AbdonMarinho - O MELHOR LUGAR: JUNTO AOS MEUS.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Quarta-​feira, 17 de Abril de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

O MEL­HOR LUGAR: JUNTO AOS MEUS.

O MEL­HOR LUGAR: JUNTO AOS MEUS.

Certa vez alguém me per­gun­tou qual seria o mel­hor lugar para se viver na, minha opinião. Respondi-​lhe que era junto aos meus famil­iares. Claro que diver­sas vezes, quando a angús­tia e o deses­pero com a situ­ação de des­man­dos e vio­lên­cia que vive­mos bate mais fundo – e não é raro isto ocor­rer –, cog­ito deixar tudo para trás e ir morar noutro pais, numa vila per­dida, no fim do mundo.

Todas estas vezes recordo o que ouvi de um certo pro­fes­sor. Falá­va­mos do quanto tinha sido formidável o tempo em que habitou uma avançada nação por ocasião de um mestrado ou doutorado. Indaguei o quanto devia ter sido grat­i­f­i­cante a exper­iên­cia e se não pre­tendia, um dia, morar por lá, defin­i­ti­va­mente. Disse-​me que tinha sido muito grat­i­f­i­cante, mas que nada se com­par­ava a viver­mos em nosso país, com todos os seus defeitos e virtudes.

O mundo tem parado para dis­cu­tir a questão dos mil­hares de refu­gia­dos que ten­tam uma vida mel­hor nas nações oci­den­tais, sobre­tudo na Europa. Emb­ora pou­cas pes­soas ten­ham pas­sado incólumes pelas ima­gens daquela cri­ança Síria sendo res­gatada, morta, na costa turca ou não ten­ham ficado indifer­entes às ima­gens daque­les frágeis botes ten­tando vencer o Mediter­râ­neo super­lota­dos, a dis­cursão, ainda, ao menos na minha opinião, ganha aspec­tos mera­mente buro­cráti­cos: quan­tos refu­gia­dos cada país europeu pode rece­ber. Fala-​se em cotas. Divisão de responsabilidade.

Claro que não se pode igno­rar os efeitos econômi­cos e políti­cos para qual­quer nação vê-​se, de uma hora para outra, tendo que rece­ber e aco­modar mil­hares de refu­gia­dos, talvez mil­hões. É com­preen­sível. Entre­tanto, ape­sar disto, não se está falando de uma par­tilha de coisas. Esta­mos falando de seres humanos, homens, mul­heres, cri­anças. Não se trata de bolo em podemos repar­tir e dar um pedaço a cada um.

A situ­ação dos mil­hares de humanos que arriscam a própria vida, mais grave que isso, que arriscam a vida de suas famílias, é algo a rev­e­lar o alto grau de deses­pero que se encon­tram. Qual­quer pai ou mãe, que ver­dadeira­mente, mereça ser chamado assim, pref­ere mil vezes que qual­quer mal lhes acon­teça aos seus fil­hos ou entes queridos.

Mas não é só.

Esta­mos diante de pes­soas que têm pouco mais que nada para recomeçarem a vida em ter­ras dis­tantes. Que, usando o pouco que lhes restam, abdicam – ainda que tem­po­rari­a­mente, mas sem saber se algum dia voltarão – da sua própria pátria, as ter­ras de seus pais, avós e out­ros antepas­sa­dos. E não estão ape­nas deixando a pátria. Além da pátria deixam para trás famil­iares, pai, mãe, tios, avós; deixam para trás os ami­gos e suas referências.

Não há tragé­dia que não possa ser olhada por um ângulo que a torne maior. E, pior que o drama dos que partem, talvez seja o drama dos que ficam. Estes, além da força e a dig­nidade dos próprios cor­pos nada pos­suem. Não têm condições de par­tirem, e sabem o que os espera, se ficarem. Dia após dia tendo que enfrentar o insano con­flito que parece não ter fim.

Existe um bor­dão repetido à exaustão pela diplo­ma­cia mundial de que o Ori­ente Médio não é para amadores, tal a com­plex­i­dade das diver­sas relações em que, muito rara­mente, se con­segue iden­ti­ficar quem é o mel­hor ou menos ruim da ótica da humanidade.

Vejamos o caso da Síria, a quem tanto a humanidade deve no comér­cio, na cul­tura e tan­tos out­ros avanços. Logo no começo do con­flito poucos eram os que não tor­ciam pela queda de Bashar al– Assad. O desen­ro­lar da guerra for­t­ale­ceu um grupo bem pior que o gov­erno com­bat­ido, o chamado Estado Islâmico que pre­tende for­mar um cal­i­fado naquele e noutros países da região de caráter abso­lu­ta­mente arcaico e que tem no ter­ror bru­tal, a mais e mais con­vin­cente forma de dominação.

A real­i­dade do povo sírio nos dias atu­ais é a divisão entre um gov­erno que manda mas­sacrar seu próprio povo e o grupo que semeia o ter­ror, destrói todos os traços cul­tur­ais de milênios por onde passa, estupra, mata e prat­ica toda sorte de abu­sos con­tra as pop­u­lações. Não restando aos ficam nada além da opção entre uma des­graça e uma des­graça ainda maior.

Se a situ­ação da Síria é ruim, inimag­ináveis para muitos que assis­tem seus dra­mas nos canais de tele­visão, não fazem ideia da tragé­dia igual­mente insana que ocorre simul­tane­a­mente no norte da África após a queda dos seus regimes opres­sores na chamada Pri­mav­era Árabe.

São nações destruí­das, com um provo oprim­ido e pade­cendo de toda a sorte de pri­vação, uma situ­ação de mis­éria tão pre­mente que muitos, sequer têm força para rea­gir ou fugir para para algum lugar melhor.

Os povos do mundo pre­cisam, ainda que num raio de humanidade, despir-​se dos seus pre­con­ceitos e enten­derem que as pes­soas não se tor­nam refu­giadas por quer­erem. Elas estão sendo forçadas a isso, a deixar para trás sua pátria, suas raízes, suas histórias, seus entes queri­dos. Poucos são os que bus­cam asilo por von­tade própria. A grande maio­ria, quase cem por cento, são con­duzi­dos ao exílio, às sujeições e humil­hações num ato der­radeiro de deses­pero para sal­var a si, seus fil­hos, esposas, par­entes próx­i­mos. São humanos que, diante do que pas­sam, dev­e­riam con­tar com maior respeito e sol­i­dariedade, não ape­nas dos gov­er­nos, mas tam­bém, das pop­u­lações onde bus­cam abrigo.

Assim como eu, você, para os refu­gia­dos, o mel­hor lugar para se viver é, cer­ta­mente, junto aos seus. E todos eles, além de esper­ança numa vida mel­hor, trazem o sonho de um dia poder voltar para eles.

Abdon Mar­inho é advogado.