hadores que sus­ten­tam este país são espe­ci­ais. Acon­tece que alguém pre­cisa deixar de olhar só para os seus inter­esses, do seu grupo e pen­sar no futuro do país.

Pelo que vi, por conta de tan­tas espe­cial­i­dades a reforma da pre­v­idên­cia caiu no buraco, se muito, aprovam a ele­vação da idade mínima.

Man­ter as coisas como estão só inter­essa aos que sem­pre usufruíram van­ta­gens e mais van­ta­gens do Estado às cus­tas dos tra­bal­hadores que não pos­suem quais­quer direitos.

O adi­a­mento da reforma da pre­v­idên­cia – e digo adi­a­mento porque o mod­elo atual é insus­ten­tável, como já dize­mos antes – é um equívoco que só trará pre­juí­zos as futuras gerações.

A refor­mu­lação do mod­elo é necessário para com­bater fraudes, priv­ilé­gios, abusos.

Não vejo sen­tido que os tra­bal­hadores da ini­cia­tiva pri­vada – cuja maio­ria, ganha menos que os servi­dores públi­cos –, este­jam sub­meti­dos ao régime geral e a um teto, enquanto que os servi­dores do setor público que, geral­mente gan­ham bem mais, prin­ci­pal­mente os que são de car­reiras de Estado, levem para todo o sem­pre, os salários e van­ta­gens da ativa.

Ora, se gan­ham mais, podem per­feita­mente pagar pre­v­idên­cia pri­vada ou com­ple­men­tar, fazer o «pé de meia» para a velhice.

As cor­po­rações não con­seguem ou não querem enx­er­gar isso.

Acho que pen­sam que os gov­er­nos pro­duzem din­heiro para sus­ten­tar tudo que imag­inarem. Ledo engano, gov­er­nos, só admin­is­tram – e mal –, o din­heiro que tiram dos contribuintes.

Como não pro­duzem riqueza alguma, ou ado­tam medi­das para tornar os mod­e­los de gestão sus­ten­táveis ou aumen­tam a carga tributária.

Aliás, os defen­sores de inter­esses cor­po­ra­tivos sem­pre vem com essa mesma con­versa de aumen­tar a carga trib­utária. Ainda que se aumente no lim­ite do não mais poder tal carga trib­utária, o mod­elo, mais cedo ou mais tarde fracassará.

Isso, sem con­tar com os efeitos nefas­tos de uma carga trib­utária ele­vada que impede o cresci­mento econômico do país.

Não duvido que pre­cisamos de uma reforma trib­utária, mas esta deve vir para tornar mais racional e razoável os impos­tos que pag­amos. O cidadão de bem já passa cinco meses do ano tra­bal­hando só para pagar impos­tos. Ele­var ainda mais a carga trib­utária, pro­duzir deixará de ser inter­es­sante. Quem vai tra­bal­har seis, oito meses, só para pagar impostos?

O resto é dem­a­gogia barata, falta de bom senso e a fé cega de que as coisas se resolverão por elas mesmo, sem que ninguém tenha que fazer nada ou se sac­ri­ficar de alguma forma.

O pen­sa­mento dis­tor­cido das cor­po­rações é espel­hado no mod­elo de Estado que temos. E, aí, volta­mos ao começo do debate.

O Estado brasileiro é mas­todôn­tico, uma máquina imensa e cor­rupta a dis­tribuir priv­ilé­gios a uma elite dominante.

A classe política brasileira não con­segue fazer as refor­mas necessárias porque ela mesma não tem cor­agem de cor­tar seus priv­ilé­gios, suas regalias, suas aposen­ta­do­rias espe­ci­ais, seus salários absur­dos, suas van­ta­gens indecorosas.

Na ver­dade as cor­po­rações se valem disso para usar e serem usadas pela elite dom­i­nante do país.

As cor­po­rações sem­pre servi­ram e servirão de anteparo entre a massa pagadora de trib­u­tos que sus­tenta os seus e os priv­ilé­gios da elite dirigente.

O Brasil pre­cisa de uma reforma de Estado que acabe com todos os priv­ilé­gios, que coloque os cidadãos em pé de igual­dade nos favores que recebem do mesmo. Chega de uns ou out­ros se acharem mere­ce­dores disso ou daquilo como que por her­ança divina.

Qual a razão de um par­la­men­tar exercer um mandato ou menos e levar regalias pelo resto da vida? Que dire­ito adquirido é esse? Por que pre­cisam de tan­tos priv­ilé­gios para exercer um mandato?

O mesmo se diga das demais funções de Estado.

Não tem sen­tido ter­mos uma Con­sti­tu­ição que traz a assertiva de que «todos são iguais per­ante a lei», se o que mais vemos são priv­ilé­gios para uns e outros.

A igual­dade de que trata a Con­sti­tu­ição é uma ilusão. Na ver­dade todos se acham mel­hores e «mais iguais» que os demais, e sugam o país a não mais poderem, na defesa de seus priv­ilé­gios e van­ta­gens indevidas.

O Brasil está muito longe ser uma ver­dadeira democ­ra­cia e não acred­ito que a alcance­mos. Ainda mais quando se cam­inha em sen­tido inverso.

Abdon Mar­inho é advogado.